terça-feira, janeiro 03, 2012

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA
Episódio Nº 298



“Explicar, não explico, só lhe contei porque me rogou, com insistência e um chofer de táxi tem obrigação de tratar bem a freguesia conversando e comentando para fazer a corrida mais maneira. Quem no mundo pensa tudo explicar, trocando em miúdo cada facto, prendendo a vida nas cancelas das teorias, é apenas, me desculpe o amigo, um falso materialista, um sábio de meia-tijela, um caga-regras, historiador de voo curto, um tolo.

Para terminar some mais um despropósito aos muitos que ouviu, sucedeu comigo, Edgar Rogaciano Ferreira conhecido em toda a praça da Bahia por sério e inimigo de patranhas. Já lhe disse como vi naquela noite o pedestal da estátua do poeta Castro Alves, na praça do mesmo nome, onde faço ponto.

Pois, ao acordar novamente, bem mais tarde, à passagem dos carros da polícia conduzindo o mulherio preso no fim da briga, tendo levantado os olhos para o monumento, o que vejo? A estátua do poeta em seu lugar de sempre, o braço estendido para o mar e na mão um cartaz rasgado com figuras de mulheres e palavras sem sentido, todo o poder às putas, já pensou? E agora saia dessa se puder, o caro amigo. Boa noite eu lhe desejo, tome cuidado com Exu.”

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O dia seguinte foi de festa na zona. Às doze horas as mulheres da Barroquinha romperam a aleluia, abriram os balaios. As raparigas presas na véspera começaram a ser soltas a partir da madrugada, também os boémios com elas solidários no bar e na cadeia.

Pela manhã, o velho Hipólito Sardinha, chefe da grande firma imobiliária, incorporadora do monumental conjunto turístico Parque Baía de Todos os Santos, foi visto entre as ruínas dos sobradões da Ladeira do Bacalhau, devorados pelo fogo.

Trouxera consigo o principal advogado da empresa, um mestre do direito, um papa-questões. O fogo evitara o gasto da demolição mas impedira a renda dos alugueis durante dois anos às prostitutas: boas inquilinas, pagam caro e não atrasa. Ainda assim talvez não haja prejuízo a lamentar e se venha a obter algum lucro. O ilustre causídico e o velho patrão encontram-se de acordo na caracterização indiscutível da responsabilidade civil do Estado no incêndio em virtude da incúria na preservação da ordem pública.

Fazendo os casarões parte da zona do meretrício, palco de arruaça e sediação contínuas durante a tarde e a noite do balaio fechado, foram incendiados em consequência, cabendo ao estado pagar os prejuízos aos proprietários, vítimas da incapacidade das autoridades responsáveis.

Assim, nada se perdeu com o incêndio dos sobrados, além da pouca valia do Cincinato Gato Preto de pescoço aberto à navalha, carbonizado em fogueira de maconha. Prejuízo mesmo, só o da erva desperdiçada.

Presa continuou apenas Tereza Batista. Mesmo se decidissem soltá-la com as demais teria sido impossível. Após a visita de Peixe Cação, não se encontrava ela em estado de sair à rua.

Apesar de estar fora de forma, devido á persistente dor nos ovos, o paternal polícia não se reduziu a comandar os espancadores. Participou também, pessoalmente.

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Desesperado, Almério das Neves mexeu com deus e o mundo, para soltar Tereza. Andou de ceca em meca nos dias seguintes à agitada noite do bafatá, da batalha do Pelourinho.
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