TEREZA
BATISTA
CANSADA
DE
GUERRA
Episódio Nº 82
Se era… Nem é bom falar, mas que fazer? A educação dos filhos exige sacrifícios, capitão. Agora, veja o amigo: na posição de juiz de direito, não lhe fica bem frequentar casa de mulheres, ruas suspeitas, enfim… o capitão compreende a situação delicada. Pensa estabelecer criatura direita e que lhe fale aos sentidos. Ao saber Maria Romão livre, o capitão desinteressado…
- Não lhe aconselho, doutor. Muita estampa, muita figura, podre por dentro.
- Podre por dentro?
- Lepra, doutor.
- Lepra? Meu Deus! Tem certeza?
- Conheço pela sombra, mas a dela já começou a dar flor.
No correr dos dias, o meritíssimo juiz muito aprendeu sobre os costumes locais e sobre o capitão. Fizeram-se amigos, trocaram favores, unidos por interesses diversos, na voz do povo sócios em bandalheiras, a quadrilha do capitão, do juiz, do delegado e do prefeito. Vangloria-se de conhecer como ninguém os sentimentos de Justiniano Duarte da Rosa. Na roda dos intelectuais, nos debates eruditos e frascários – também nas tardes mansas ao calor do seio de Belinha – o doutor Eustáquio discorre sobre a vida sentimental e sexual do respeitado prócer.
Amor digno dessa palavra sublime, capaz de levar homem adulto e de princípios estabelecidos a cometer desatinos, amor realmente, Justiniano só uma vez o sentira e dele padecera; o objecto desse puro sentimento fora Dóris. Que desatinos cometera o capitão, provas de cegueira e de demência, provas de um sublime amor?
Pois. Meus caros colegas, minha doce amiga, o de casar-se com criatura tão sem graça, pobre e tísica, loucura das loucuras. Amor sublime ou sórdido, como preferiram, verdadeiro, porém. O capitão jamais professara amor antes de Dóris, jamais voltara a senti-lo depois – todo o resto não passava de xodós, rabichos, simples assuntos de cama, de maior ou menos duração, quase sempre menor.
Tereza não teve conta aberta na loja de Enock, nem a viram de braço com o capitão, na hora de sessão de cinema; em troca foi a única a atravessar mais de dois anos no favor de Justiniano Duarte da Rosa, deitada na cama de casal.
Dois anos e três meses completos – e quanto tempo ainda senão acontecesse o que aconteceu? O senhor Juiz, profundo psicólogo e vate contumaz (dedicara à Belinha todo um ciclo de lúbricos sonetos camonianos), recusou-se não só a colocar Tereza ao lado de Dóris na escala de sentimentos de Justiniano Duarte da Rosa como também a designá-la, como fazia o povo, por amásia ou amiga do capitão.
Amiga? Quem? Tereza Batista? Certamente o facto do meritíssimo encontrar-se de certa maneira envolvido nos acontecimentos finais dificultaram-lhe a imparcialidade, apoucaram-lhe a musa, não lhe permitindo enxergar amor e ódio, medo e destemor. Viu apenas vítimas e culpado. Vítimas, todos os personagens da história, a começar pelo capitão; culpado apenas um, Tereza Batista, tão jovem e tão perversa, coração de pedra e vício.
Houve quem pensasse exactamente o contrário, algumas pessoas sem maior classificação, não eram juristas, nem literatos como o doutor Eustáquio Fialho Gomes Neto, para as musas Fialho Neto, não sabiam de leis nem de métrica.
No fim, como se verá, nada ficou apurado devido à indébita e decisiva intervenção do doutor Emiliano Guedes, o irmão mais velho dos Guedes.
(clik na imagem e aumente)
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