Largo do Seminário em Santarém |
HOJE É
DOMINGO
(Na minha cidade de Santarém em 7/5/15)
Em 2009, o último
governo de Berlusconi apostou numa grande expansão dos jogos de azar para
encher os cofres. Agora, confrontados com o vício que grassa nas classes
populares, o Estado decidiu legislar.
“Em Roma, numa
quarta-feira, por volta das seis da tarde, um grupo de sete pessoas instala-se
na penumbra de uma sala, na Rua Nicolò da Pistola.
Esta pequena sala de
jogo, instalada entre a Avenida Ostiense e o Bairro de Garbatelia, abriga uma
vintena de máqui nas caça-níqueis,
quer clássicas quer electrónicas.
Meia hora depois
ainda não trocaram uma palavra entre si. Uma mulher de cigarro na mão esquerda,
apoia incessantemente a mão direita sobre o botão do jogo. Trata-se de alinhar
três ou quatro esfinges egípcias para ganhar.
A máqui na emite uma música relaxante, entrecortada de
tempos a tempos, pelo som de uma cascata de moedas.
Tal como outros
milhares de italianos, os sete jogadores da Rua Nicole não sabem mas estão a
contribuir de forma decisiva para colocar a Itália ao abrigo das sanções de
Bruxelas por ultrapassagem do limite fixado para o deficit.
Em 2013, as receitas
fiscais geradas pelas máqui nas
caça-níqueis atingiram 4,3 mil milhões de euros e no ano passado os lucros
mantiveram-se mais ou menos ao mesmo nível, resultado este que se mostrou
providencial para o deficit se ficar pelos 3,033% do Produto Interno Bruto.
Mais 274 milhões de euros e a Itália teria sido alvo de novo procedimento por
deficit excessivo, o que teria o governo a novos e dolorosos esforças de
consolidação orçamental.
A Itália conta
oficialmente com metade das máqui nas
de jogo que estão recenseadas em todo o território norte-americano.
Os clientes deste
jackpot do Estado, um universo baseado num sistema de licenças públicas que não
tem paralelo no mundo, são, involuntariamente, os heróis da crise financeira.
Foram eles que têm salvo as contas Públicas.
Um Estado resolveu
viciar no jogo os seus cidadãos para criar receitas suficientes tendo em vista
atender às exigências dos limites de Deficits Orçamentais e isto é,
simplesmente, maqui avélico,
demoníaco, imoral, criminoso.
Estes Deficets foram estabelecidos pelos alemães (adopt ados pela Comunidade) que, entretanto, guardam
ciosamente os seus Superávites num fundamentalismo Orçamental que é imposto aos
restantes países da Europa Comunitária desprezando completamente o que tal
representa de sacrifícios, desgraças, desemprego para milhões de pessoas.
“Debaixo de grande pressão da Alemanha, os
países-membros da zona euro sentem-se obrigados a introduzir nas suas
Constituições cláusulas que limitem as suas despesas orçamentais. O Governo
alemão defende que estas cláusulas de equi líbrio
orçamental são necessárias para evitar futuras crises da dívida soberana.
Mas a regra do equi líbrio
orçamental não é uma boa ideia. Primeiro, porque se baseia num diagnóstico
errado da crise da dívida na zona euro. À excepção da Grécia, a razão por que
os países entraram em crise pouco tem a ver com uma gestão deficiente das
finanças do Estado.
A causa fulcral dos problemas das dívidas na zona
euro deve ser encontrada na acumulação insustentável de dívida dos sectores
privados em muitos países do euro.
Entre 1999 e 2008, quando a crise financeira
estalou, os proprietários de casas na zona euro aumentaram os seus níveis de
dívida de cerca de 50% do PIB para 70%. A explosão da dívida dos bancos na zona
euro foi ainda mais espectacular e atingia uma percentagem superior a 250% do
PIB em 2008.
Surpreendentemente, o único sector que não
teve um aumento do nível da dívida durante esse período foi o público que viu
mesmo a sua dívida cair de 72 para 68% do PIB.
As regras de equi líbrio
orçamental partem do princípio cínico de que toda a dívida do Estado é má. É
também a visão de que os governos são apenas gastadores de recursos e que não
contribuem para a produtividade da nação.
Se se encararem assim as coisas,
então sim, uma regra de equi líbrio
orçamental faz sentido. Esta visão, no entanto, é expressão de um
fundamentalismo económico que diz que o que os governos fazem é mau e só o que
os mercados fazem é bom”. (Paul De
Grauwe, Professor da Universidade Católica de Lovaina)
Faltam políticos a esta Europa e a
economia está longe de ser uma ciência exacta. No entanto, é por ela que
estamos a ser governados e isto por força de um país que impõe a todos os
restantes os seus pontos de vista.
A Europa vive em democracia, apesar de
todos os vícios e fragilidades que ela possui bem evidentes na eleição de um Berlusconi, mas a
democracia permite que os cidadãos se exprimam, embora condicionados,
livremente e nós, portugueses, conhecemos isso por experiência histórica
recente.
A resposta às situações criadas pelo
despotismo económico pelas consequência do mau estar das populações, irá ser de
natureza política. A deterioração social, em primeiro lugar, mudará o voto
político mas se este, só por si, não conduzir a desfechos mais favoráveis, a
situação de paz que vamos conseguindo ter poderá ver os seus dias contados.
Por isso, eu espero e desejo
governantes que tenham um pensamento político pois a economia, para além de não
ser uma ciência exacta, é apenas um instrumento, importante, não o nego, na
condução da política que deve orientar-se fundamentalmente por objectivos de
natureza humana e social.
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