Fiz obra de valia, perdoem-me a vaidade... |
OS VELHOS
MARINHEIROS
Episódio nº 47
Escrevi-o para preencher uma lacuna e sanar uma injustiça: muito se escreve sobre os Presidentes da República, sobretudo enquanto eles estão no poder, elogios a granel.
Os Vice-Presidentes, porém, ficam no
esquecimento, a não ser que assumam o governo. Quem se lembra, de memória, da
relação completa dos Vice-Presidentes da República?
Quem se recorda, por exemplo, do nome do
Vice-Presidente durante o mandato de Prudente de Morais ou de Hermes da
Fonseca? Duvido que saibam. Basta isso para demonstrar a oportunidade do meu
livro.
Animou-me igualmente a árdua empreitada
o concurso na ocasião aberto pelo benemérito Instituto Histórico e Geográfico
para monografias históricas, modesto prémio em dinheiro e impressão do trabalho
seleccionado às expensas do Instituto.
Honrosa láurea a tentar-me, consegui
tempo graças à catarata e ao compadre, atirei-me aos vices. Fiz obra de valia,
perdoem-me a vaidade, onde o interessado encontra o nome completo, a filiação,
as datas e locais de nascimento e morte, colégios e faculdades frequentadas,
cargos exercidos, obras realizadas, os feitos consideráveis de cada um dos
Vice-Presidentes
Não esqueci nem mesmo as esposas e os
filhos e até alguns netos são citados. Deu-se a um trabalho desgraçado e um
renitente catarro devido à poeira da Biblioteca Estadual.
Pois bem: concorri ao prémio, certo de
abiscoitá-lo, e tive a decepção de vê-lo atribuído ao outro único concorrente,
o doutor Epaminondas Torres, com um trabalho sobre a Sabinada.
Mesmo em número de páginas dactilografadas sua
monografia é inferior à minha: quarenta magras laudas, metade exacta do meu
livro.
E por que lhe deram o prémio numa tão
flagrante injustiça? Vão saber imediatamente. Ofendido em meus brios, fui ao
Instituto e discuti com o senhor secretário. Ele olhou-me por baixo dos óculos,
respondeu-me:
- Quem é o senhor para vir aqui falar em injustiça? Não conhece por acaso o Dr.
Epaminondas Torres, não sabe que se trata de um dos nossos mais ilustres
advogados? Que títulos possui o senhor?
Estão vendo? Meu erro foi ter concorrido
contra um bacharel, um doutor. Que títulos possuía eu? Nenhum, a não ser alguns
sonetos publicados em cantos de página de jornais e revistas.
Engoli o insulto, tentei obter do
Instituto pelo menos a impressão do livro já que me haviam afanado o prémio.
Encontrei boa vontade, os nobres historiadores deviam estar com a consciência
doendo. Mas o director da Imprensa Oficial, onde deviam ser impressos os
volumes, o meu e o premiado, tapeou lindamente os velhinhos do Instituto,
jamais mandou os originais para a oficina, meses depois deixou o cargo e o novo
director nem qui s ouvir falar no
assunto.
Assim o trabalho do Dr. Epaminondas
nunca foi publicado, não podendo estabelecer-se a comparação com o meu, o que
me leva a crer ter havido, em todo esse assunto, sujeira grossa.
Quanto aos Vice-Presidentes da
República, editei o livro por minha conta, imprimindo-o na gráfica do Sr.
Zitelmann Oliva que me cobrou um preço absurdo mas facilitou-me o pagamento,
tendo eu assinado duplicatas.
Suei para pagar, mas saiu um volume bonitinho,
noventa e duas páginas de “úteis informações”, como sobre ele escreveu o
erudito autor da História da Bahia, Dr. Luiz Henrique Dias Tavares:
- “Caro confrade, acuso e agradeço o recebimento
de seu livro Vice-Presidentes da República, repositório de úteis informações.
Cordialmente, Luiz Henrique”.
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