quinta-feira, setembro 01, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA






(Episódio Nº 194)



O doutor dá-se conta da medida infinita da tristeza, da desolação.:

- Eu sei o que você está sentindo, Tereza, infelizmente não pode ser de outra maneira, não quero e não terei filho na rua. Não darei meu nome. Você se pergunta com certeza se não tenho vontade de um filho meu e seu. Não, Tereza, não. Só quero a você, a você sozinha, sem mais ninguém. Não gosto de mentir nem para consolar tristezas.

Fez uma pausa como se muito lhe custasse o que ia dizer:

- Ouça, Tereza, e decida você mesma. Eu lhe quero tanto bem que me disponho a lhe deixar ter a criança, se você faz questão e a sustentá-la enquanto eu viver – mas não o reconheço como filho, não lhe dou o meu nome e com isso acaba a nossa vida em comum. Quero a você, Tereza, sozinha, sem filhos, sem ninguém. Mas não lhe quero contrafeita, triste, ferida, ia ser ruim o que até agora tem sido tão bom. Decida, Tereza, entre mim e o menino. Nada lhe faltará, garanto, só não terá a mim.

Tereza não vacilou. Pondo os braços em torno do pescoço do doutor, deu-lhe os lábios a beijar: a ele devia mais do que a vida, devia o gosto de viver.

- Para mim o senhor passa antes de tudo.

O doutor Amarílio veio à noite e conversou a sós com Emiliano, na sala. Depois foram ao encontro de Tereza no jardim e o médico marcou a intervenção para a manhã seguinte, ali mesmo em casa. E as reservas morais, tão ponderáveis, o ponto de vista categórico, doutor Amarílio, que fim levaram? Levaram sumiço, Tereza, um médico de roça não pode ter ponto de vista, opinião firmada, não passa de curandeiro às ordens dos donos da vida e da morte.

- Durma tranquila, Tereza, é simples curetagem, coisa à toa.

À toa e triste, doutor. Hoje ventre fecundo, amanhã pasto da morte. Doutor Amarílio entende cada vez menos as mulheres. Não fora Tereza Batista ao consultório propor o aborto, se o médico não o fizesse ela iria em busca de uma curiosa qualquer, dessas muitas fornecedoras de anjo à corte celeste, porque então o olhar aflito, a face dolorida? Porquê? Por ter sido ele a última esperança de Tereza na luta pelo filho; todas as reservas do médico, o ponto de vista categórico, ninguém pode dispor de uma vida, decidir sobre a morte alheia, abalassem os princípios do doutor Emiliano.

Tão desatinada, Tereza parecia esquecida da intransigência do usineiro, imutáveis normas de comportamento. Filho na rua, não, escolha entre o menino e eu. Adeus filho que não conhecerei, desejado menino, adeus.

Coisa à toa decorreu sem incidentes e Tereza só guardou o leito por conselho médico e exigência de Emiliano. Ele não a deixou sozinha um único instante, a lhe oferecer chá, café, refrescos, frutas, chocolate, bombons, a ler para ela, a lhe ensinar truques de baralho, conseguindo fazê-la sorrir ao longo daquela jornada melancólica.

Apesar dos repetidos e urgentes apelos de Aracaju e da Bahia, dos negócios importantes, o doutor demorou junto da amásia uma semana inteira. Dias de ternura, de mimo e dengue, de dedicação tamanha, a ponto de Tereza sentir-se limpa de qualquer desgosto, paga pelo sacrifício, contente de viver, sem nela ter ficado marca exposta.

Assim era o doutor, o rebenque e a rosa.
(clik na imagem)

Site Meter