sábado, agosto 13, 2011

TEREZA



BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA






Episódio nº 178





Na lembrança da cachaça, tocou apenas os lábios na bebida límpida, cor de ouro. Constatou, surpresa, o saboroso paladar, provou de novo.

- Vinho do Porto, disse o doutor – uma das maiores invenções do homem, a maior dos portugueses. Tome sem medo, bebida boa não faz mal. Não é a hora mais própria para um licoroso, mas no caso importa menos a hora do que o gosto da bebida.

Tereza não entendeu a frase toda, mas de repente sentiu-se tranquila como nunca se sentira antes, em paz. O doutor lhe falou do vinho do Porto e como se devia bebê-lo ao fim da refeição, após o café ou pela tarde, não antes de comer, porém.

Porque então lho dera na hora errada? Por ser o rei de todas as bebidas. Se ele lhe desse de começo um bitter ou um gim, ela possivelmente estranharia o paladar; começando pelo vinho do Porto, o perigo da recusa não existia.

Continuou Emiliano a lhe falar de vinhos, dos diversos licorosos, com o tempo ela havia de distingui-los uns dos outros, moscatel, jerez, madeira, Málaga, tokai, sua vida apenas estava começando. Esqueça tudo quanto se passou, borre da memória, aqui inicia vida nova.

Afastou a cadeira para Tereza se sentar á mesa e não se sabendo ela se servir, ele serviu, começando por preparar o prato para a incrédula rapariga: onde já se viu um absurdo desses?

Beberam refresco de mangaba e o doutor repetiu o cerimonial, passando-lhe o primeiro copo. Encabulada, Tereza apenas beliscava a comida enquanto ouvia falar de estranhos costumes culinários, cada qual mais cabeloso, mãe de Deus!

Aos poucos o doutor foi deixando Tereza à vontade, fazendo-a soltar exclamações de espanto ao descrever certas iguarias estrangeiras, barbatanas de peixe, ovos de cem anos, gafanhotos, Tereza já ouvira falar que se comia rã e o doutor confirmou: carne excelente. Uma vez ela comera teiú, morto e moqueado por Chico Meia-Sola, gostara.

Toda a caça é saborosa, disse Emiliano, tem gosto agreste e raro. Quer saber, Tereza, dos bichos da terra o mais gostoso?

- Qual?

- O escargô, ou seja, o caracol.

- Ai que nojo…

Riu o doutor a soar a alegre nos ouvidos de Tereza.

- Pois um dia, Tereza, eu vou preparar um prato de escargôs e você vai lamber os beiços. Sabe que sou cozinheiro de mão-cheia?

Assim começara ela a se descontrair e na sobremesa já ria sem rebuços ao ouvi-lo descrever como os franceses deixam os escargôs durante uma semana presos num caixote forrado com farinha de trigo, único alimento, mudando a farinha a cada dia até ficarem completamente limpos.

- E gafanhotos? Comem mesmo? Onde?

Na Ásia, preparados com mel. Em Cantão adoram cachorros e cobras. Aliás não se come no sertão jibóia e tanajura? A mesma coisa. Quando se levantaram da mesa e o doutor tomou a mão de Tereza, ela sorriu já diferente, nas primícias da ternura. (clik na imagem e aumente)

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