(Domingos Amaral)
Episódio Nº 17
A pé, levando o cavalo pela
rédea, Gonçalo de Sousa acompanhou-a pelas ruas de Coimbra, em direcção à casa
onde as irmãs estavam instaladas, tendo ficado a saber que a rapariga tinha
obtido uma autorização especial do bispo Bernardo para poder realizar as suas
leituras na Sé.
Depois, já à porta da
habitação, numa rua de Almedina, Gonçalo perguntou a Zaida se a irmã Fátima
voltara a planear perigosas fugas.
Continua à espera do seu
amado Abu, certa de que a virá buscar. Mas obriguei-a a prometer não se
arriscar em loucuras solitárias!
Ao dizer isto, Zaida sorriu,
dengosa, batendo as pestanas e Gonçalo de Sousa interpretou esse leve sinal
como um incentivo.
Admiro a paixão de vossa
irmã por Abu Zhakaria. Quem me dera que uma mulher me amasse assim! – exclamou
com um ar exageradamente romântico e ligeiramente postiço.
A princesa moura soltou um
divertido risinho e ripostou:
- Continua o mesmo finório! Julgais que caio
na vossa teia?
Fingindo-se ofendido,
Gonçalo recuou um passo e indignou-se:
- Que dizeis, sois a única por quem estou
enamorado! Todas as sonho em levar-vos para Córdova!
Zaida sorriu de novo, mas
lavrou um pequeno protesto:
- Se fosse verdade não vos amigáveis com
outras...
Notando naquele queixume a
revelação de um ciúme deveras entusiasmante, Gonçalo, aproximou-se e falou ao
ouvido da moça.
Sou um tolo, bem sei, mas
apenas porque me afastais. Se vos désseis esquecia todas as outras mulheres do
mundo porque em nenhuma penso como penso em vós.
Zaida baixou um pouco a
cabeça e a testa tocou no queixo daquele hábil galanteador. Tristonha, fez
beicinho e murmurou:
- É bom ver-vos, sinto-me muito sozinha.
Filha, quereis dar-vos a ele?
Devido à morte de Zulmira,
aquela que era uma das netas do último califa de Córdova, confessou que a sua
existência presente era pesada e sombria.
A irmã Fátima ainda aspirava
à glória que dizia merecer, sonhando com o regresso ao trono da antiga capital
do califado muçulmano da Andaluzia, mas Zaida já não alimentava essa fantasiosa
crença.
Em voz baixa, recordou que
quase todos que amado tinham morrido. A solidão em Coimbra tornara-se um duro
hábito e ver Gonçalo ali era motivo de grande felicidade.
Sempre simpatizara com ele,
e sedenta de companhia e atenção, convidou-o a entrar em sua casa alegando que
era exímia cozinheira e lhe serviria um belo repasto.
Parado, fingindo receio e
desconfiança, Gonçalo perguntou:
- A Fátima não me cortará a cabeça?
Zaida deu uma gargalhada,
aquele rapaz diverti-a. Enquanto abria a porta e ambos entravam, explicou.
Continua a mesma fera, mas
não tem nenhuma arma.
Mao o disse, ouviu-se uma
voz incomodada na sala. No escuro, alguém afirmou o seu desprezo por ver ali
Gonçalo:
- Tirai-me esse cristão da frente!
Zaida ignorou a ordem da
irmã e explicou que o convidara para almoçar escabeche de sardinhas, dando-lhe
também a provar o arroz-doce que a mãe Zulmira a ensinara a cozinhar.
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