domingo, maio 25, 2008


O Monoteísmo
(Richard Dawkins)





Um deus tirano, feroz e ciumento de quaisquer outros deuses, impôs-se a um povo que há 3.500 anos vivia no deserto e iniciou o Monoteísmo.

Esse deus chamava-se Jeová e o povo era o Judeu.

Gore Vidal, romancista e ensaísta norte-americano que viveu muitos anos em Itália, com vários livros traduzidos em português, escreveu a propósito do Monoteísmo:

«O grande mal indizível no centro da nossa cultura é o monoteísmo. A partir de um texto bárbaro da Idade do Bronze conhecido como Antigo Testamento, evoluíram três religiões anti-humanas – O Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo.
Trata-se de religiões de um deus do céu. São literalmente patriarcais – Deus é o Pai Todo-Poderoso – daí o desprezo pelas mulheres desde há 2.000 anos nos países atormentados por esse deus do céu e pelos seus representantes masculinos na terra.»

A mais velha das três religiões abraâmicas, e nítido antepassado das outras duas, é o Judaísmo: originariamente era o culto tribal de um único Deus ferozmente antipático, doentiamente obcecado por restrições sexuais, pelo cheiro de carne queimada, pela sua própria superioridade em relação aos deuses rivais e pela exclusividade da tribo do deserto que elegeu como sua.

Durante a ocupação romana da Palestina, o Cristianismo foi fundado por Paulo de Tarso enquanto facção do Judaísmo menos implacavelmente monoteísta e também menos fechada que, levantando os olhos do meio dos Judeus os erguia para o resto do mundo.

Vários séculos mais tarde, Maomé e os seus seguidores regressaram ao monoteísmo intransigente da versão originária judaica, embora sem a sua vertente exclusivista.

Fundaram assim o Islamismo com base num novo livro sagrado, o Corão ou Quran ao qual acrescentaram uma poderosa ideologia de conquista militar para a propagação da fé.

Também o Cristianismo se propagou por meio da espada, brandida primeiro pelas mãos dos romanos – depois do Imperador Constantino o ter promovido de culto excêntrico a religião oficial – e posteriormente pelos cruzados e mais tarde os conquistadores espanhóis e outros invasores e colonos europeus com o respectivo acompanhamento missionário.

Não é clara a razão pela qual o Monoteísmo deve ser visto como um progresso óbvio relativamente ao Politeísmo no sentido do seu aperfeiçoamento.

Ibn Warraq, ateu muçulmano, autor de “Why I am Not a Muslim” e “The Origin of the Koran” conjecturava com certa graça que o Monoteísmo está, por sua vez, condenado a subtrair mais um deus e a tornar-se ateísmo.

Especialmente no ramo católico romano do Cristianismo o namoro com o politeísmo é evidente.

À Santíssima Trindade junta-se Maria, «Rainha dos Céus» deusa em tudo menos no nome e seguramente logo atrás de Deus enquanto destinatária de orações.

A seguir vem um autêntico exército de santos cujo poder intercessor os torna, senão semideuses, pelo menos dignos de serem abordados dentro da área da especialização de cada um.

O Fórum da Comunidade Católica oferece solicitamente uma lista de 5.120 santos mais as respectivas áreas de competência, que incluem dores de barriga, vítimas de maus tratos, anorexia, traficantes de armas, ferreiros, ossos partidos, técnicos de bombas e desarranjos intestinais, etc, etc.

Todos estes santos, por sua vez, estão distribuídos por nove ordens: Serafins; Querubins; Tronos; Dominações; Virtudes;
Potestades; Principados; Anjos (o mais conhecido dos quais é o nosso “anjo da guarda”) e, finalmente, os Arcanjos que são os comandantes de todos os outros.

O que impressiona em toda esta mitologia católica, para além de outros aspectos, é a ligeireza inconsequente com que estas pessoas vão congeminando pormenores, tudo fruto da mais descarada invenção.

O Papa João Paulo II criou mais santos do que os seus antecessores todos juntos no decorrer dos últimos séculos, tendo uma afinidade especial com a Virgem Maria.

Os seus devaneios politeístas ficaram perfeitamente vincados quando, em 1981, vítima de uma tentativa de assassínio em Roma, atribuiu à intervenção de Nossa Senhora de Fátima a circunstância de ter sobrevivido: «Uma mão materna guiou a bala».

Não podemos deixar de sentir uma certa curiosidade em saber porque não terá ela guiado a bala de forma a nem sequer o atingir.

Outros poderão pensar que a equipa de cirurgiões que o operou durante seis horas mereceria, pelo menos, uma parte dos louros mas talvez as suas mãos também tenham sido maternalmente guiadas.

O ponto relevante é que não foi só Nossa Senhora que, na opinião do Papa, guiou a bala mas, concretamente, Nossa Senhora de Fátima.

E então Nossa Senhora de Lurdes, Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora de Medjugorge, Nossa Senhora de Akita, Nossa Senhora de Zeitun, Nossa Senhora de Garabandal e a Nossa Senhora de Knock, estariam todas elas, no momento do disparo, indisponíveis com outras incumbências?

E que dizer da Santíssima Trindade, uma espécie de um Deus em três partes, ou três em um.

E reparem no primor do raciocínio teológico com que A Enciclopédia Católica nos esclarece esta questão:

“Na unidade do Divino existem três Pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, sendo todas verdadeiramente distintas umas das outras. Assim sendo, e nas palavras do credo atanasiano: o Pai é Deus, o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus, e no entanto, não existem três Deuses, mas sim um Deus.”

Mas, como se isto não fosse suficientemente “claro” a mesma Enciclopédia cita ainda São Gregório, O Traumaturgo, teólogo do século III:

“Nada existe, portanto, na Trindade que seja criado, nada que seja sujeito a outrem; nem existe nada que tenha sido acrescentado como se não tivesse existido anteriormente, mas antes tivesse sido introduzido mais tarde; por isso, o Pai nunca foi sem o Filho, nem o Filho sem o Espírito Santo; e esta mesma Santíssima Trindade é imutável e para sempre inalterável.

Não sabemos que milagres valeram a São Gregório o cognome mas, entre eles, não estava com certeza, a pura lucidez.

As palavras de São Gregório carregam aquele travo caracteristicamente obscurantista da teologia.

Thomas Jefferson, a propósito da Santíssima Trindade, estava certo quando afirmou: «o ridículo é a única arma que pode ser utilizada contra proposições ininteligíveis».

E mais adiante:

«Falar de existências imateriais é o mesmo que falar de nadas. Dizer que alma humana, os anjos e deus são imateriais é o mesmo que dizer que eles são nadas ou então que não existe deus, nem anjos, nem alma. Não consigo pensar de outra maneira…sem mergulhar no imenso abismo dos sonhos e espectros. Bastam-me e já me ocupam o suficiente, as coisas que são, para me atormentar ou preocupar com as que podem de facto ser, mas das quais não tenho provas.»

James Madison, 4º Presidente dos EUA, de 1809 a 1817, desabafava com veemência:

«Durante quase 15 séculos, a autoridade oficial do Cristianismo foi posta à prova. Quais foram os resultados? Por toda a parte, e em maior ou menor grau, orgulho e indolência no clero, ignorância e servilismo nos leigos; e nuns e noutros, superstição, preconceito e perseguição.»

Para Benjamin Franklin «os faróis são mais úteis que as Igrejas».

No trecho de uma carta para Jefferson, John Adams, (1º Vice-Presidente dos E.U.A e o seu 2º Presidente) escreveu:

«Quase estremeço quando penso em aludir ao mais fatal exemplo de causas de padecimento que a história da humanidade preservou – a Cruz. Veja-se as calamidades que essa máquina de padecimento causou».

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