Um bonsai |
O País
Bonsai
Bonsai
Um bonsai não serve para mais nada que não seja para a contemplação. De um bonsai não se extrai madeira, nem fruto. Apenas se extrai prazer contemplando-o. O que já não é pouco.
Portugal é um país bonsai. O nosso
território é apenas um pequeno tabuleiro. É pouco território para grandes
crescimentos. É pouco território para grande economia. É pouco território para
grande riqueza. (Há o mar, claro, mas nada lá se faz).
Portugal é apenas uma miniatura que se parece
com um país, embora uma miniatura bem feitinha, uma gracinha, como diria um
brasileiro.
Portugal está organizado, tem
infra-estruturas de primeiro mundo, tem cidades limpas e sinalizadas, tem
restaurantes bons, tem aeroportos, tem auto-estradas, tem bons carros, tem rede
de fibra e wi-fi por todo o lado, é seguro, as pessoas
vestem-se bem, as raças convivem umas com as outras (desde que tenham dinheiro,
claro), as praias são do mais civilizado e prazenteiro que há, a gastronomia é
descomplicada, o vinho é bom, o peixe e o marisco são ainda melhores, as
farmácias funcionam, os hospitais têm boas máqui nas
e bons médicos, as lojas e lojinhas são simpáticas e falam-se línguas.
Claro que há limitações, como seria de
esperar de uma miniatura: a justiça apenas se parece com justiça, a cultura
apenas se parece com cultura, os gestores apenas se parecem com gstores...
Enfim, é um bonsai, algumas coisas serão
sempre miniaturas. Mas ainda assim, Portugal, com mais ou menos dificuldade,
podando aqui e ali, regando e
adubando regularmente, tem cumprido o sonho de se parecer com os grandes países
modernos.
Somos, apesar de todos os problemas
recentes, um bonsai bem conseguido, daqueles que lembram mesmo a coisa que
imitam.
Mas somos apenas um bonsai, e às vezes
esquecemo-nos de que vivemos numa árvore de contemplar e desatamos a exigir
demais desta pobre miniatura.
Uns querem mais ramos e mais firmes,
outros prometem maior copa para fazer mais sombra.
Chegamos mesmo a querer que dê flor e
fruto como as árvores grandes. Mas não dá.
Dá a ocasional bolota e nada mais. O
destino do bonsai está limitado pelo tabuleiro onde vive e aqui lo a que melhor pode aspirar é a miniatura.
Claro que para nós, os habitantes, a
árvore é do tamanho dos nossos sonhos, do tamanho dos países com que gostamos
de nos comparar e a cujas alturas aspiramos ascender: as Américas, as
Inglaterras, as Alemanhas, as Franças; é lá que vamos buscar os modelos.
Acontece, como é lógico e de bom senso,
que o tratamento não pode ser o mesmo. Não se pode deixar crescer livremente um
bonsai esperando que a natureza siga o seu curso.
Se o fizermos, acabaremos apenas com uma
arvorezinha defeituosa, mal nutrida, raquítica. É esse o perigo.
Para parecer uma árvore como as outras,
um bonsai tem de ter muito mais cuidados, tem de ser especialmente nutrido, com
receitas que não são as que a natureza usa nas grandes árvores – que na prática
é o laissez faire, o deixar o mercado
funcionar – tem de ser especialmente podado, tem de ser regado com frequência.
Um bonsai dá muito mais trabalho do que
uma árvore grande, e dá muito menos de tudo.
Na verdade, não dá nada a não ser dispêndio
de tempo e, no fim, prazer quando se contempla. É um hobby.
Até agora este nosso bonsai tem sido razoavelmente bem
tratado e ainda é um prazer de contemplar – que o digam os milhares de turistas
e estrangeiros que por cá passam e os que por cá ficam depois de comprarem o
seu pied-à-terre.
Seria uma pena se o proselitismo
financeiro e os seus modelos condenassem como irrelevante, improdutivo e
dispensável este maravilhoso hobby que
é o pequenino país.
Como seria uma pena que uns e outros,
por cá, lhes dessem ideias, desatando a estragar tudo.
Pedro Bidarra
(Publicitário)
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