sábado, março 05, 2011

TEREZA

BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA


Episódio Nº 47


Agora projectos e sonhos desfaziam-se nas mãos do capitão por obra e graça de Filipa, mulher tão mais ruim a ponto de vender a sobrinha órfã, a filha da sua irmã, sem ninguém no mundo. Porque Rosalvo não pusera o plano em execução porque ficara à espera que o sangue brotasse em Tereza, tingindo sua pequena rosa de ouro, moça feita e pronta, por que não agira antes, não avançara de vez o tempo de viver e de morrer, que mal ia nisso? Agora quem vai fazê-lo é o capitão, Filipa vendeu a menina, menina, sobrinha e órfã, pecado mortal.

- Quem ia impedir, me diga? – volta-se Justiniano para Rosalvo – Alguém ia se atrever, Rosalvo? Você, por acaso?

A voz de Rosalvo chega do chão, da poeira da terra, das cavernas do medo.:

- Ninguém não senhor. Eu? Deus me livre e guarde.

Filipa, negócio tratado, na crucial do pagamento, faz-se amável, cautelosa mas firme:

- Me diga vosmicê também, seu capitão, onde ia encontrar moça mais dotada sabendo fazer de um tudo dentro e fora de casa, sabendo ler e contar, para vender na feira está sozinha, e bonita igual a ela me diga, onde? Tem alguma na cidade que lhe chegue aos pés? Para encontrar uma que se compare só indo na capital, lá pode ser. E quem vai se regalar? Não é o senhor, capitão?

Lento passar das cédulas, contanto que ele não se arrependa, não volte atrás, mantenha a palavra:

- Eu lhe digo, seu capitão, que já veio uma pessoa aqui, pessoa direita, não qualquer um, propor casamento à Tereza, acredite.

- Casamento? E quem foi, se mal lhe pergunto?

- Seu Joventino, não sei se vosmicê conhece, um moço que tem roça de milho e mandioca distante daqui umas três léguas para o lado do rio. Homem trabalhador.

Rosalvo se lembra: nos dias de feira, aos sábados, Joventino após vender seu carrego de milho, de aipim e inhame, os sacos de farinha, vinha puxar conversa, contar histórias, comentar acontecidos, não saía de junto deles. Filipa se assanhara, imaginando-se objecto de tanta insistência, mas Rosalvo se dera conta das intenções do dito cujo, atrás da menina, isso sim.

A vontade era correr com ele, mas não tinha pretexto para fazê-lo, Joventino, muito discreto, não ia além dos olhares, de uma palavra ou outra, e ao demais convidava Rosalvo para um trago, oferecia cerveja à Filipa, guaraná à Tereza. Filipa rebolava a bunda como nos bons tempos.

Um domingo, Joventino aparecera no sítio, todo engravatado, com aquela conversa de casamento. Foi até engraçado, coisa de rir. Filipa virou fera. Lavara meia hora no quarto, se abonecando, o moço na sala com Rosalvo e a garrafa de cachaça, e quando ela se mostrou, toda arrumada e cheirosa, em vez de apaixonado em visita de namoro, encontrou pretendente à mão da sobrinha. Botou o rapaz para fora, aquilo era coisa que se propusesse? Onde se viu pedir em casamento menina de doze anos? Nem moça é ainda. Absurdo. Tia mais indignada e furiosa.

- Vou esperar e volto – anunciou Joventino indo embora.

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