Comandante Aragãosinho, meu rico Capitão... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio Nº 60
- Agora - disse o coronel quando tudo terminara e Vasco segurava amorosamente o diploma - vamos comemorar. Comandante Vasco Moscoso de Aragão, leão dos mares, tome do leme, leve-nos às putas!
De como se constrói um velho
marinheiro, sem navio e sem navegação
Nunca, jamais, na história da navegação,
foi tão honrado o posto de capitão de longo curso, tão zelosamente usado o
título de comandante, como por Vasco Moscoso de Aragão, com seu diploma
enquadrado em moldura dourada, na parede da sala, sua pose de homem de fibra
temperada nos mares distantes, sua dignidade de experiente lobo-do-mar.
Mandara imprimir a toda pressa cartões
de visita, seu nome precedido do título, seguido do posto. Passava pelas casas
de famílias conhecidas, relações feitas nas festas de Palácio e nas recepções
onde era convidado, e deixava-lhes cartões com os cumprimentos do Comandante
Vasco Moscoso de Aragão, capitão de longo curso.
Exigia o título, não admitia mais o
vergonhoso “seu” a antecipar-lhe o nome.
- Como vai, seu Vasco?
- Perdoe o amigo. Comandante Vasco,
capitão-de-longo-curso.
- Não sabia, desculpe.
- Pois fique sabendo e faça-me o favor
de não esquecer - entregava o cartão de visita do qual fez grande gasto,
sobretudo nos primeiros tempos.
Nos castelos e pensões, quando
interessada mulherzinha passava-lhe os braços em torno ao pescoço e a ele se
agarrava, murmurando:
- Seu Aragãozinho...
... ele reagia, paciente e firme:
- Filhinha, não sou “seu Aragãozinho”,
tenho um título, sou o Comandante Aragão, da Marinha Mercante.
Até Carol foi obrigada a mudar o
tratamento ao saudá-lo no alto da escada, rolando agora as sílabas em deleitosa
melodia:
- Comandante Aragãozinho, meu rico
Capitão...
O coronel e o capitão dos portos davam o
exemplo, comandante para cá, comandante para lá, em torno ao bilhar, na mesa de
poker bebendo cerveja ou estourando champanhe.
E até o Governador, ciente do caso e da
felicidade nova a inflamar o peito do generoso amigo de seu sobrinho, abriu os
braços ao vê-lo pela primeira vez após a cerimónia de diplomação:
- Como vai essa bizarria, Comandante?
Inclinou-se Vasco comovido:
- Ao serviço de Vossa Excelência, meu
Governador.
No escritório da firma Moscoso &
Cia. Ltda., onde aparecia agora apenas uma ou duas vezes por semana como se o
cheiro mercantil do bacalhau e do charque repugnasse as suas narinas
impregnadas de maresia, as ordens tinham sido categóricas, de Menendez a
Giovanni: proibição terminante de pronunciar-se o nome do patrão sem dar-lhe o
título de comandante.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home