Largo do Seminário - Santarém |
HOJE É
DOMINGO
(Na minha cidade de Santarém em 17/8/14)
O funeral da família Espírito Santo está
agora a sair do adro numa longa e arrastada procissão que ao contrário dos
funerais de pessoas comuns em que todos vão calados e recolhidos à excepção dos
últimos da fila que se permitem conversar e fumar uns cigarritos, aqui é o contrário, os entes mais chegados, os que vão
à frente, são os que mais falam mas neste funeral todos barafustam de zangados
que vão.
O primeiro, foi o chefe do clã, Ricardo,
que veio reconhecer, numa entrevista caridosa, que efectivamente morreu, não
mais voltará a ser o que foi, o poder do dinheiro tê-lo-á perdido para sempre
mas guarda ainda o da memória, arma terrível que ele vai utilizar para
demonstrar que o seu falecimento foi digno e honroso.
Caiu, é verdade, mas em combate, quando
as forças contra si eram esmagadoras. Caiu como caem os grandes generais depois
de traídos, quando as hordas inimigas se tornam imparáveis, mas sempre com
honra e dignidade.
Ele sempre disse que na sua profissão,
as coisas são “amorais”, despidas de ética, que ninguém poderia esperar que ele
pensasse nos outros, se preocupasse com eles. As suas decisões sempre visaram interesses,
nunca as pessoas com excepção da sua, e fê-lo durante 23 anos com sucesso.
Então, o que ditou a sua morte?
-
A crise que se abateu sobre o país, sobre a europa e o mundo, que era já essa a
escala em que se movimentava.
Também ajudaram ao descalabro as responsabilidades e
traições da família e amigos que partilharam com ele as decisões, algumas
erradas, é verdade, mas quem não erra?
Ninguém julgue que ele cometeu crimes,
fraudes, ilegalidades, e se alguém o pensa que o prove, porque o seu amigo Daniel
Proença de Carvalho, liderando uma vasta equi pa
de advogados, se encarregará de desmontar todas essas indignas acusações.
Eles pedirão a colaboração dos mais
eminentes economistas que elaborarão pareceres altamente técnicos e profundos
que os advogados irão utilizar para demonstrar aos juízes, pouco entendidos
nestas complexas matérias de gestão de Bancos e de Grupos que ele, Ricardo
Espírito Santo, não passou de uma vítima num contexto económico e financeiro
totalmente desfavorável e que a partir de um certo momento se abateu sobre
ele e os seus BES/GES.
Crimes? – Nunca. Erros, talvez, mas quem
não os comete assediado como estava por tantos inimigos?
Roubos? – Muito menos. A esta escala
apenas se fazem operações financeiras. As pessoas têm que perceber que quem
movimenta dezenas de milhares de milhões por todo o mundo não pode roubar, isso
não existe, o conceito não se aplica, era inviável, impraticável.
Ninguém se esqueça que sobre a sua
actividade levada por diante em dezenas de países, um pouco por todo o mundo,
recaíam os olhares de centenas de “polícias” de toda a natureza que regulavam e
fiscalizavam as suas operações.
Ter conseguido chegar até aos 70 anos
incólume à frente desta máqui na de
poder e dinheiro, mesmo com este rasto agora de prejuízos e de ódios contra si,
não o diminui aos seus próprios olhos. Pelo contrário, só o engrandece.
Durante anos, o Dono Disto Tudo,
permaneceu na sombra, como manipulador de marionetas, movia cordelinhos e todos
se movimentavam obedientemente.
As vozes dos fantoches eram a sua
própria voz ditada através de SMS lacónicos e taxativos.
Que o resultado tenha sido este que
importância tem? Leia-se a história dos homens do poder e veja-se o cortejo de
ruínas que deixaram atrás de si - Champalimaud terá sido uma excepção que o
envergonhou - mas não referem, enquanto foram vivos, as vaidades que
alimentaram, as riquezas que distribuíram, os caprichos que satisfizeram...
Ricardo premiou a fidelidade, o
servilismo, a obediência, recompensou quem tinha de recompensar num jogo de
favores e contrapartidas que só ele compreendia na sua complexidade.
A sua vida foi um jogo de xadrez com
peças que ele criava e a que dava animação para as manipular num enorme
tabuleiro em que as casas que se preenchiam tinham muitas estrelas, criados de
libré e bandejas de prata com taças de champanhe autêntico.
Ele, Ricardo Espírito Santo, foi o maior
e orgulha-se da vida que levou e proporcionou.
As
falências há muito que estavam “anunciadas” na sua cabeça, porque sempre jogou
no fio da navalha e sabia, por isso, que uma crise que travasse o fluxo de
dinheiro ao ritmo necessário poria fim a todo o negócio e as empresas cairiam
como caíram umas atrás das outras, sem remissão.
Só aconteceu agora por mérito da sua
acção e não fossem as traições e talvez as coisas pudessem ter durado um pouco mais,
mas sim, estava na hora, ele próprio estava cansado, já tinha mesmo anunciado a
sua retirada.
Com este desfecho, em que para traz
ficaram os palermas, os outros accionistas que perderam milhões, o que muda vai
ser a natureza do seu descanso na reforma comandando agora equi pas de advogados, seguranças, agências de
comunicação, grupos escolhidos por si de economistas, um verdadeiro exército e
à velocidade a que a justiça corre no nosso país, Ricardo vai ter tempo para
envelhecer, não em paz mas em guerra, como ele sempre gostou.
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