quinta-feira, junho 16, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA


Episódio Nº 128


Nem Daniel nem ninguém percebeu quando, pouco antes das badaladas do sino, às nove da noite, no salão ás escuras, Berta, a mais feia das quatro, trouxe Magda, a irmã mais velha, para a fresta da Janela e juntas postaram-se na tocaia:

- Lá vem ele, veja – disse Berta, e ela sabia de líquida certeza porque apenas o pressentia lhe entrava um frio por baixo, urgência de fazer pipi.

Escondidas atrás da janela, acompanharam o vulto rua a fora, viram-no dobrar a esquina, escutaram os passos abafados e distantes no beco.

- Chegou no portão, deve estar entrando.

Magda era carne de pescoço; convicta da responsabilidade de primogénita, velou até de madrugada e o reconheceu belo e contente na barra da manhã voltando da noite de Tereza. O infame usara as quatro irmãs como para-vento; sólida, ideal cobertura a esconder de Justiniano Duarte da Rosa e da cidade aquele imundo bacanal com a moleca do armazém, rapariga do fátuo capitão: “Nenhuma se atrevera jamais a me enganar”.

Naturalmente o canalha comprara por qualquer dez reis de cachaça a cumplicidade de Chico Meia Sola – só um primata como Justiniano pode confiar bens e mulher a um bandido a soldo – e para garantir completa imunidade, abusara da boa-fé, da amizade, dos sentimentos, da mesa farta (ainda mais farta para recebê-lo das quatro irmãs, Magda, Amália, Berta, Teodora, as quatro na boca do mundo, na tesoura das comadres, e a moleca na cama, de grande.

No colégio Magda ganhara prémios de caligrafia, mas para certo tipo de correspondência prefere usar letra de imprensa, seguindo o atinado conselho de dona Ponciana de Azevedo. No rumoroso incidente, obteve apenas uma alegria de solteirona – poder escrever aquelas palavras malditas, de uso proibido às moças e senhoras distintas: corno, cabrão, chifrudo, gigolô de merda, a puta da moleca, ah, a puta da moleca!

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Tereza era após a escalada do céu. Fumando um cigarro, Daniel pensa na melhor maneira de lhe anunciar a iminente partida para a Bahia, para a Faculdade e os cabarés, os colegas de curso, os companheiros de boémia, as velhas senhoras, as românticas raparigas: “Depois mandarei lhe buscar, querida, não se apoquente, não chore, sobretudo não chore e não se lastime, assim chegue lá tomarei providências”.

Difícil quarto de hora a vencer, uma chatice. Daniel tem horror a cenas, rompimentos, despedidas, lamentos e choro.

Irá estragar a última noite, a não ser que lhe diga no derradeiro momento, de madrugada, no portão do quintal, após o beijo de lábios, línguas e dentes.

Mais aconselhável, talvez, deixar para o dia seguinte: aparecerá pela manhã no armazém para se despedir de todos juntos – chamado urgente, inapelável, da faculdade, se não atender perde o ano, tem de tomar o primeiro trem, mas a ausência será de pouca demora, uma semana no máximo.

Mas se Tereza, percebendo-se traída, inconformada, puser a boca no mundo e armar escândalo na presença de Chico Meia Sola e dos caixeiros? Qual a reacção do capanga fiel ao tomar conhecimento dos chifres postos no patrão e protector, praticamente na sua vista? Criminoso de morte, o próprio Chico contara a Daniel dever a comutação da pena a esforços e manobras do capitão. (clik na imagem e aumente)

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