TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 37
Forjou os documentos junto aos autos, base da demanda, atribuindo à pobre senhora dívida no valor não da quantia relativamente modesta que ela pretendera de empréstimo, mas de importância dez vezes superior, de olho no sítio transformado pela força de trabalho do casal França em chácara e pomar invejáveis. Mas, na meticulosa armação do plano criminoso, algo escapara ao falsário, detalhe importantíssimo. Logo após o casamento, ou seja, há mais de quinze anos, Manuel França, envergonhado com o facto de sua legítima mulher ser analfabeta, contratara para lhe ensinar a ler e a escrever, a professora dona Carmelita Mendonça, nome a dispensar objectivos, mestra de gerações de sergipanos eminentes, ilustres figuras da vida pública, entre as quais o meritíssimo juiz. Em meses de árduo trabalho, aplicando seus conhecimentos na matéria, dona Carmelita Mendonça, competentíssima, glória da pedagogia sergipana, recuperara a boa dona Joana das trevas do analfabetismo, iluminando-a com a leitura e a escrita. Fazem disso exactamente quinze anos e quatro meses, senhor juiz.
Hábil demónio esse Lulu Santos, reflecte o juiz, ouvindo o arrazoado; obtivera que dona Carmelita ensinasse a Joana das Folhas a rabiscar as letras do nome e ali viesse proclamá-la alfabetizada há quinze anos – golpe monumental!
Mas apenas a glória da pedagogia sergipana, a mãe espiritual de tantos nós (na frase emocionada do rábula), simpática octogenária, penetrou na sala, o magistrado percebeu que ela jamais em toda a longa vida pusera os olhos na negra robusta e silenciosa sentada ao lado de Lulu Santos – só o juiz e Libório das Neves se deram conta da quase imperceptível vacilação da anciã. Quem ensinara leitura e escrita à demandada?
Sim, a Joana França, a quem, há quinze anos passados, ensinara as primeiras letras e os rudimentos de caligrafia, alfabetizando-a, era a mesma ali presente, apenas agora mais idosa e usando luto. Quem iria discutir afirmação da professora Carmelita Mendonça? Um demónio, esse Lulu Santos.
Também António Salema, ou Minhoto, por ter nascido na Póvoa do Lanhoso, em Portugal, recitou na perfeição a aula ensaiada pelo rábula – para conversar e treinar o lusitano, Lulu se transportara a Laranjeiras, acompanhado por Joana.
Confirmou o relato do provisionado: adiantara os oito contos à comadre, conforme ela lhe pedira, e, respondendo à pergunta do bacharel Silo Melo, se a demandada era analfabeta ou até quando o fora, disse ter conhecido a comadre sempre certeira nas contas, ai de quem a quisesse enganar!
O golpe de misericórdia foi dado pelo não comparecimento da terceira testemunha invocada por Lulu Santos: Joel Reis, conhecido por Joel Mão de Gato nas rodas mais baixas da malandragem e nas cadeias do Estado, descuidista emérito, mestre em tão difícil arte. Intimado pelo juiz, tendo recebido e assinado a notificação, desertara de Aracaju para não vir explicar à justiça porque assinara o documento de falsa dívida como se o fizesse a rogo da senhora Joana França, sem nunca por ela ter sido rogado, pois jamais a vira pessoalmente, mas o tendo feito a mando de Libório das Neves, seu protector e patrão.
Quem retirou Mão de Gato da cadeia de Aracaju, usando para isso de relações e influências em certos meios policiais, aqueles onde criminalidade e polícia se confundem, senão o demandante?
Para quem executa Joel Reis sórdidos serviços, cobrança de alugueis de quartos a prostitutas, preparação minuciosa de baralhos marcados? Ora senhor juiz, para quem havia de ser? Para o honrado, o ilibado, o impoluto Libório das Neves, que gatuno, meretíssimo!(clique sobre a fotografia)
Forjou os documentos junto aos autos, base da demanda, atribuindo à pobre senhora dívida no valor não da quantia relativamente modesta que ela pretendera de empréstimo, mas de importância dez vezes superior, de olho no sítio transformado pela força de trabalho do casal França em chácara e pomar invejáveis. Mas, na meticulosa armação do plano criminoso, algo escapara ao falsário, detalhe importantíssimo. Logo após o casamento, ou seja, há mais de quinze anos, Manuel França, envergonhado com o facto de sua legítima mulher ser analfabeta, contratara para lhe ensinar a ler e a escrever, a professora dona Carmelita Mendonça, nome a dispensar objectivos, mestra de gerações de sergipanos eminentes, ilustres figuras da vida pública, entre as quais o meritíssimo juiz. Em meses de árduo trabalho, aplicando seus conhecimentos na matéria, dona Carmelita Mendonça, competentíssima, glória da pedagogia sergipana, recuperara a boa dona Joana das trevas do analfabetismo, iluminando-a com a leitura e a escrita. Fazem disso exactamente quinze anos e quatro meses, senhor juiz.
Hábil demónio esse Lulu Santos, reflecte o juiz, ouvindo o arrazoado; obtivera que dona Carmelita ensinasse a Joana das Folhas a rabiscar as letras do nome e ali viesse proclamá-la alfabetizada há quinze anos – golpe monumental!
Mas apenas a glória da pedagogia sergipana, a mãe espiritual de tantos nós (na frase emocionada do rábula), simpática octogenária, penetrou na sala, o magistrado percebeu que ela jamais em toda a longa vida pusera os olhos na negra robusta e silenciosa sentada ao lado de Lulu Santos – só o juiz e Libório das Neves se deram conta da quase imperceptível vacilação da anciã. Quem ensinara leitura e escrita à demandada?
Sim, a Joana França, a quem, há quinze anos passados, ensinara as primeiras letras e os rudimentos de caligrafia, alfabetizando-a, era a mesma ali presente, apenas agora mais idosa e usando luto. Quem iria discutir afirmação da professora Carmelita Mendonça? Um demónio, esse Lulu Santos.
Também António Salema, ou Minhoto, por ter nascido na Póvoa do Lanhoso, em Portugal, recitou na perfeição a aula ensaiada pelo rábula – para conversar e treinar o lusitano, Lulu se transportara a Laranjeiras, acompanhado por Joana.
Confirmou o relato do provisionado: adiantara os oito contos à comadre, conforme ela lhe pedira, e, respondendo à pergunta do bacharel Silo Melo, se a demandada era analfabeta ou até quando o fora, disse ter conhecido a comadre sempre certeira nas contas, ai de quem a quisesse enganar!
O golpe de misericórdia foi dado pelo não comparecimento da terceira testemunha invocada por Lulu Santos: Joel Reis, conhecido por Joel Mão de Gato nas rodas mais baixas da malandragem e nas cadeias do Estado, descuidista emérito, mestre em tão difícil arte. Intimado pelo juiz, tendo recebido e assinado a notificação, desertara de Aracaju para não vir explicar à justiça porque assinara o documento de falsa dívida como se o fizesse a rogo da senhora Joana França, sem nunca por ela ter sido rogado, pois jamais a vira pessoalmente, mas o tendo feito a mando de Libório das Neves, seu protector e patrão.
Quem retirou Mão de Gato da cadeia de Aracaju, usando para isso de relações e influências em certos meios policiais, aqueles onde criminalidade e polícia se confundem, senão o demandante?
Para quem executa Joel Reis sórdidos serviços, cobrança de alugueis de quartos a prostitutas, preparação minuciosa de baralhos marcados? Ora senhor juiz, para quem havia de ser? Para o honrado, o ilibado, o impoluto Libório das Neves, que gatuno, meretíssimo!(clique sobre a fotografia)
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