CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 110
CANTIGA PARA MALVINA
Dorme, menina dormida
Teu lindo sonho a sonhar.
No teu leito adormecida
Partirás a navegar.
Estou presa em meu jardim
Com flores acorrentada.
Acudam! Vão me afogar
Acudam! Vão me matar
Acudam! Vão me casar
numa casa me enterrar
na cozinha a cozinhar
na arrumação a arrumar
no piano a dedilhar
na missa a me confessar.
Acudam! Vão me casar
Na cama me engravidar.
No teu leito adormecida
Partirás a navegar.
Meu marido, meu senhor
Na minha vida a mandar,
A mandar na minha roupa
No meu perfume a mandar.
A mandar no meu desejo
No meu dormir a mandar.
A mandar nesse meu corpo
Nessa minha alma a mandar
Direito meu a chorar.
Direito dele a matar.
No teu leito adormecida
partirás a navegar.
Acudam! Me levem embora
Quero marido para amar
Não quero para respeitar
Quem seja ele – que importa?
Moço pobre ou moço rico
Bonito, feio, mulato
Me levem embora.
No teu leito adormecida
Partirás a navegar.
A navegar partirei
acompanhada ou sòzinha.
Abençoada ou maldita
a navegar partirei.
Partirei para me casar
a navegar partirei.
Partirei para me entregar
a navegar partirei.
Partirei pra trabalhar
a navegar partirei
Partirei pra me encontrar
para jamais
partirei.
Dorme menina dormida
teu lindo sonho a sonhar.
Gabriela com Flor
As flores desabrochavam nas praças de
Ihéus, canteiros de rosas, crisântemos, dálias, margarinas, malmequeres. As
pétalas «onze horas» abriam-se por entre a relva, pontuais como o relógio da
Intendência, salpicando de vermelho o verde da grama.
Para as bandas do Malhado, em meio ao
mato, nos bosques húmidos do Unhão e da Conqui sta,
explodiam fantásticas orquídeas. Mas o perfume a elevar-se da cidade, a
dominá-la, não vinha dos jardins, dos bosques, das tratadas flores, das
orquídeas silvestres.
Chegava dos armazéns de ensacamento, do
cais e das casas exportadoras, era o perfume das amêndoas de cacau seco, tão
forte que entontecia os forasteiros, tão habitual que ninguém mais o sentia.
Espalhando-se sobre a cidade, o rio e o mar.
(Click na imagem de Malvina - «Presa em seu jardim com flores acorrentada»)
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