(Domingos Amaral)
Episódio Nº 215
A barafunda era tremenda, o pó levantava-se, ouviam-se gritos misturados com o trote dos animais, ordens e contra-ordens. De repente, Paio Soares esporeou o cavalo e atacou.
A sua espada caiu sobre o
escudo do príncipe que a conseguiu suster a custo, mas o mordo-mor foi mais rápido
e com malícia espetou a ponta da arma no flanco do cavalo de Afonso Henriques.
A montada ajoelhou com
dores, atirando o príncipe ao chão. Desarmado, este levantou-se com dificuldade,
mas logo Paio Soares lhe apontou a espada ao peito.
Naquele momento bastava um
gesto e o príncipe de Portugal era um homem morto. Contudo, Paio Soares não
investiu e limitou-se a dizer:
- Só não vos mato porque Chamoa me pediu.
Depois acrescentou:
- Temos de falar.
Nunca ninguém soube o que
queria, pois Afonso Henriques insultou-o e cuspiu na sua direcção.
Irritado o mordomo ordenou:
- Dai ordem para o fim da batalha e
rendei-vos!
Afonso Henriques começou a
descer a elevação a pé e pouco depois agarrou um cavalo que passava e
afastou-se, derrotado.
Raimunda deduziu que ele se
dirigia para castelo de Guimarães, humilhado e de cabeça baixa, mas várias
centenas de metros à frente um grupo de nobres aproximou-se.
Eram meu tio Ermigio, meu
pai e Soeiro de Sousa que montados nos seus cavalos e vestidos nas suas dalmáticas
coloridas, pararam junto de Afonso Henriques.
Onde ides? - perguntou o pai
de Gonçalo.
O príncipe apenas mordia os
lábios e o nobre acrescentou:
- Meu filho e o Lidador resistem, e o Lourenço
está a vencer o Bermudo. Voltai ao combate, príncipe de Portugal!
Meu pai, Egas Moniz, ergueu
então uma enorme espada, e disse ao príncipe:
- Eis a espada de vosso pai,
guardei-a para um dia como hoje.
O príncipe pegou na espada
com que se armara cavaleiro em Zamora, dois anos antes. As lágrimas corriam-lhe
pela cara, estava desanimado e de olhos no chão, disse:
- Se avanço contra eles morro. Se recuo, irão
ao castelo matar-me.
Então, Soeiro de Sousa, olhando-o
fixamente perguntou:
- Nesse caso porque haveis de recuar?
Afonso Henriques cerrou os
dentes e compreendeu o que tinha de fazer. Beijou a espada de seu pai, deu meia
volta e cavalgou de novo na direcção do combate.
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