segunda-feira, dezembro 26, 2011

TEREZA

BATISTA

CANDADA

DE

GUERRA


Episódio Nº 291


De há muito procura dona Paulina imagem de bom tamanho do santo protector para entronizá-la no oratório, onde já se encontram Nosso Senhor dos Navegantes e Nossa Senhora da Conceição. Sabedora do comércio de imagens e velharias do pai de Kalil, pediu ao rapaz para reservar-lhe uma de Santo Onofre, grande, pouco estragada, e que lhe saísse em conta. Nas lojas do ramo não se encontra nenhuma, velha ou nova.

Em geral, no negócio do velho Chamas, os santos valem fortunas, apesar do mau estado de conservação, de lhes faltarem braços, cabeças, pernas – peças para museus e colecções. Por vezes, no entanto, em meio a uma batelada de imagens descobertas no interior, vêm algumas recentes, sem cabimento em casa de antiguidades. Logo delas se desfazem, vendendo-as por qualquer dinheiro. Se alguma assim aparecer, de Santo Onofre, dona Paulina pode contar com ela e nada lhe custará, oferta de quem abusa da sua hospitalidade. Aparecera na antevéspera, grande, quase nova, de gesso, mas Kalil esquecera-se de levá-la.

Deixa Anália na esquina, vai em busca do santo, volta com ele embrulhado numa folha de jornal. Seguem a pé subindo a Ajuda.

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Soube-se, depois, que algumas donas-de-pensão, tanto no Maciel, quanto no Pelourinho, por um lado amedrontadas com a violência policial, por outro a calcular o prejuízo resultante do facto das raparigas não exercerem em noite de marinheiros americanos pagando em dólares, pensaram em romper o acordo e recomendar às inquilinas a abertura dos balaios.

Dessa ameaça de traição Vavá teve imediato conhecimento no lugar onde se encontrava (esconderijo até hoje desconhecido da polícia e da quase totalidade da população da zona). Enviou recado urgente às frouxas. Ai daquela que romper o compromisso e desobedecer às ordens de Exu! Não durará na zona nem na cidade da Bahia, terá de mudar-se incontinente, se antes não morrer de morte feia. Aqui na mesma hora ou em outro mangue no prazo de um mês, a sentença de morte quem ditou foi Tiriri, ai daquela! Explicada fica a união mantida até ao fim, a unanimidade dos balaios fechados.

Unanimidade ainda assim rompida. Ou não?

De repente, no meio da balbúrdia, uma quenga magra e alta apareceu de bolsa em punho, cabeleira loura, saltos altíssimos, vestida de organdi azul. A fazer o trotuar, a rodar a bolsa, clássica marafona em busca de freguês. Vibraram os tiras, apressados os tiras em garantir-lhe o exercício da profissão. Finalmente aparecia uma mulher-dama disposta a cooperar no Retorno Alegre ao Trabalho.

Ao aproximarem-se, porém, constataram – cruel decepção! – tratar-se de Greta Garbo, garçom de bordel de Vavá, em crise de consciência desde a véspera. Devia também fechar o balaio ou a ordem não o (a) atingia? Vacilou longo tempo, prevalecendo afinal o desejo de aproveitar a oportunidade rara: a cidade cheia de marinheiros, vazia de mulheres, ah!

Tomaram-no preso, meteram-no num carro celular, e as raparigas ali metidas bateram no chibungo, vítima da ambição desmedida porém louvável de satisfazer sozinho à marinha de guerra norte-americana.

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Obedientes às instruções do comissário Labão Oliveira, sócio maior da empresa turística montada para acolher os marinheiros, por volta das vinte horas todo o meretrício é invadido por dezenas de camelos e capitães da areia, cada qual sobraçando um balaio repleto de camisas-de-vénus e vidros de “Cacete Rijo – one dose five fucks”.

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