(Domingos Amaral)
Episódio Nº 135
Alguém gritou e Ramiro
agachou-se junto a umas pedras enquanto outros fugiam. O grito transformou-se
em urro, e foi seguido de um baque seco.
O Urso tombara trespassado
por três flechas. O rato correu para ele mas o seu amigo já não vivia, havia
muito sangue no seu peito. Então retirou-lhe a espada e de cócoras regressou à
torre, onde já se tinham refugiado o Ameixa, o Velho, o Peida Grande e o
Santinho.
Só Ramiro continuava em
campo aberto, escondido atrás de umas pedras. Já com o arco tenso e uma flecha
pronta, correu, contornando a torre, e desapareceu da vista dos outros.
Estes ouviram gritos, mas
não sabiam o que se passava. De súbito, o filho de Paio Soares surgiu à porta
da torre e gritou-lhes:
- Para os cavalos, eles são mais de vinte, aqui seremos mortos!
Os outros saíram da torre a
correr, e ele foi o único que não se dirigiu ao curral. Subiu a muralha e
deitou-se junto de umas pedras, apontando o arco.
Viu os companheiros junto
dos cavalos. O Rato montou num, o Ameixa e o Velho noutro, e para o terceiro
subiram o Peida Gorda e o Santinho, e logo partiram, mas o último animal ficou
para trás, pois estava mais pesado.
Quando passaram pela porta
da muralha, várias flechas cruzaram o ar e o Santinho tombou para frente,
ferido por uma delas, enquanto o Peida Gorda dava um grito, também atingido.
O cavalo deles continuava a
perder velocidade e Ramiro sabia o que ia acontecer se nada fizesse, por isso
saiu do seu esconderijo e trepou pelas pedras. Disparou uma flecha e ouviu um
grito.
Atingira um inimigo, mas
estava na altura de sair dali, pois um grupo de seis sarracenos aproximava-se a
pé. Ainda disparou mais duas flechas atingindo mais dois e assustando os
outros, que recuaram para dentro da torre.
Então saltou para o chão e
correu para o cavalo de Gondomar, o único que restava no improvisado curral.
Montou-o e dirigiu-se para a porta do castelo.
Sabendo que podia ser
atingido ao sair, tombou para o lado direito, para se proteger com o corpo do
animal. O seu gesto foi providencial, pois os arqueiros estavam á esquerda, e
as três flechas que cruzaram o ar na sua direcção passaram por cima do cavalo
de Gondomar.
Quando se endireitou, trinta
metros depois, viu ao longe os companheiros, já muito próximos da estrada de
Coimbra. Incentivou o cavalo a galopar, mas nesse momento descobriu um segundo
grupo de sarracenos, estacionado à beira do caminho, entre ele e os seus
companheiros. A liderá-lo estava um cavaleiro coberto com o manto azul-escuro
dos Almorávidas.
Ramiro concluiu que devia
ser o tal Abu Zhakaria e estacou o cavalo. Do seu lado direito, havia uma
encosta íngreme, coberta de penedos, que parecia intransponível. Do esquerdo,
estavam os muçulmanos. E atrás de si já vinha o primeiro grupo de inimigos, os
que haviam atacado Soure. Acenou o arco na direcção do chefe sarraceno,
provocando-o.
De súbito, executou com o
cavalo uma manobra inesperada, para a sua direita, obrigando-o a trepar por
cima dos penedos. Passava todas as manhãs por ali, conhecia o terreno como
ninguém. Quando chegou ao topo da encosta, escondeu-se e observou os
sarracenos. Nenhum o seguia. Grande parte dos homens de Abu Zhakaria regressava
a Soure, e apenas alguns seguiam os cristãos, cavalgando estrada fora.
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