sábado, abril 14, 2012

GABRIELA

CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 74



Da Lei para as Raparigas

Naquele dia, de bar excitado e quase festivo, muitas histórias foram recordadas, além da melancólica aventura do Dr. Felismino. Histórias em geral terríveis de amor e traição, vinganças de arrepiar. E, como não podia deixar de acontecer, com a proximidade de Glória na janela, ansiosa e solitária, sua empregada andando entre os grupos na praia, vindo ao bar à cata de informações, alguém recordou o caso famoso de Juca Viana e Chiquinha.

Não se tratava, é claro, de acontecimento semelhante ao daquela tarde, os coronéis reservavam a pena de morte para traição de esposa. Rapariga não merecia tanto. Assim pensava também o coronel Coriolano Ribeiro.

Quando tomavam conhecimento de infidelidade de mulheres que sustentavam – ou pagando-lhes o quarto, a comida e o luxo em pensões de prostitutas ou alugando-lhes casa em ruas menos frequentadas – contentavam-se com largá-las, substitui-las no conforto que lhes proporcionavam. Arranjavam outra. Já sucedera, no entanto, tiro e morte, mais de uma vez, devido a rapariga.

Não tinham, por exemplo, o coronel Ananias e o comerciário Ivo, conhecido por “El Tigre” por sua maestria de centro-avante do Vera Cruz Futebol Clube, trocando tiros no Pinga de Ouro, por causa de Joana, pernambucana bexigosa, ainda recentemente?

Fora o coronel Coriolano Ribeiro dos primeiros a atirar-se às matas e a plantar cacau. Poucas fazendas podiam comparar-se com a sua, terras magníficas, onde em três anos os cacaueiros começavam a produzir. Homem de influência, compadre do coronel Ramiro Bastos, dominava ele um dos mais ricos distritos de Ilhéus.

De hábitos simples, conservava os costumes dos velhos tempos, sóbrio em suas necessidades: seu único luxo era a rapariga de casa montada. Vivia quase sempre na fazenda, aparecendo em Ilhéus a cavalo, desprezando o conforto do trem e das recentes marinetes, vestido com calça porta-de-loja, paletó batido pelas chuvas, chapéu de respeitável idade, botas sujas de lama.

Gostava mesmo era da roça, das plantações de cacau, de dar ordens aos trabalhadores meter-se pela mata. As más-línguas diziam que ele na fazenda só comia arroz aos domingos ou em dias feriados, tão económico era, contentando-se com o feijão e o pedaço de carne seca, refeição dos trabalhadores.

No entanto sua família vivia na Bahia, no maior conforto, em casa grande na Barra, o filho na Escola de Direito, a filha nos bailes da Associação Atlética. A esposa envelhecera precocemente, nos tempos das lutas, nas noites ansiosas, quando o coronel partia à frente dos jagunços.

Um anjo de bondade, um demónio de feitura… – dizia dela João Fulgêncio quando alguém criticava o abandono em que o coronel deixava a esposa, indo à Bahia só de raro em raro.

Mesmo quando sua família residia em Ilhéus – na casa onde agora instalara Glória – nunca deixava o coronel de ter rapariga de mesa e cama. Por vezes, ao chegar à fazenda, era para a “filial” que se dirigia, ali descia do cavalo, antes mesmo de ir ver a família.

Eram seu luxo, sua alegria na vida, essas cabrochas, mulatinhas no verdor dos anos, que o tratavam fosse ele um rei.


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