terça-feira, setembro 29, 2015

Nas fazendas contava-se uma mulher para dez homens
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nº 349






















Noiva digna de usar grinalda e véu, apontava-se uma única: a menina Chica, de namoro firme com Balbino. Vivia em casa dos pais enquanto as demais candidatas a receber a bênção nupcial eram todas elas amigadas, algumas com filhos.

A própria Chica, apesar de moderninha e de continuar no lar paterno, quem se disporia a botar a mão no fogo por sua virgindade?

Em Tocaia Grande, como aliás em toda a extensão do país grapiúna, donzelice costumava durar pouco; nas fazendas contava - se uma mulher para dez homens e a flor do cabaço fazia-se colher ainda em botão.

Chica deixava-se ver em companhia de Balbino nos esconsos do rio, nas clareiras da mata, se ainda conservasse os tampos, de duas, uma: ou bem Balbino era broxa ou ocorrera milagre.

Fosse como fosse, sia Leocádia veio em pessoa encomendar o vestido de noiva da neta e explicou a dona Natalina que o desejava à moda sergipana, com todos os apetrechos e atavios de donzela.

As outras não pediram tanto, contentavam-se com trajes simples, não queriam casar cobertas com trapos velhos.

Cleide, também neta de sia Leocádia, prima de Chica, estava de bucho cheio; encomendou um vestido azul da cor do seu cordão de pastoras no reisado, o azul da Virgem Imaculada.

Já que se fala nas netas de sia Leocádia e se citou o reisado, registre-se ainda no rol das casamenteiras à espera da Santa Missão a moça Aracati, que figurara a Senhorita Dona Deusa no desfile.

 Para surpresa dos parentes, inclusive da avó atenta, logo depois do triunfo na noite de Reis, apareceu em casa de braço dado com Guido, dizendo que iam morar juntos.

Haviam os estancianos concorrido com três prenhas na estação dos partos, colaboravam com três noivas na safra dos casamentos.

Amigadas antigas também ordenaram vestidos a dona Natalina ou os costuraram em casa. Abigail trouxe o seu de Taquaras, onde ela e Bastião da Rosa estavam vivendo desde a enchente: os frades iriam até lá mas ela queria se casar em Tocaia Grande, ao mesmo tempo que Isaura, sua irmã: festança em casa de Zé dos Santos e sia Clara.

Das fazendas chegaram casais em quantidade, não era sempre que uma Santa Missão aparecia nas bandas do rio das Cobras.


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Não menos afobados estavam os pais das crianças à espera de batismo. Cerca de uma dezena de pagãos aguardavam em Tocaia Grande a oportunidade de se fazerem católicos romanos, escapando do limbo se morressem infantes, do inferno se chegassem a adultos.

 Houve uma animação de compadrio, a escolha dos padrinhos gerava discussões e risos. Zilda mandou um recado para Bernarda: escolhesse os padrinhos para Nado pois o menino seria batizado na passagem da Santa Missão.

No leito com Natário, Bernarda trouxe o assunto à baila:

- Padrinho já pensou em alguém? - Descansava a cabeça no peito do Capitão, ele lhe tocava os cabelos desnastros.

- Se tu quer, nós faz assim: eu escolho o padrinho, tu a madrinha.

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