TIETA DO
AGRESTE
EPISÓDIO Nº 292
DA VOLTA DA ANIMAÇÃO OU DE COMO O PAU COMEU
Com a fábrica vai voltar a animação, prometera Ascânio Trindade ao coronel Artur de Figueiredo. Decorridos poucos dias os acontecimentos deram-lhe razão; não se fez sequer necessário o estabelecimento da indústria para a feira de Agreste reaver movimento e entusiasmo dignos dos falados tempos de antanho. Alvoroço de tal magnitude a ponto do beato Possidónio, convencido de que chegara o dia do juízo final, abandonar a cuia de esmolas, entregando-se por inteiro à salvação dos pecadores, brandindo o cajado redentor.
No sábado, arribando de manhãzinha à Praça do Mercado os feirantes depararam com algumas novidades, entre as quais uma faixa, esticada entre duas varas fincadas no chão, propondo a candidatura do Comandante e uma tabuleta, convocando para o comício. Esta última, fazendo parelha, num poste bem no centro da Praça, com o placar do cinema que anuncia sensacional bang-bang no fim-de-semana: Porrada à Beça! Promete.
A princípio, faixa e tabuleta despertaram pouco interesse. A curiosidade dos matutos voltava-se para curiosidades maiores e mais vistosas; os novos postes de luz, da Hidrelétrica de São Francisco, gigantescos, belos, impressionantes. Dois deles já colocados de pé; os feirantes esticavam os pescoços buscando divisar as lâmpadas. Um terceiro, ainda estendido no chão, reuniu curiosos a admirá-lo, em exclamações de pasmo.
Alguns mais letrados soletraram as palavras da faixa, raros se interessaram pela tabuleta, a maioria não sabia ler. Assim a feira começou normalmente, vindo a ganhar influência somente quando Ricardo e Peto começaram a distribuir os volantes. Aí foi aquele deus-nos-acuda.
Gumercindo Saruê, pequeno produtor de farinha de mandioca, contemplara os postes boquiaberto; mal reparara na faixa, nem se dera conta da tabuleta. Um homenzarrão com fama de valente, dado a brigas. Chegou a ser preso num Domingo de cachaça. Armado de foice pusera a correr os dois filhos de siá Jesuina, viúva de cabelo na venta. A viúva não se acomodou enquanto não viu Saruê no xadrez – A cadeia de Agreste, quase permanentemente vazia, ocupa uma das salas dos fundos da Prefeitura, com grades na janela. Ascânio ao tomar conhecimento do acidente, abandonando o bilhar, acalmou a mãe irada, abriu a porta da prisão e mandou Gumercindo em paz. O gigante, agradecido, jurou:
- Conte comigo, seu doutor, para a vida ou para a morte.
Não eram palavras vãs como se verá agora mesmo, pois Ricardo e Peto haviam surgido na feira e começaram a distribuição dos prospectos redigidos pela indignada dona Carmosina em colaboração com o sardónico Aminthas.
Enquanto faixas e tabuletas limitavam-se a anunciar a candidatura do Comandante, com breve referência à poluição, o volante estendia-se sobre as razões da campanha, destinada a salvar Agreste, paraíso ameaçado de podridão.
Citava trechos da crónica de Giovanni Guimarães, baixava o pau na Brastânio, “empresa multinacional destinada a encher o bandulho de estrangeiros à custa da miséria do povo”. Descia igualmente ripa em Ascânio: “aproveitando-se do posto que ocupa, presta-se ao jogo sujo desses criminosos que querem transformar Agreste numa lata de lixo.” Impedir a eleição desse playbói matuto, agente a soldo dos empresários da morte” era obrigação de todos os cidadãos do município.
Ricardo cumpria dever ditado pelo mais puro idealismo; Peto trabalhava contra pagamento prometido por Osnar, um dos financiadores da candidatura do Comandante, mas os dois irmãos, o abnegado e o mercenário, cumpriam conscientemente a tarefa recebida, indo de pessoa em pessoa, feirantes e fregueses, distribuindo os volantes de mão em mão. Sabino, preso ao balcão da loja, não teve participação no início da folgança.
Com a fábrica vai voltar a animação, prometera Ascânio Trindade ao coronel Artur de Figueiredo. Decorridos poucos dias os acontecimentos deram-lhe razão; não se fez sequer necessário o estabelecimento da indústria para a feira de Agreste reaver movimento e entusiasmo dignos dos falados tempos de antanho. Alvoroço de tal magnitude a ponto do beato Possidónio, convencido de que chegara o dia do juízo final, abandonar a cuia de esmolas, entregando-se por inteiro à salvação dos pecadores, brandindo o cajado redentor.
No sábado, arribando de manhãzinha à Praça do Mercado os feirantes depararam com algumas novidades, entre as quais uma faixa, esticada entre duas varas fincadas no chão, propondo a candidatura do Comandante e uma tabuleta, convocando para o comício. Esta última, fazendo parelha, num poste bem no centro da Praça, com o placar do cinema que anuncia sensacional bang-bang no fim-de-semana: Porrada à Beça! Promete.
A princípio, faixa e tabuleta despertaram pouco interesse. A curiosidade dos matutos voltava-se para curiosidades maiores e mais vistosas; os novos postes de luz, da Hidrelétrica de São Francisco, gigantescos, belos, impressionantes. Dois deles já colocados de pé; os feirantes esticavam os pescoços buscando divisar as lâmpadas. Um terceiro, ainda estendido no chão, reuniu curiosos a admirá-lo, em exclamações de pasmo.
Alguns mais letrados soletraram as palavras da faixa, raros se interessaram pela tabuleta, a maioria não sabia ler. Assim a feira começou normalmente, vindo a ganhar influência somente quando Ricardo e Peto começaram a distribuir os volantes. Aí foi aquele deus-nos-acuda.
Gumercindo Saruê, pequeno produtor de farinha de mandioca, contemplara os postes boquiaberto; mal reparara na faixa, nem se dera conta da tabuleta. Um homenzarrão com fama de valente, dado a brigas. Chegou a ser preso num Domingo de cachaça. Armado de foice pusera a correr os dois filhos de siá Jesuina, viúva de cabelo na venta. A viúva não se acomodou enquanto não viu Saruê no xadrez – A cadeia de Agreste, quase permanentemente vazia, ocupa uma das salas dos fundos da Prefeitura, com grades na janela. Ascânio ao tomar conhecimento do acidente, abandonando o bilhar, acalmou a mãe irada, abriu a porta da prisão e mandou Gumercindo em paz. O gigante, agradecido, jurou:
- Conte comigo, seu doutor, para a vida ou para a morte.
Não eram palavras vãs como se verá agora mesmo, pois Ricardo e Peto haviam surgido na feira e começaram a distribuição dos prospectos redigidos pela indignada dona Carmosina em colaboração com o sardónico Aminthas.
Enquanto faixas e tabuletas limitavam-se a anunciar a candidatura do Comandante, com breve referência à poluição, o volante estendia-se sobre as razões da campanha, destinada a salvar Agreste, paraíso ameaçado de podridão.
Citava trechos da crónica de Giovanni Guimarães, baixava o pau na Brastânio, “empresa multinacional destinada a encher o bandulho de estrangeiros à custa da miséria do povo”. Descia igualmente ripa em Ascânio: “aproveitando-se do posto que ocupa, presta-se ao jogo sujo desses criminosos que querem transformar Agreste numa lata de lixo.” Impedir a eleição desse playbói matuto, agente a soldo dos empresários da morte” era obrigação de todos os cidadãos do município.
Ricardo cumpria dever ditado pelo mais puro idealismo; Peto trabalhava contra pagamento prometido por Osnar, um dos financiadores da candidatura do Comandante, mas os dois irmãos, o abnegado e o mercenário, cumpriam conscientemente a tarefa recebida, indo de pessoa em pessoa, feirantes e fregueses, distribuindo os volantes de mão em mão. Sabino, preso ao balcão da loja, não teve participação no início da folgança.
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