segunda-feira, novembro 17, 2008


Os Mineiros de Aljustrel






Não bastava trabalhar a centenas de metros, mais de quatrocentos, bem lá no fundo, nas entranhas da terra, longe do ar puro e do azul do céu, vencendo o medo de um dia não subirem à luz do dia e também aquele natural sentimento de claustrofobia de quem nasceu para viver e trabalhar ao cimo da terra e não nas suas profundezas.

Não era já suficiente o que isso significa de violência sobre a natureza humana até àquele momento em que o hábito vence o medo, a rotina se instala e o receio de mergulhar naqueles poços sem fundo, já não significa mais do que apenas uma forma de ganhar o pão.

Não chegaria tudo isso para que, ainda por cima, lhes prometessem trabalho por dez anos que não chegou a durar seis meses!

O alentejano de Aljustrel há muitas gerações que aceitou trocar o horizonte a perder de vista das suas belas mas “injustas” planícies pelas profundezas do seu subsolo.

A Vila de Aljustrel é das mais antigas do país pois quando os Romanos ali chegaram já lá existia um povoado dos tempos pré-históricos que se dedicava à extracção a céu aberto de minério embora, em termos modernos, a exploração só tenha começado em 1845.

O montante das escórias resultantes da actividade dos romanos está calculado em 450.000 toneladas o que diz bem da importância destas minas que fazem parte de uma das maiores concentrações mundiais de jazigos de sulfuretos com ferro, cobre, prata, zinco e algum ouro.

Em períodos áureos estas minas chegaram a utilizar mais de 2.000 trabalhadores que neste tipo de actividade, forçosamente localizada, era constituída por gerações de pessoas, filhos e netos de mineiros que formaram uma classe profissional unida e organizada à volta dos seus interesses, a Associação da Classe dos Operários das Minas de Aljustrel, que foi um dos primeiros Sindicatos criados em Portugal.

Aljustrel é, portanto, de há milénios, terra de mineiros com tudo o que isso representa de risco para a sua sobrevivência, não só por motivos de saúde, as doenças profissionais próprias da actividade (silicose, pulmão negro, abestose, beriliose, asma ocupacional, etc. …), como também por falta de trabalho pois estas matérias primas são muito susceptíveis a variações de preços e de mercados sendo que, os períodos bons nunca permitem aos trabalhadores a constituição de reservas que lhes permitam sobreviver nos maus.

Os períodos bons asseguram trabalho e o viver do dia a dia, apenas isto, sem qualquer garantia para o dia de amanhã que reserva surpresas muito difíceis de prever.

Diferente, sempre foi a vida dos engenheiros, quadros superiores e administradores das minas que viviam em mansões junto à vila rodeadas de muros e jardins de uma forma completamente autónoma do resto da vila e resguardada na sua privacidade, mas também isto nunca constituiu novidade…

Imprevidência foi a do nosso Primeiro ministro, José Sócrates, ter prometido, no arranque simbólico da retoma da produção comercial da mina, em Maio deste ano, numa cerimónia com toda a pompa e circunstância, como se costuma dizer, ter afirmado que a partir daquele momento “se abria um período de dez anos de trabalho numa demonstração de confiança dos investidores na economia nacional”.

É natural os políticos confundirem desejos com certezas fazendo afirmações de risco, o que já não é natural é que a realidade o tenha desmentido apenas seis meses após essas afirmações.

As empresas que têm por móbil o lucro têm “aversão” a manterem a actividade quando os custos de exploração são superiores às receitas e foi isto que aconteceu.

De repente veio a crise e o preço do Zinco que estava a ser explorado e constituía as receitas da mina, baixou para mais de metade e manter a actividade, nestas condições, deixou de ser lucrativo.

Como é que José Sócrates e o seu ministro Manuel Pinho, que é da economia, não pensaram nisto… que se tivessem associado à festa... que tivessem manifestado alegria e satisfação pelo investimento e os postos de trabalho criados... que tivessem feito um discurso a congratularem-se pelo que estava a acontecer…tudo bem, até eu, só pelo simples facto de ser português, fiquei feliz mas para quê as promessas demagógicas?

Não era de prever, podem alegar, mas um político deve ser uma pessoa avisada, porque tudo o que diz tem um impacto especial nos cidadãos ou será que ele voltaria hoje a prometer os 150.000 postos de trabalho que tanto jeito tem dado à oposição…?

A credibilidade é, ou devia ser, para um político o seu mais valioso património não só pela sua pessoa e pela sua carreira mas pelo regime em que vivemos.

Que valor tem a democracia se aqueles que a servem não a respeitam?

Como se sentiria o cidadão José Sócrates se o seu Primeiro-ministro fosse à sua terra garantir-lhe, pela palavra, 10 anos de trabalho e ao fim de menos de 6 meses se visse desempregado, o que seria ele levado a pensar?

O Sr. Ministro da Economia, perante esta situação, afirma que a solução está para breve, visto haver já um grupo de investidores internacionais dispostos a darem sequência ao negócio.

Oxalá, não sejam apenas, mais uma vez, palavras de desejos e de boas vontades… é que quando não se tem mais do que a força do trabalho, a saúde e o emprego são o que de mais valioso as pessoas podem ter.



Entretanto, enquanto as coisas não se resolvem, ouçamos O Grupo Coral Alentejano “Os Cigarras de Aljustrel”e A Nova Aurora, em Aljustrel, com sinceros votos de um desfecho bem sucedido para as diligências em curso tendo em vista o recomeço da actividade das minas.

Site Meter