CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 112
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Meu Deus, os tabuleiros…
Arrumaram às pressas, os doces sobre o
dos salgados, tudo na cabeça de Tuísca, que saíu assobiando a melodia. Os pés
de Gabriela ainda traçaram uns passos, dançar era bom.
Um ruído de fervura veio da cozinha: ela
precipitou-se.
Quando sentiu Chico Moleza entrar na
casa ao lado, já estava pronta, tomou da marmita, enfiou os chinelos dirigiu-se
para a porta. Ia levar a comida de Nacib, ajudar enquanto o empregado não
estava. Voltou, porém, colheu uma rosa no canteiro do qui ntal,
enfiou o talo atrás da orelha, sentia as pétalas aveludadas a tocar-lhe de leve
a face.
Fora o sapateiro Felipe – boca suja de
anarqui sta a praguejar contra os
padres, tão educado quanto um nobre espanhol ao falar com uma dama – quem lhe
ensinara aquela moda. «A mais famosa das modas», dissera-lhe.
Todas as muchachas em Madrid usam uma
flor roxa nos cabelos…
Tantos anos em Ihéus, batendo sola e
ainda misturava palavras castelhanas ao seu português. Antes aparecia no bar
apenas de raro em
raro. Trabalhava muito, remendando selas, arreios, fabricando
chicotes de montaria, botando sola em sapatos e botas, no tempo livre lia
folhetos de capa encarnada, discutia na Papelaria Modelo.
Quase só aos Domingos vinha ao bar para
jogar gamão e damas, adversário temido. Actualmente era todos os dias, antes do
almoço, na hora do aperitivo.
Quando Gabriela chegava, o espanhol
suspendia a cabeça de rebeldes cabelos brancos, ria com os dentes perfeitos de
jovem.
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Salve la gracia, olé.
E fazia com os dedos um ruído de
castanholas.
Outros também, fregueses anteriormente
acidentais, haviam-se tornado quotidianos, O Vesúvio conhecia uma singular
prosperidade. A fama dos salgados e doces de Gabriela circulara, desde os
primeiros dias, entre os viciados do aperitivo, trazendo gente dos bares do
porto alarmando Plínio Araçá, o dono do Pinga de Ouro, Nhô-Galo, Tonico Bastos,
o Capitão, cada um por sua vez, haviam partilhado o almoço de Nacib, saíam
dizendo maravilhas da comida.
Seus acarajés, as fritadas envoltas em
folha de bananeira, os bolinhos de carne, picantes, eram cantados em prosa e
verso – em verso porque o Professor Josué a eles dedicara uma quadra, onde
rimara «frigideira» com «abrideira», «cozinheira» com «faceira».
Mundinho Falcão já a solicitara por
empréstimo, um dia, quando ofereceu um jantar em sua residência por ocasião da
acidental passagem por Ilhéus, num Ita, de um amigo seu, senador por Alagoas.
Vinham para o aperitivo, o pocker de
dados, acarajés apimentados, bolinhos, salgados de bacalhau a abrir o apetite.
O número crescendo, uns trazendo outros, devido às notícias sobre a alta
qualidade do tempero de Gabriela.
Mas muitos deles demoravam-se agora um
pouco mais além da hora habitual, atrasando o almoço. Desde que Gabriela
passara a vir ao bar com a marmita de Nacib.
Click na imagem. O autor, o grande Jorge Amado, o tal que nasceu com uma estrela, como dizia a mãe, e Sónia Braga, a "nossa" Gabriela)
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