quinta-feira, setembro 21, 2017

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Nunca esquecerei o desabafo do meu vizinho do 3º Esq., há uns anos atrás, quando um dia nos cruzamos no elevador e ele desabafou: -  "o dia em que morrer vai ser o mais feliz para mim", e as palavras saíram-lhe sentidas, em voz lenta, envoltas em grande tristeza.

Pessoa de poucas palavras, vivia sozinho por motivos de viuvez e percebia-se que arrastava os dias sem interesse até que um dia, lá estava na porta do prédio, o papelinho com a Cruz preta a anunciar uma morte no prédio. Tinha sido a dele. Consumara-se o desejo, finalmente a morte chegara... e a pedido! Morrera de tristeza.

Tenho a idade dos"velhos" do meu tempo de juventude, sentados no banco do Largo da Chã da Eira a verem o tempo passar. Não liam, não conversavam, por vezes jogavam à sueca e o meu t´Zé Menaia, que tinha sido maqueiro na 1ª GGM e fora gazeado, "baralhava-se" muito e ia à procura do ás com a bisca. Quando a via partir, levada pelo mão do adversário, levantava o boné com o indicador e polegar, coçava a cabeça com os restantes dedos interrogando-se, mentalmente, como tinha aquilo sido possível...

- O t´Zé Menaia e os meus tempos de rapaz, na taberna do Zé Palmeiro, antes de lhe chamarmos Café...

- Há quantos anos!... Por vezes dou comigo a recordá-los parecendo-me terem sido já noutras vidas, tantos os anos que já lá vão... e hoje que já nada sei daquela gente: tão pouco se são vivos ou já mortos, pelo menos os da minha idade, os que ainda deviam vivos pelas minhas contas.

Aquelas longas e quentes tardes do meu "querido mês de Agosto" que metiam passeios ao rio Tejo com as inevitáveis petiscadas.

- Oh Quim, toma conta do João, cuidado com o rio... - dizia-me a mãe -  e lá íamos e lá ia indo o João, corrente do rio abaixo direito ao canto do inferno onde a água fazia um remoinho e afundava.

Não chegou lá, por pouco... O Zé Burguete, bom nadador, da "escola" de Moçambique, chegou ao nosso encontro providencialmente mais tarde, mesmo a tempo ainda de correr ao longo da margem e trazer por um braço o amigo João que lá ia... direto ao canto do inferno.

- "É pá, estava a ver que nunca mais chegavas!..."  reclamou o João que entretanto ia ao fundo e vinha ao de cima com o braço no ar e eu dentro de água, com ela pela barriga e sem sequer saber nadar.

- Ah, João, João! -  Se a tua mãe tivesse vindo a saber do ocorrido nunca mais tinhas ido ao Tejo...

Ontem, fui a Lisboa almoçar com os meus colegas - o almoço mensal a que a minha "netita" chama de "velhotes", talvez porque já têm cabelos brancos.

É sempre bom revê-los, já um pouco tortos, como eu. mas nestas idades já não se pode ser muto exigente...

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