domingo, outubro 06, 2013

Santarém
HOJE  É

DOMINGO

(Na minha cidade de Santarém)


Em jovenzinho não fui para contabilista porque não gostava de números, eram frios, inexpressivos. Agora, via de resto, até sonho com eles: uns, pequeninos, outros, grandes e enormes. Os primeiros devem ter a ver com o deficit, os segundos com os juros e a dívida do país.

Não admira… ontem, num dos vários programas de televisão da especialidade, o Dr. Silva Lopes, do alto dos seus mais de oitenta anos, que fez parte de quatro governos do pós 25 de Abril e que nestas coisas de economia e finanças sabe-a toda, enquanto segurava num papelito com uma mão e com a outra meio levantada contorcia os dedos, expressava as suas dúvidas sobre os números perspectivados e perorava contra a troyka…

O Dr. Miguel Frasquilho, “expert” oficial do governo nestas matérias, fala por “esgares” e “faz olhinhos” à recuperação da economia do país e da europa…

O jovem representante do PCP, de porte atlético a fazer lembrar os lutadores de artes marciais, impõe a sua voz, esmaga as restantes e destrói qualquer esperança do governo em uma solução seja ela qual for…

Em nome do Bloco de Esquerda, um outro jovem, num estilo sereno e didáctico, explica por “a” mais “b” porque a política de austeridade agrava a situação e a economia de um país não se governa da mesma forma que um bom chefe de família governa a sua casa…

Afundei-me no sofá, fiz zeping e fui ver snooker, esse jogo relaxante e belo em que gosto de descansar o olhar e o espírito recordando o bilhar do Café Paraíso, em Tomar, onde estudava e me “perdia” a ver os outros jogar pelo fascínio daquelas bolinhas rolando no pano verde…

Ontem, eu estava reconfortado pela boa notícia que o Vice- Primeiro Ministro, Dr. Paulo Portas, me tinha dado. Não sei se já perceberam que o Dr. Paulo Portas é, no Governo, o das “boas” notícias. Ele, que anda interiormente eufórico desde as últimas eleições autárquicas porque das 308 Câmaras que o país tem ganhou quatro (que ninguém conhece nem ouviu falar) e com uma que já tinha perfaz cinco, uma mão cheia, o penta!

Pois o Dr. Paulo Portas, o das boas notícias, veio dizer-nos que já não vão tirar mais 10% - que andaram a ameaçar -  às pensões dos reformados do Estado entre os quais me incluo, mas eu sou céptico… ele também disse que se ia embora do governo – decisão irreversível – e afinal não só ficou como subiu um degrau, para Vice-Primeiro Ministro.

Não levam os 10% mas qualquer dia, pressionados pela troyka, vêm cá a casa e levam outra coisa qualquer. Levem a televisão que é de boa marca e eu vejo-me livre da vista deles… desde que deixem ficar os jogos de snooker e os golos do Ronaldo.

A terrível dúvida é sobre a sustentabilidade da dívida do país. O nosso responsável máximo, também ele professor nestas matérias, em dois discursos solenes à nação, afirmou naquele seu estilo matraquilhado – vem de matraquilhos -  que a dívida era insustentável, in-sus-ten-tá-vel, duas vezes.

Agora foi à Suécia e de lá falou para Portugal e para o mundo e disse:

 - Se os nossos credores, aqueles a quem devemos dinheiro, consideram que ela não é insustentável, somos nós, então, devedores que a vamos considerar insustentável?... – Só se fossemos masoquistas!...

No domingo passado, dia 1 de Setembro, Passos Coelho "entusiasmou-se" perante a plateia de “laranjinhas” que o escutava, no encerramento da Universidade de Verão do PSD, e saiu-se com esta pérola da mais rasteira e cínica demagogia:

- "Já alguém se lembrou de perguntar aos 900 mil desempregados de que lhes serviu até hoje a Constituição?"
Como estão lembrados, o Tribunal Constitucional tem chumbado, com base na interpretação que faz da Constituição, algumas normas que o governo gostaria de ver aprovadas para a execução da sua política de austeridade.
Até aqui nada de anormal. Passos Coelho e o seu governo têm uma opinião e a maioria de Juízes do Tribunal Constitucional tem outra… mas fazer dos 900.000 desempregados do país arma de arremesso contra os Juízes do TC é baixo, de baixo carácter…
Vai daqui, a jornalista Ana Sá Lopes, no jornal “i” perguntou, na mesma linha e com a mesma lógica:
 - "De que valeu aos 900.000 desempregados, até hoje, a Assembleia da República? E a Assunção Esteves? E o 25 de Abril? E o deputado Luís Montenegro? E o Luís Meneses? E o deputado XPTO? E o Governo? E o Pedro? E o Paulo? E a Maria de Lourdes Albuquerque? E os outros, com os respectivos assessores?
De que valeu aos 900.000 desempregados as eleições livres e justas? A tropa? A Cinemateca? O Teatro Nacional? O Palácio de São Bento? Os almoços de Estado que não são do Estado mas pagos pelo Estado? E a câmara Municipal de Ponta Delgada? E as Autonomias Regionais? E o direito de voto a partir dos dezoito anos? E o direito à não descriminação em função da raça e do sexo? E a separação de poderes? E já agora, de que lhes valeu a JSD? E as Universidades de Verão do PSD onde os “laranjinhas” vão marcar presença para arranjarem emprego num dos gabinetes do Governo?"
De que valeu tudo isto aos 900.000 desempregados, Sr. Primeiro Ministro?

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