segunda-feira, outubro 25, 2010

DONA FLOR
E SEUS DOIS
MARIDOS

Episódio Nº 252



- E por quê, então?

- Alguma vez eu te peguei a pulso? Uma só, me diga…

- Nunca…

- E então? Eu mesmo me proibi nunca precisei pegar mulher a pulso, e uma vez que Mirandão quis agarrar uma negrinha à bruta, no areal do Unhão, eu não deixei… O degas, aqui, meu bem só quer aquilo que lhe dão e quando é dado de boa vontade, de coração. A pulso, que gosto pode ter senão ruim?

Fitou-a longamente, voltando a sorrir:

- Tu vai-me dar, Florzinha linda, e eu estou doido que chegue a hora de comer a peladinha… Mas é tu quem vai me dar, quem vai abrir as pernas, pois eu só te quero quando tu também quiser. Não te quero com gosto de ódio, meu bem.

Ela sabia que era a pura verdade: o orgulho se elevava no peito do (primeiro) marido como uma auréola, um resplendor. Não de santo, propriamente, mas de homem, de homem macho e retado.

Então dona Flor acomodou-se na borda do leito, com Vadinho estendido junto a si, a espiá-la. Com os nervos relaxados, a la vonté, desarmada contra ele. Mal sentara, no entanto, e já o trapaceiro lhe descia a mão pela cintura até à ânfora do ventre. Levantou-se indignada:

- Tu não presta mesmo… Cheguei a pensar que tu falava de coração, que tu era homem de palavra… E logo tu desmente, tu vai metendo a mão…

- E por acaso estou te pegando a muque, te tomando à força? Só porque pousei a mão em teu umbigo? Senta aqui e ouve, meu bem: não vou te comer a pulso, mas isso não quer dizer que não faça tudo, tudo, que não use todos os recursos para que você me dê de sua própria vontade. Toda a vez que puder te tocar, vou te tocar, quando puder te dar um beijo, vou dar. Não te engano, minha Flor, vou fazer tudo, tudo, e depressa, pois estou doido por te comer todinha, cheguei morto de fome.

Era um desafio: sua honra de mulher honesta contra o fascínio de Vadinho e sua lábia, sua pabulagem, sua picardia.

- Não te engano, Flor, vou te passar o conto e quando esse teu doutor menos pensar está com sua coroa de chifres na cabeça. Aliás, meu bem, com aquela cabeçorra e alto como é, ele vai ficar um bocado bonito, vai ser um pé de corno da melhor espécie.

Um desafio? Pois muito bem, senhor meu primeiro marido e garanhão de fama, don-juan dos castelos e da zona, finório sedutor de moças e casadas, o degas, o porreta: por mais astuto não me vais comer outra vez a peladinha. Com toda a tua astúcia, com toda tua lábia, com toda tua prosápia inteira, meu porreta, não me deixarei vencer nem iludir: sou mulher honesta, não vou sujar meu nome nem o de meu marido. Aceito o desafio. E assim tendo pensado e decidido, voltou a sentar-se no colchão:

- Não fale isso, Vadinho, é feio… Respeite meu marido… deixe essas conversas, vamos falar de coisas sérias. Se eu te chamei, como tu dizes, foi para conversar contigo, às vezes me apertava uma saudade, o desejo de te ver, de falar com você. Não foi com ideia de descaração. Por que
você
faz um juízo tão ruim a meu respeito?

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