segunda-feira, julho 07, 2008


OBAMÉRICA


Barack Obama transporta hoje, para muitos milhares de americanos, a mesma onda de sonho e de esperança com que nos anos sessenta, Martin Luter King, pretendeu sensibilizar os americanos e o mundo para as questões do racismo e que resultou no seu assassínio por aquele sector poderoso da sociedade americana que responde com violência e morte contra quem ameaça pôr em causa os seus interesses e os fundamentos das suas crenças e preconceitos.

Por motivos idênticos e pelos mesmos sectores da população americana, reaccionária, fundamentalista, criminosa, cultores do ódio e da intolerância e defensores dos seus interesses até às últimas consequências, foram mortos o Presidente dos E.U., John Kennedy e pouco tempo depois o seu irmão, Secretário de Estado da Justiça, Robert Kennedy.

À data, as pessoas da minha geração eram jovens de vinte e poucos anos e estas mortes, brutais e inesperadas, atingiram-nos naquilo que de mais puro tem a juventude: a ingenuidade e a esperança num mundo liderado por pessoas de bem que garantam um futuro melhor e mais justo do que o anterior.

A esperança é característica da juventude e um poderoso motor para o evoluir da sociedade e por isso, com excessos ou sem eles, aí temos os jovens em todas as manifestações por esse mundo fora defendendo causas relacionadas com a justiça, liberdade, independência, defesa do ambiente, dos animais selvagens, etc.

Mas a esperança e o sonho, sendo mais próprias da juventude, não são uma reserva exclusiva sua porque a capacidade para ter esperança e sonhar só desaparece com a nossa própria morte.

Como que adormecem e perdem força ao longo da vida mas mantêm o seu potencial quando alguma coisa ou alguém tem a força necessária para as mobilizarem.

Patrícia Fonseca é uma jornalista que escreve para a revista Visão e que na linha do Cáceres Monteiro se interessa por assuntos ou talvez melhor, por histórias, como ela diz: “por uma boa história largo tudo e vou até ao fim do mundo”.

Desta vez foi até Nova Yorque e relata-nos uma história que comprova que a esperança e o sonho estão longe de ser um exclusivo dos jovens.

E o que viu ela?

- Neste momento, milhares de americanos andam na rua, apaixonadamente envolvidos na campanha de Barack Obama num movimento civil comparado ao dos anos sessenta, quando Luther King pregava o seu sonho.

Berard Jones tem 59 anos, é afro-americano, nasceu e foi criado em Nova Yorque, veterano do Vietname e passava os dias afundado no sofá com a cerveja na mão e a dizer mal do que via no ecrã da televisão.

Sensibilizado por Andrew Yong (um histórico do activismo dos direitos civis) que se insurgia contra a campanha para denegrir Obama em que uns diziam que ele era muçulmano, outros que não era bem negro porque tinha mãe branca…etc, Jones, que nunca tinha dado um tostão para um político, foi ao “site” dele e doou 25 dólares e hoje anda na rua a tentar sacar mais velhotes do sofá.

Veste, orgulhoso, uma T-shirt dos “Veteranos por Obama” e passa as manhãs na rua distribuindo sorrisos a quem passa perguntando se já decidiram em quem vão votar.

“Até Novembro, farei o que puder para ajudar este homem a mudar o país. Ele fez tudo por mim: “fez-me voltar a acreditar”.

Diz Patrícia Fonseca que o Sr. Jones é apenas um dos milhares de cidadãos que depois de anos sem acção cívica ou política, estão agora activamente empenhados na eleição de Barack Obama para a Casa Branca.

Os movimentos civis estão a ser o principal motor da campanha do democrata que, na passada semana, anunciou que iria recusar 88 milhões de dólares de fundos federais, tal como já tinha rejeitado as contribuições dos grandes “lóbis” que, diz, “minam o sistema político americano”

Obama, torna-se assim, no primeiro candidato presidencial da história dos EUA a financiar a sua eleição apenas com donativos dos cidadãos que ascendem já a 300 milhões de dólares.

O segredo de tamanha mobilização parece residir apenas na mensagem de apelo à mudança na forma de fazer política que recupera os ideais básicos do sonho americano de que todos são iguais e todos podem vencer na vida.

Se pensarmos no autêntico “desastre” que tem sido a Administração Bush em que se fez uma guerra de consequências imprevisíveis com base em mentiras para satisfazer interesses económicos de sectores privados da sociedade americana, compreende-se bem a genuinidade da reacção anónima do povo americano a um homem que teve o condão de lhes devolver a esperança num momento de grande e fundada descrença e pessimismo. Como dizia Deshundra Jefferson, 32 anos: “…a situação é de tal forma má que não é mais possível ficar em casa à espera”.

Não me parece que esteja definitivamente excluída a hipótese de Hillary Clinton vir a ser a personalidade escolhida por Barack Obama para sua vice-presidente.

Durante a campanha em que disputou a candidatura pelo partido democrata Hillary demonstrou ser “um animal político” de grande qualidade e o seu discurso de reconhecimento da vitória do adversário constituiu uma peça notável de oratória política que de certo não passou despercebida a Barack Obama como, de resto, toda a sua intervenção ao longo da campanha.

O comício que ambos fizeram numa vila rural denominada Unity, três semanas após a Senadora ter reconhecido a derrota, correu bem.

Neste comício, os apoiantes de Hillary, que ganhou as primárias neste Estado, estavam em destaque e sempre que Obama falava no plural explicando, não as suas ideias, mas as ideias de ambos para o país as pessoas vibravam.

Não podemos esquecer que 18 milhões de americanos votaram em Hillary e que muitos deles não estão dispostos a trocarem de camisola.

Unity foi apenas a primeira experiência a testar a popularidade da dupla e mais de 500 jornalistas estiveram atentos às mensagens escondidas nos discursos, nos gestos e nos olhares de ambos e no fim do show saíram de cena ao som de Stevie Wonder, Signed, Sealed, Delivered, I’mYours.

Será que este “casamento” é para durar?

Obama, entretanto, vai dizendo:

“ As nossas causas são comuns. A América deve muito aos Clinton e continua a precisar deles”.

Não creio que sobre este assunto haja uma decisão já tomada em definitivo por parte de Obama e do seu “staf” porque a intervenção dos eleitores nestas eleições está a assumir uma tal importância que os seus sinais não deixarão de ser levados em linha de conta e ainda haverá muitos sinais por receber.

De qualquer maneira, perante as várias crises com que o mundo actualmente se debate, o aparecimento de um líder político de excepção num país suficientemente grande e poderoso para que a sua voz seja efectivamente ouvida e seguida constitui a necessidade mais urgente da humanidade.

António Vitorino, o nosso político mais esclarecido e competente que infelizmente se dedicou, ainda que em parte “time”, a comentador, afirma e reafirma com toda a insistência que é tudo uma questão de qualidade de liderança como neste momento se perceberá na actual reunião de um G 8 que deveria ser, pelo menos, um G 12 e na qual, mais uma vez, irá faltar a coragem suficiente para se ir ao cerne das questões tendo em vista a sua resolução. Como ele diz, enquanto “a bota não bater com a perdigota” nada feito.

Barack Obama pode ser, tem todas as características para que o seja, o grande líder político que o mundo espera, porque se o seu antecessor teve a força e a capacidade para desencadear uma guerra que destabilizou uma região e agravou todos os problemas do mundo, por que não aquele que se lhe vai seguir fazer exactamente o contrário?

Site Meter