Ela adora ouvir histórias... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 10
- Essa gente do mar, em cada porto uma mulher... - pronunciou Emílio Fagundes com certa inveja.
- Basta olhar para ele e logo se vê o homem de acção - disse
Rui Pessoa, aposentado da Mesa de Rendas Estadual.
Zequínha Curvelo, na mão o livro em cuja capa colorida o
bravo marinheiro envergava um paletó parecido com o do comandante, resumia
aquelas primeiras impressões:
- Um herói, meus amigos, vivendo entre nós.
Caía a tarde, sem pressa, lentamente, igual à vida em
Periperi
- Lá vem ele... - anunciou alguém.
Voltaram-se todos, nervosos. Num passo vagaroso e digno, de
homem acostumado a cruzar os tombadilhos na longa solidão do mar, adiantava-se
o comandante pela rua, vestido com seu paletó marítimo, o cachimbo na boca, e,
sobre os revoltos cabelos, um boné ornado com uma âncora, ainda não visto antes.
Fitava o infinito, ia certamente com suas recordações, seus marinheiros mortos,
suas mulheres abandonadas nos perdidos portos. Ao passar à altura do grupo,
levou a mão ao boné numa saudação, efusivamente respondida. E o silêncio se
fez, acompanhando-o em sua caminhada. Inqui eto,
Zequi nha Curvelo não resistiu:
- Vou puxar conversa. . .
- Vê se traz o homem aqui
para uma prosinha . ..
- Vou ver se consigo.
Partiu em passos rápidos, alcançou o comandante.
- Esse homem deve ser uma enciclopédia. . . - disse o
Marreco.
Voltaram o comandante e Zequi nha,
agora em direcção ao grupo. Zequi nha
apontava os vizinhos, estaria anunciando nomes e títulos.
- Vem para cá...
Levantavam-se das cadeiras e bancos, animados. Zequi nha começou a fazer as apresentações, o comandante
apertava as mãos:
- Um velho marinheiro, às ordens. . .
Ofereceram-lhe a imponente cadeira de braços do velho José
Paulo. Sentou-se entre seus vizinhos, puxou uma baforada do cachimbo (todos os
olhos fixos no cachimbo onde os seios e as coxas nuas da mulher eram uma
sugestão de volúpias raras), confidenciou com sua voz um pouco rouca:
- Vim morar aqui
porque nunca vi dois lugares tão parecidos no mundo como Periperi e Rasmat, uma
ilha do Pacífico onde vivi uns meses...
- Veraneando?
Sorriu o comandante:
- Como náufrago ... Nesse tempo eu ainda era segundo-piloto
e embarcara num navio grego. . .
- Seu Comandante, por favor, um momento, um momento. . .
Espere um minuto antes de começar... - era Augusto Ramos quem interrompia. -
Deixe primeiro eu chamar minha mulher. Ela adora ouvir histórias.
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