DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS
E SEUS
DOIS
MARIDOS
Episódio Nº 285
Mirandão e alguns convidados mais sensíveis, como a já citada Amesina – Ame de Américo seu pai, Sina de Rosina, sua mãe – haviam percebido no ambiente a presença de uma força irreprimível, a dirigir a festa.
Como explicar, senão assim, o número da gorda Carla na dança dos sete-véus, espectáculo sublime e monstruoso?
Também Máximo Sales, se bem céptico e realista, livre-pensador, teve a impressão de estar sendo observado, quando, naquela tarde, na sala de jogo (com a ajuda apenas de Domingos Propalato, irmão de leite de Pelancchi) executava, com perícia e consciência, com a perfeição de um artista, a difícil tarefa de empenar a roleta. Por vezes foi tão forte a estranha sensação, que teve de suspender o trabalho e percorrer a sala com os olhos, em busca da invisível testemunha.
Por volta da meia-noite, quando o jogo atingia a maior animação, no fundo do seu sono de pedra, pesado de cansaço e álcool, Mirandão ouviu a mesma voz da véspera. A começo imprecisa, logo clara e igual à de Vadinho, a voz lhe ordenava retornar à mesa da roleta, com urgência: para o Palace, depressa, vá jogar no dezassete. No dezassete e só no dezassete. Vamos!
Abrindo os olhos, Mirandão viu-se sozinho com as sombras da noite e aquela voz. Encolhido entre os lençóis, morto de medo, tapou os ouvidos com o travesseiro, não queria ouvir. Em plena festa, na véspera Anacreon lhe perguntara: “Tu ouviu também a voz de Vadinho cochichando em teu ouvido? Amigo como ele não tem dois. Mesmo depois de morto não esquece a gente”.
Mirandão não queria ouvir mas ouvia, distintamente ouvia: estava possuído, enfeitiçado, com um egun montado em seu cangaço. Precisava de ir quanto antes ao candomblé da mãe Senhora para rezar o corpo e oferecer um galo aos orixás, talvez um bode.
Por sobre o travesseiro, a voz prosseguia, quase intimativa, quase ameaçadora. Mirandão não viu outra saída, mais digna, menos humilhante, senão abrir a boca no mundo, clamando por socorro, pondo o castelo em polvorosa.
Pedindo desculpas ao meritíssimo desembargador, cliente ilustre e tardo, entregue à sua competência, a boa Carla foi atender o apavorado hóspede.
Quando o pegou nos braços e o escondeu nos seios, Mirandão lhe jurou, pela alma de sua mãe e a felicidade dos seus filhos, jamais voltar ao jogo, jamais em sua vida. Não haveria força humana (ou sobre-humana) capaz de fazê-lo tocar outra vez em fichas.
Quando o telefone chamou, Giovanni Guimarães dormia há mais de duas horas. Com o casamento habituara-se a deitar e a acordar cedo, hábitos, na opinião da esposa, extremamente saudáveis. Para uma boa saúde e carreira de sucesso nada tão útil e necessário, sobretudo a quem perdera antes tantas noites a levar vida extravagante e censurável.
Eis aí um homem – o conhecido jornalista Giovanni Guimarães – cuja vida se transformara por completo e em pouco tempo. De um dia para o outro, como se diz. Prova das excelências de matrimónio com mulher dedicada e enérgica, pouco disposta a concordar com abusos e descaramentos.
Como explicar, senão assim, o número da gorda Carla na dança dos sete-véus, espectáculo sublime e monstruoso?
Também Máximo Sales, se bem céptico e realista, livre-pensador, teve a impressão de estar sendo observado, quando, naquela tarde, na sala de jogo (com a ajuda apenas de Domingos Propalato, irmão de leite de Pelancchi) executava, com perícia e consciência, com a perfeição de um artista, a difícil tarefa de empenar a roleta. Por vezes foi tão forte a estranha sensação, que teve de suspender o trabalho e percorrer a sala com os olhos, em busca da invisível testemunha.
Por volta da meia-noite, quando o jogo atingia a maior animação, no fundo do seu sono de pedra, pesado de cansaço e álcool, Mirandão ouviu a mesma voz da véspera. A começo imprecisa, logo clara e igual à de Vadinho, a voz lhe ordenava retornar à mesa da roleta, com urgência: para o Palace, depressa, vá jogar no dezassete. No dezassete e só no dezassete. Vamos!
Abrindo os olhos, Mirandão viu-se sozinho com as sombras da noite e aquela voz. Encolhido entre os lençóis, morto de medo, tapou os ouvidos com o travesseiro, não queria ouvir. Em plena festa, na véspera Anacreon lhe perguntara: “Tu ouviu também a voz de Vadinho cochichando em teu ouvido? Amigo como ele não tem dois. Mesmo depois de morto não esquece a gente”.
Mirandão não queria ouvir mas ouvia, distintamente ouvia: estava possuído, enfeitiçado, com um egun montado em seu cangaço. Precisava de ir quanto antes ao candomblé da mãe Senhora para rezar o corpo e oferecer um galo aos orixás, talvez um bode.
Por sobre o travesseiro, a voz prosseguia, quase intimativa, quase ameaçadora. Mirandão não viu outra saída, mais digna, menos humilhante, senão abrir a boca no mundo, clamando por socorro, pondo o castelo em polvorosa.
Pedindo desculpas ao meritíssimo desembargador, cliente ilustre e tardo, entregue à sua competência, a boa Carla foi atender o apavorado hóspede.
Quando o pegou nos braços e o escondeu nos seios, Mirandão lhe jurou, pela alma de sua mãe e a felicidade dos seus filhos, jamais voltar ao jogo, jamais em sua vida. Não haveria força humana (ou sobre-humana) capaz de fazê-lo tocar outra vez em fichas.
Quando o telefone chamou, Giovanni Guimarães dormia há mais de duas horas. Com o casamento habituara-se a deitar e a acordar cedo, hábitos, na opinião da esposa, extremamente saudáveis. Para uma boa saúde e carreira de sucesso nada tão útil e necessário, sobretudo a quem perdera antes tantas noites a levar vida extravagante e censurável.
Eis aí um homem – o conhecido jornalista Giovanni Guimarães – cuja vida se transformara por completo e em pouco tempo. De um dia para o outro, como se diz. Prova das excelências de matrimónio com mulher dedicada e enérgica, pouco disposta a concordar com abusos e descaramentos.
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home