sexta-feira, fevereiro 04, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA

Episódio Nº 22


É bem verdade que ela lhe dizia Janu, tratamento de bem-querer, e em troca ele lhe chamava nomes diversos: Teta, minha santa, muçurumim, iaô, aí terminando quase toda a intimidade. Tereza mantém-se à espera, como compete à mulher de brio: dele deve partir a primeira palavra carregada de subentendido, o primeiro agrado. Parece feliz ao lado de Tereza, alegre, risonho, conversador, mas daí não passa, desses limites platónicos; como se alguma coisa lhe proibisse voz mais cálida, palavra de amor, gesto de carinho, contivesse o desejo evidente de mestre Januário Gereba.

Por último faltara à promessa, não fora ao encontro, deixando-a à espera desde as sete da tarde. Depois aparecera Lulu Santos, convidando-a para o cinema, preferiram ficar conversando, o rábula a contar de Libório das Neves histórias de esbulhos e tristezas, sujeito mais nojento o tal Libório; despedira-se depois das nove, satisfeito da vida por descoberto, com a ajuda de Tereza, milagrosa formula para derrotar o patife na audiência próxima. Tereza deu boa noite à velha Adriana, tentou conciliar o sono, não houve jeito. Tomando da manta negra com rosas vermelhas, último presente do doutor, cobriu a cabeça e os ombros, andou para o porto.

Nem rastro de mestre Gereba, do gigante Janu. Voltar para casa é tudo quanto lhe resta fazer: tratar de esquecer, cobrir de cinza a brasa acesa, apagando-lhe as labaredas enquanto é tempo. Insensato coração! Exactamente quando ela se encontra em paz consigo mesma, tranquila e alheia, disposta a colocar a vida nos eixos, apta para fazê-lo, pois nada a perturba, o indócil coração dispara apaixonado. Gostar é fácil, acontece quando menos se espera, um olhar, uma palavra, um gesto, e o fogo lavra queimando peito e boca; difícil é esquecer, a saudade consome o vivente; amor não é espinho que se arranca, tumor que se rasga, é dor rebelde e pertinaz matando por dentro. Lá vai Tereza, envolta na manta espanhola, no rumo de casa. Difícil as lágrimas, em vez de chorar fica de olhos secos, ardidos.

Alguém marcha em sua direcção, com pressa, Tereza imagina homem à cata de mulher-dama para conduzi-la ao Vaticano pela porta do Rato Alfredo.

- Eh! Dona, espere por mim, quero lhe falar. Por favor, espere.

Primeiro Tereza pensa em apressar o passo, mas o andar gingado e uma nota de aflição na voz do homem fazem-na parar. Devido ao rosto preocupado e àquele aroma perturbador, idêntico ao que sentiu no peito de Januário – odor de maresia, mas Tereza nada sabe do mar além do pouco ouvido nesses dias da boca alegre de Janu – à mesma pele curtida de vento, antes dele falar ela o identifica e sente um aperto no peito: ai, alguma coisa de ruim sucedera.

- Boa noite, siá dona. Eu sou mestre Gunzá, amigo de Januário, ele veio a Aracaju na minha barcaça com o fim de me acudir numa precisão.

- Ele está doente? Marcou comigo e não apareceu, eu vim saber dele.

- Está preso.

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