sábado, outubro 25, 2014

Quer casar com ela?
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)



Episódio Nº 81

















A seguir envolveu-se em acalorada controvérsia com Álvaro Faria sobre a política local. Aruza e Fadul trocaram algumas palavras, ele tentou interessá-la na Bíblia e no Alcorão, sem obter sucesso.

 Ela não fazia sequer semblante de ouvi-lo, mordia os lábios: estudante posta de castigo ou assustada donzela, ameaçada em seus sonhos e projectos?

O olhar preocupado, dona Jordana, a mãe, abria-se em sorrisos para o convidado; não deixou que o silêncio perdurasse e Jamil o percebesse. Encontrou tema ao gosto de Fadul, os doces árabes: descreveu receitas, discutiu detalhes de mel e gergelim.

Não era apenas gorda, era roliça, mas no rosto ainda conservava vestígios de beleza. Há vinte anos passados, quando seu pai Chafik lhe impusera Jamil em casamento e obediente ela aceitara, não havia em Ilhéus begume mais sedutora.

 Aruza saíra a ela na formosura mas herdara do pai a firmeza e a teimosia.

Lá fora, na rua, alguém assobiava com insistência trecho vivaz da “Marcha Turca”

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No caminho para a pensão de Tilde, à cata das francesas, falsas porém supimpas, o non-plus-ultra em matéria de refinamento, segundo Álvaro Faria, Jamil Skaf suspendeu o passo e, tomando do braço de Fadul, nervoso, quis saber o que ele achara de Aruza.

 - Uma beleza, uma begume. Sem falar na educação.

Então, de chofre, o patrício perguntou:

 - Quer casar com ela?

Prosseguiu, a voz atropelada, quase ofegante:

 - A Preferida vai de vento em popa, vou abrir uma filial em
Itabuna e botei roça de cacau no Rio do Braço. Aruza é filha única.

 - Repetiu: — Quer casar com ela?

Indagação tão intempestiva, deixou Fadul atarantado a ponto
de não prestar a devida atenção ao protocolo da francesa que lhe coube. Mas depois, no quarto do hotelzinho de Mamede, deu-se conta que Jamil Skaf decidira escolher noivo para Aruza.

Que Jamil escolhesse noivo para a filha e o impusesse, tratava-se de procedimento habitual, correcto e justo, digno de aplausos.

Pai extremoso, preocupado com a felicidade e o futuro de Aruza, assim agia para lhe assegurar lar abençoado, vida tranquila, contínuo bem-estar.

 A boa tradição, provada e comprovada, incontestada, mandava que os pais, responsáveis pela sorte das filhas, elegessem entre os varões do reino ainda solteiros o melhor de todos para lhe propor aliança e dote.

Uns poucos se descuidavam do dever paterno deixando às donzelas suspirosas, levianas, imaturas, escolha e decisão em assunto de tal monta.

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