terça-feira, setembro 01, 2015

A desonra da cabeça rapada por ter colaborado com o invasor.
70 Anos Depois












2 de Setembro de 1945. Decorrem hoje 70 anos e a guerra, a mais mortífera de todas, tinha oficialmente terminado. A europa ia poder descansar das bombas, a morte e a destruição que vinham dos céus acabavam, finalmente.
Alívio, esquecimento de um sonho mau tornado pesadelo era o que deveriam esperar os sobreviventes de tamanha calamidade mas, em vez disso, foi um despertar carregado de ódio, sedento de vingança.
Quatro anos de uma ocupação humilhante, por uma potência militar que se instala no nosso país, na nossa casa, que põe e dispõe de tudo quanto era nosso, incluindo as nossas vidas, é como mergulhar no mais tenebroso dos nossos sentimentos.
Pensar que teria sido possível sobreviver a esses anos de ocupação apenas com alívio e tentativa de esquecimento é ignorar a própria natureza humana.
No dia seguinte, a 3 de Setembro de 45, explodiram o ódio amarfanhado dentro dos peitos, a vingança retemperadora pelos danos sofridos, de toda a espécie, o regresso ao passado recente para o ajuste de contas, a tentativa inútil de esquecer.
A Conferência de Yalta, reunindo os vencedores, que tinha começado a 4 de Fevereiro e terminara a 11, foi considerada um fracasso esmagador pela cedência deplorável de Churchill e Franklin Roosevelt, este já muito doente, faleceria dois meses depois, a Estaline, a quem entregaram a Polónia e outros países da Europa de Leste para quase meio século de denominação comunista soviética.
Nada poderia correr bem depois daquela guerra devastadora provocada por um louco em fase terminal, nem politicamente, nem no coração das pessoas sobreviventes.
As mulheres foram as grandes vítimas. Foi sobre elas, de maneira acutilante que foram exercidas vinganças sob a acusação de colaboração “horizontal” com os soldados alemães.
E quem eram essas mulheres?
- Muitas delas eram prostitutas que se tinham limitado a continuar a sua actividade, agora com soldados alemães, outras eram adolescentes patetas que achavam que namorar com um soldado alemão era um acto de desafio, outras, ainda, eram professoras primárias que por viverem sozinhas eram obrigadas a hospedar em suas casas soldados alemães e foram acusadas de serem o “colchão dos boches”.
Por trás destes actos de vingança havia, igualmente, inveja pelas “benesses”, ou pretensas “benesses”, que essas mulheres teriam recebido em termos de alimentação ou de distracções.
Às mulheres suspeitas de colaboração cortava-se lhes o cabelo e, bastava uma cidade, vila ou aldeia, ser libertada pelos aliados e logo os “barbeiros” entravam em actividade, passeando-as, depois, de cabelo rapado em camiões abertos num espectáculo vil que se tornou vulgar, nessa altura, em França.
Os anteriores grupos da Resistência à ocupação alemã mostraram-se, alguns deles, implacáveis para com as mulheres, talvez como forma, também, de chamarem sobre si as atenções dos seus compatriotas mas, cumprindo uma ameaça que já vinha sendo feita por eles, na imprensa clandestina, desde 1941.
Muitos franceses e soldados aliados ficavam revoltados perante o tratamento infligido a estas mulheres transportadas em camiões de caixa aberta, por vezes ao som de um tambor como se tratasse de um grupo de condenadas e a França estivesse a viver a Revolução de 1789.
Umas eram besuntadas com alcatrão, outras estavam semi-nuas e outras, ainda, enfeitadas com cruzes suásticas desenhadas a tinta ou com baton.
Jock Colville, secretário particular de Churchil, registou a sua reacção perante uma cena destas:
- “Vi passar um camião com uma dúzia de desgraçadas, com a cabeça completamente rapada. Choravam, de cabeça baixa, cheias de vergonha. Ainda que enojado com tanta crueldade, disse para comigo que nós, britânicos, não tínhamos sido invadidos nem ocupados há 900 anos, pelo que não seríamos os juízes mais indicados”.
A vingança sobre as mulheres representou a expiação das frustrações e do sentimento de impotência dos homens humilhados pela ocupação do seu país.
A natureza humana tem, dentro de si, mecanismos de compensação: às violações por parte dos soldados alemães vencedores, as humilhações impostas às mulheres francesas acusadas de colaboracionistas pelos Resistentes franceses.
Só os espíritos superiores conseguem ultrapassar estas misérias próprias da nossa natureza, mas esses estão sempre em grande minoria incapazes de travar estas vagas de comportamentos aplicados como formas de justiça.

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