quarta-feira, fevereiro 10, 2010


DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
AMORES

EPISÓDIO Nº 41



- Desse mesmo, minha distinta. O mandachuva, o bamba, o bambambã, o deus-menino da polícia, esse mesmo, meu padrinho…

- Seu padrinho?

- De crisma. E avô de Vadinho…

- É o apelido dele, de menino. É o neto preferido do Senador.

- É estudante?

- Não já lhe disse que é doutor? Formado, minha senhora, advogado. Oficial de Gabinete do Governador, alto funcionário municipal, fiscal…

- Fiscal do consumo? – aquela informação excedia os sonhos mais temerários de dona Rozilda.

- Fiscal de jogo, minha ilustríssima – e em voz cochichada: - É a fiscalização que deixa mais, uma fortuna por mês, sem falar nos agrados, uma fichinha aqui, outra acolá… E agora, ainda por cima, encarrapitado no Gabinete do Governador…

Sentia-se generoso:

- A senhora não tem algum parente pobre que deseje empregar? Se tiver, é só dizer, dar o nome… – respirou fundo, contente consigo mesmo, prosseguiu indómito: - Está vendo ele ali dançando? Pois não se admire se na próxima eleição ele sair deputado…

- Tão novo ainda…

- O que é que a senhora quer? Nasceu em berço de ouro, encontrou o prato feito, seu caminho é de rosas, - Mirandão sentia-se um poeta nessa noite de glória, improvisaria um discurso monumental, arrancando lágrimas à própria dona Aurora, a fera do Rio Vermelho.

Dona Rozilda acertou os olhos miúdo, uma chama de ambição, amarela a brilhar em sua frente. Joãozinho Navarro arrematava o tango nuns floreios caprichados, Vadinho e Flor sorriam um para o outro. Dona Rozilda estremeceu de emoção: jamais vira assim a face da filha, e bem a conhecia. E o rapaz – perguntava-se – fora ele também atingido e para sempre marcado?

Havia na face de Vadinho um ar de inocência, uma candura, tal sinceridade; aquele o genro rico e importante que os céus lhe destinaram? Ainda mais rico e importante do que o paraense Pedro Borges, com suas léguas de terra e de rio, suas dúzias de empregados. Um genro neto de Senador, íntimo do governo: “ai, minha Nossa Senhora da Capistola, valei-me! Concedei-me, meu Senhor do Bom Fim, a graça desse milagre e acompanharei descalça a procissão da lavagem, levando flores e uma quartinha de água pura”.

O Major aproximava-se, dona Rozilda agradeceu a Mirandão, dirigiu-se ao dono da casa, apontou o grupo formado por Vadinho e Flor, dona Lita e Porto num canto da sala. Mirandão observou a manobra da velha lambisgóia, fez um esforço, pôs-se também de pé, foi por uma cerveja. Dona Rozilda pedia ao:

- Major, me apresente aquele moço…

- Não conhece? Pois é um parente do doutor Aírton Guimarães, o Delegado Auxiliar, meu amigo do peito… - sorria vaidoso, acrescentando: - Para os íntimos, Chimbo… Ele mesmo me disse: “Pergentino, trate-me de Chimbo, somos amigos ou não?” Homem sem besteira, direito… Me fez
um favorzão… - falava para todos, alardeando sua amizade com o Delegado.

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