(Domingos Amaral)
Episódio Nº 195
O portucalense lançou-lhe um último e
desesperado pedido:
- Vinde ter ao meu quarto!
Zaida deu-lhe um novo e rápido beijo na
boca e prometeu:
- Um dia, hoje não, a minha mãe não deixa.
Levantou-se no preciso momento em que Zulmira entrava na
sala. Gonçalo lançou-lhe um adeus desolado, mas mal as duas desapareceram,
praguejou:
-
Irra, é pior que uma cristã!
Despejou mais vinho pela goela abaixo e
depois dirigiu-se ao alpendre, onde perguntou a Chamoa com descaramento:
-
Há soldadeiras em Tui?
A rapariga desaprovou tal conduta, mas perante
a insistência dele indicou-lhe o local, e Gonçalo fingiu afastar-se,
resmungando.
Chamoa contou então ao príncipe que as
mouras tinham dificuldade em entregar-se aos cristãos.
A Zaida ainda é virgem. A irmã também, mas
tem o seu amado.
Narrou a bela paixão de Fátima por Abu
Zakaria que remontava à infância e era correspondida, pois ele tentava
resgatá-la aos cristãos.
É uma cantiga de amor – murmurou.
Afonso Henriques sorriu-lhe.
E a nossa, que cantiga é, de amor ou de
amigo?
A rapariga mordeu o lábio atormentada.
Meu coração é vosso, mas meu corpo é de
meu marido. Carrego mais um filho no ventre, não me posso dar a vós.
Afonso Henriques olhou para o céu
estrelado e respirou fundo.
-
Podia rapt ar-vos hoje, vosso tio não
está cá, ninguém me impedia. Mas acho que já não sou o vosso amado.
Chamoa protestou:
- Ora, que tolice. Não sei é se ainda me
amais!
De súbito, com ar angustiado, perguntou:
- Ides fazer a guerra a Dona Teresa?
Afonso Henriques manteve-se calado, mas
Chamoa conhecia as vontades violentas que percorriam o Condado. Aflita,
murmurou:
-
Meu marido e meu amado em luta um com o outro...
O príncipe recordou-lhe a sugestão que
fizera a Paio Soares de se juntar aos portucalenses, mas Chamoa receava que
Fernão Peres mandasse matar o marido, se este o traísse.
De repente abraçou fortemente o príncipe e
pediu-lhe:
-
Meu amado, prometei-me que se houver batalha contra meu marido não o matareis!
Afonso Henriques suspirou.
Bela Chamoa, as batalhas são
imprevisíveis. Por vezes nem sabemos contra quem estamos a lutar!
A rapariga insistiu ainda com mais ênfase.
É o pai dos meus filhos, não o mateis,
prometei-me.
Em troca, o príncipe pediu-lhe que
deixasse Paio Soares depois do nascimento do segundo filho, o que ela aceitou.
Então abraçaram-se , repetindo a promessa
mútua e deram um beijo longo na boca. De repente Chamoa abriu um sorriso
malandro.
Desejais que vos prove o meu amor? –
perguntou.
Sorrindo, ajoelhou à frente do príncipe e
ali, no alpendre, sob o belo luar de Tui, beijou-o como fizera junto ao rio da
Loba, em Viseu.
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