terça-feira, novembro 03, 2009


TIETA DO
AGRESTE


EPISÓDIO Nº 276


DEGUNDA PARTE DO CAPÍTULO DE EVENTOS MEMORÁVEIS DURANTE OS QUAIS ASCÂNIO TRINDADE PERDEU A ELOQUÊNCIA E A CARAMBOLA: O CASO DO BILHAR



O incidente do bilhar teve por cenário o Bar dos Açores, onde as partidas decisivas do torneio anual por fim se realizaram. Atrasados, pois o Taco de Ouro deveria ter sido proclamado em Dezembro. Em Agreste, ultimamente, anda tudo em descompasso e discórdia. A rotina e a harmonia cedem lugar ao imprevisto e à contenda. Alastram-se a desconfiança e a irritação, manifesta-se a cada passo evidente espírito belicoso.

A presença da nata social, senhoras e senhoritas, empresta carácter festivo à disputa. Desfile de toaletes caprichadas como se na mesma ocasião fossem escolhidos o Taco de Ouro e a Rainha da Elegância. As damas comparecem para torcer, respirar a excitante atmosfera do botequim, sobretudo para exibir os trajes, cada qual mais pretensioso. Nos anos anteriores, ostentando vestidos mandados por Tieta, modas do Sul, Elisa destacava-se das demais. Tampouco Astério tivera maiores dificuldades para derrotar os parceiros. O casal açambarcava os aplausos: ele tricampeão, ela, absoluta!

As coisas mudaram. Astério, às voltas com a criação de cabras e o plantio de mandioca, descuida-se dos treinos, enquanto Seixas e Fidélio passam horas e horas a carambolar. Quanto a Elisa, encontra rival à altura de sua beleza e elegância: a formosa paulista Leonora Cantarelli, em férias na cidade.

A primeira partida foi ganha por Fidélio, perdida por Seixas. Nos pontos e na torcida. As primas de Seixas haviam recrutado colegas e amigas para reforçar as fileiras das incentivadoras do primo. Fidélio, arredio, não recrutou ninguém, as fãs compareceram de moto próprio, numerosas. Constataram-se, inclusivé, deserções nas hostes de Seixas, em nítida prova de deterioração dos costumes locais. A febre da traição atingiu até uma das primas, a estrábica, a mais linda. Perdendo o controle, a falsa aplaudiu de pé jogada sensacional do adversário. Um vexame.

Dona Edna, cujos campeões, o fiel Terto (nem por manso e cornudo menos bom marido) e o volúvel Leléu, se encontram há muito desclassificados, não consegue esconder o despeito de não poder competir com Elisa e Leonora. Galante e ousada, não lhe faltam graça e porte, gosto no vestir; falta-lhe dinheiro ou irmã generosa. Para compensar, onde quer que esteja, os olhos de frete percorrendo os homens presentes, fala pelos cotovelos, alfinetando meio mundo. Língua louvada em mais de uma arte, exímia na arte de malhar a vida alheia, destila veneno, várias vezes o alfinete transforma-se em escalpelo. Se a repreendem, explica: por mais eu corte na pele dos outros, nunca conseguirei cobrar o que falam de mim. Durante o torneio, nem Peto escapa dos olhares doces e da agre malícia de dona Edna. Um Peto metido a rapaz, de calças compridas, sapatos postos, cabelos penteados.

- O que foi que deu em você, Peto? Virou homem…

Olhos dolentes, sedutores, a ponta da língua roçando os lábios para deixar o menino de pito aceso. Engraçadinho o moleque, pesteando a brilhantina. Mas quem bole com os nervos de dona Edna é o outro, o irmão, padrequinho no ponto exacto, papa missas divino. De Peto, dona Edna passa para Elisa, com quem implica solenemente: a presunçosa agora habita uma das melhores residências da cidade sem pagar aluguel, fazendo ainda mais insuportável o ar dolente e superior que exibe em permanência. Dona Edna veio disposta a aperreá-la e a amofinar, ao mesmo
tempo, a outra antipática, a hipócrita lambisgóia, Leonora. Qual das duas a mais
detestável?

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