terça-feira, outubro 14, 2008


A Guerra dos Sexos




Se existem conflitos entre pais e filhos quando ambos dispõem de 50% dos genes, muito mais natural será que esses conflitos aconteçam entre parceiros sexuais.

O que eles têm em comum é um investimento de 50% de acções genéticas dos mesmos filhos e deste ponto de vista estão interessados no bem-estar de metades diferentes dos mesmos filhos razão suficiente para cooperarem na sua criação.

Mas supondo que a um dos pais é permitido investir menos em cada filho do que o quinhão que lhe competia, isso representaria uma vantagem dado que ficaria com mais recursos para investir em mais filhos de outros parceiros sexuais e, assim, propagar mais os seus genes.

Teoricamente, aquilo que um “indivíduo” gostaria de fazer seria copular com o maior número de membros do sexo oposto deixando o parceiro, em cada caso, criar os filhos sozinho.

Em certas espécies há machos que o conseguem fazer mas noutras são obrigados a partilhar o fardo de criar os filhos.

Mas, afinal, qual é a essência da masculinidade? O que é que define uma fêmea?

Nos mamíferos vemos os sexos claramente definidos: a existência de um pénis, a gestação dos filhos, a amamentação, certas características cromossomáticas, etc., mas para muitos outros animais e plantas estas diferenças valem tanto como o uso das calças para distinguir os homens das mulheres.

Nas rãs, por exemplo, nenhum dos sexos tem um pénis.

Aquilo que em toda a natureza é comum na distinção entre o sexo masculino e feminino são os “gâmetas” (células sexuais que na reprodução se fundem no momento da fecundação) e que nos machos são muito mais pequenos e numerosos do que nas fêmeas.

Mesmo nos seres humanos, em que o óvulo é microscópico, ele é muito maior que o espermatozóide e como estes são muito pequenos um macho pode permitir-se produzir muitos milhões deles por dia.

Isto significa, que o macho é capaz de produzir uma grande quantidade de filhos num período muito curto de tempo utilizando fêmeas diferentes.

Ela fica “envolvida” com cada embrião concedendo-lhe a parte adequada de alimento e, portanto, a sua possibilidade de ter filhos fica muito limitada enquanto que o macho, potencialmente, poderá ter um número de filhos quase ilimitado e aqui começa a “exploração” das fêmeas.

No princípio, a reprodução seria isogâmica, quando os gâmetas eram morfologicamente iguais, mas a selecção natural foi, progressivamente, favorecendo os indivíduos que produziam gâmetas mais pequenos e rápidos capazes de procurarem activamente os maiores para se fundirem com eles e terem, potencialmente, mais filhos.

E, desta forma, em termos de evolução, abriram-se duas estratégias sexuais diferentes:

- A “estratégia honesta” que consistia num grande investimento em gâmetas cada vez maiores para corresponderem ao interesse dos mais pequenos e velozes, “a estratégia astuta”.

Os gâmetas cada vez maiores ter-se-iam tornado imóveis porque, de qualquer forma, seriam sempre procurados activamente pelos “astutos”, e os gâmetas de tamanho intermédio ficaram condenados.

- A “estratégia astuta” com a aposta em gâmetas cada vez mais pequenos e velozes venceu a batalha e os gâmetas maiores tornaram-se óvulos e os mais pequenos espermatozóides.

Como um macho, teoricamente, pode produzir espermatozóides suficientes para servir um harém de 100 fêmeas poderíamos supor que o número de fêmeas deveria exceder o dos machos nas populações animais na proporção de 100 para 1.

Isto significa reconhecer que para a espécie, o macho é mais “dispensável” e a fêmea mais “valiosa”.

Para dar um exemplo extremo, entre as populações de leões marinhos, 4% dos machos são responsáveis por 88% das cópulas observadas, o que significa, neste caso e em muitos outros, um excesso evidente de machos solitários que nunca terão oportunidade de copular durante toda a sua vida.

Em tudo o resto estes machos excedentes levam vidas normais e comem os recursos alimentares da população com o mesmo apetite que os outros.

Do ponto de vista do “bem da espécie” regista-se um desperdício terrível e estes machos celibatários bem poderiam ser considerados parasitas sociais.

A teoria de “selecção de grupo” tem dificuldade em explicar porque se chegou a esta situação mas a teoria do “gene egoísta” não tem qualquer dificuldade em explicar a existência de uma percentagem tão grande de machos que não se reproduzem, e essa explicação foi formulada, pela primeira vez, por Ronald Fisher, apontado por Richard Dawkins o maior dos sucessores de Darwin:

- O problema de quantos machos e fêmeas nascem é um caso particular de um problema de “estratégia parental”.

- Será melhor confiar os genes preciosos a filhos ou a filhas?

- Aquilo que Fisher mostrou é que, em circunstâncias normais, a proporção óptima entre os sexos é 50:50 e para vermos porquê é preciso começar primeiro pela mecânica da determinação dos sexos a qual, nos mamíferos, é da seguinte forma:

1º - Todos os óvulos são capazes de se desenvolverem em machos ou fêmeas;

2º- São os espermatozóides que transportam os cromossomas que irão determinar o sexo do indivíduo;

3º- Metade dos espermatozóides produzidos poderá originar mulheres – os espermatozóides X – e a outra metade – espermatozóides Y - .

4º X e Y apenas diferem um do outro em relação a um cromossoma.

Um indivíduo não pode, literalmente, escolher o sexo dos seus filhos mas é possível haver genes com tendência para ter filhos de um sexo ou de outro, e se os houver, terão eles probabilidade de se tornarem mais numerosos na pool de genes do que os seus alelos que favorecem uma proporção igual entre os sexos?

Suponhamos, que entre a tal população de leões marinhos, surge um gene “mutante” que tende para fazer com que os pais tenham principalmente filhas.

Como não há falta de machos na população, as filhas não teriam problemas para encontrarem parceiros sexuais e o gene, o tal que era “mutante”, tem condições para se expandir e, a partir daqui, estava aberto o caminho para que a proporção entre os sexos naquela população começasse a desviar-se na direcção de um maior número de fêmeas.

Do ponto de vista do bem da espécie, isso seria bom, pois, como já vimos, só 4% da população dos machos fornece a totalidade dos espermatozóides necessários e, assim, o gene produtor das filhas continuar-se-ia a espalhar até que a proporção entre os sexos estaria tão desequilibrada que os pouco machos restantes, esgotados completamente, não pudessem já dar conta do recado.


(continuaremos, no próximo texto, esta Guerra dos Sexos que nos é apresentada por Richar Dawkins)

Site Meter