Episódio Nº 122
Naquela noite quando
voltava cambaleando para a barraca depois de ter marcado com um carvão a testa
de vários meninos para que entrassem de graça no espectáculo, encontrou António
Balduíno que aparentava olhar as estrelas enquanto espiava para a barraca onde
estava Rosenda Rosedá, a bailarina negra, o número de maior sucesso do Grande
Circo Internacional.
Era que à luz da vela a
negra começava a mudar de roupa e mostrava umas costas que nem veludo. O negro
cantava um dos seus sambas de maior sucesso:
«Minha mulata é de veludo
Chega até a
arrepiar…»
Quando viu que Giusepe
vinha, fez que olhava as estrelas. Qual seria Lucas da Feira. Uma vez
haviam-lhe mostrado a estrela que Zumbi dos Palmares tinha virado. Mas ela não
está brilhando aqui .
Só brilha na Baía, nas
noites de macumba, quando os negros festejam, quando os negros festejam Oxossi,
o deus da caça… Ele toma conta dos negros, brilha quando eles estão alegres, se
apaga quando eles estão tristes.
Teria sido o Gordo que lhe
contou aquela história? Não, foi pai Jubiabá, uma noite no cais. Se fosse o
Gordo ele botaria um anjo na história. Pai Jubiabá é que sabia coisas de Zumbi
dos Palmares e de outros negros grandes e valentes.
Bem que ele pode dar outra
espiada, agora, para a barraca de Rosenda Rosedá, porque Giusepe vem
cambaleando tanto que não chegará tão cedo. Mas não é que ela desapareceu e
apagou a luz?
Se não fosse Giusepe –
aquele bêbedo – ele a teria visto nua. Era um peixão… Podia não haver dinheiro,
mas enquanto ela ficasse no circo, António Balduíno ficaria… que negra bonita…
Aqui lo
na “Lanterna dos Afogados” seria um sucesso danado. Ficariam todos de queixo
caído…
Giusepe chegou. Quando qui s cumprimentar o negro quase perde o equi líbrio.
- Estou cansado. Esse trabalho aqui me mata. Trabalho como um cachorro…
- Tá se vendo…
Ele passou. Levou quase
meia-hora para chegar à sua barraca.
- É capaz de tocar fogo na barraca quando
riscar o fósforo para acender a vela – pensa António Balduíno que se aproxima.
Mas ele já acendeu a vela e agora está sentado perto de uma mesinha de pé
rebentado.
Em cima estão uns livros
ricamente encadernados, mas estragados no tempo. A curiosidade absorve o negro
que espia como um ladrão.
Que haverá naqueles livros
para Giusepe acariciá-los com tanto amor? Está fazendo o mesmo que o negro faz
com as coxas das mulatas. Passando a mão muito de leve, com cuidado,
luxuriosamente.
Mas ele se virou e António
Balduíno viu os olhos. Tem sujeitos que quando bebem ficam assim tristes.
Outros ficam alegres, riem e cantam… Mas tem os que ficam tristes e dão para
chorar. Giusepe é dos que ficam tristes. António Balduíno não resiste e entra
para a barraca de Giusepe que ficou triste de tanto beber.
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