segunda-feira, outubro 26, 2009


TIETA DO
AGRESTE

EPISÓDIO Nº 268





AMOSTRA DAS CONSUMAÇÕES DE UM CANDIDATO A LÍDER E A MARIDO OU DO CARÁCTER SUJEITO A DURAS PROVAS



Jovem, saudável, potente, apaixonado. Apaixonado é pouco dizer: louco de amor e sabendo-se correspondido. Sem sombra de dúvida. Recebera prova indiscutível (e celestial) que outra não fora senão a maior de todas: a bem amada abrira as pernas para ele, entregara-se, sem nada pedir em troca. Sendo pobre e ela rica, jamais ousara falar em casamento, não fizera propostas nem promessas. Prova de infinito amor, o gesto de Leonora nos cômoros.

Galã principal da história aqui narrada, no gozo de invejável saúde, de potência sexual recentemente comprovada à tripa forra na capital do Estado, como explicar que esse jovem galhardo e varonil, ao ter à sua disposição, enleada e ardente, a mais desejada e inacessível das mulheres, a mulher da sua vida, não se aproveitasse, buscando inclusivé evitar (ou pelo menos adiar) a repetição da exaltante noite de amor? Onde já se viu contradição tão flagrante, absurdo igual? Quais as razões dessa demência? Será que realmente existe, nos cafundós de Judas, ou seja, em Agreste, bestalhão tamanho?

Desembarcando da lancha, no Domingo, Ascânio acompanhou Leonora até à porta da casa de Perpétua. Tomando-lhe as mãos, a ternura esparramada nos olhos e na voz, disse:

- Vou para casa, por hoje me despeço. Você precisa de descansar, quase não dormiu, está fatigada. Se me permite, amanhã, indo para a Prefeitura, passo para lhe dizer bom dia.

Permitirá quanto Ascânio peça e deseje – o ideal seria que a desejasse e possuísse naquela mesma noite, nos esconsos do rio. Não está assim tão cansada e, se estivesse, onde poderá repousar feliz, sem laivo de tristeza, senão nos braços dele? Cala, no entanto, novamente intimidada, à espera de que Ascânio tome a iniciativa, ouse e proponha. Aproveita, cabrita, faz tua reserva de saudade, o tempo é curto, recomendara Mãezinha. Envolta em preconceitos e escrúpulos, desperdiça-se a noite de Domingo.

Ele se aproxima para o beijo de despedida. Leonora atraca-se em seu pescoço, os seios túmidos. Os corpos se unem, as coxas se encontram, um calor cresce do beijo longo, desesperado, de lábios, línguas e dentes. Ascânio se desprende e foge rua afora, sob a fosca luz dos velhos postes.

Seus passos, em lugar de levá-lo a casa, conduzem-no à pensão de Zuleika Cinderela, onde, sorridente, Maria Imaculada o acolhe:

- Seu Ascânio…faz tempo que o espero…Que bom que veio. Tomando da menina, linda e trêfega, Ascânio não se tranquiliza, pois comprova que só o corpo de Leonora, nenhum outro, pode lhe dar aquela sensação de plenitude e torná-lo invencível, dono do mundo.

Para merecê-la outra vez, deve esperar. O gesto de Leonora, prova de infinito amor, fora igualmente prova de desmedida confiança. Pura e íntegra, nem mesmo a dolorosa experiência anterior a fizera duvidar dos sentimentos e do carácter do novo pretendente: colocara-se em suas mãos por considerá-las limpas, honradas. O desejo consome o moço apaixonado mas ele se controla, deve comportar-se à altura da confiança de Leonora.

Guarda no bolso um anel de compromisso. Assim dona Antonieta volte a Agreste, ele a procurará para conversa franca e decisiva: amo sua enteada e a quero para esposa. Sou pobre mas tornei-me ambicioso. Confie em mim, serei alguém. Noivo, o anel no dedo de Leonora, a data do casamento marcada, então, quem sabe… Antes, porém seria ignóbil abuso, comportamento vil.

Dona Antonieta negara-lhe o apoio na campanha pela instalação na Brastânio. Como reagirá ao pedido de casamento? Parece olhar o namoro com simpatia, talvez por julgá-lo inconsequente distracção de férias. Daí a casamento a distância é grande. Como agir se a omnipotente madrasta se opuser?

Ascânio não admite sequer o pensamento de não voltar a tê-la nos braços, rendido e vibrante, o corpo de Leonora. Agora que o tocara e conhecera, não pode viver mais sem possuí-lo. É necessário esperar, porém. Não é fácil ser um homem digno, custa esforço.

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