segunda-feira, maio 21, 2012


GABRIELA
 CRAVO
 E
 CANELA

Episódio Nº 103


Coriolano continuava, sem alterar a voz, brincando com o rebenque:

 - Vosmicê é moço bonito e lorde, tem muita mulher, é o que não lhe falta. Eu tou gasto e velho, minha mulher verdadeira já marchou, coitada dela!, só tenho mesmo a Glória. Gosto dessa moça e quero ela só para mim. Esse negócio de pagar mulher prós outros nunca foi de minha devoção.

Sorriu para Tonico Bastos:

 - Sou seu amigo e por isso tou-lhe avisando: deixe de andar por aquelas bandas.

O tabelião estava pálido, o silêncio era tumular no cartório. Os presentes entreolhavam-se, Manuel das Onças que fora lavrar uma escritura, afirmava depois ter sentido no ar «cheiro de defunto», e ele possuía bom olfacto para esse odor, responsável por uns quantos cadáveres nos tempos dos barulhos.

Tonico começou a explicar-se: eram calúnias, miseráveis calúnias de seus inimigos e dos inimigos de Coriolano. Ele apenas aparecera em casa de Glória para oferecer os seus préstimos à protegida do coronel, diariamente desfeiteada por todos.

Essa mesma gente que criticava Coriolano por tê-la hospedado na Praça de São Sebastião, numa casa onde residira sua família, gente que virava a cara à moça, que cuspia à sua passagem, era essa mesma gente que agora fazia intriga.

Ele só tinha querido demonstrar publicamente sua estima e solidariedade ao coronel. Nada tivera com a rapariga, nem mesmo intenção. Língua de mel, esse Tonico.

 - Que vosmicê não teve nada eu sei. Se tivesse tido eu não estava aqui para conversar, a conversa era outra. Mas se teve intenção, eu aí já não boto minha mão no fogo. Mas intenção não tira pedaço nem põe chifre em ninguém… O melhor é vosmicê fazer como os outros: virar a cara para ela. É assim mesmo que eu gosto. E agora, que vosmicê já está avisado, não vamos falar mais nisso.

Imediatamente começou a falar de negócios, como se nada houvesse dito, entrou pela casa adentro, foi dar bom dia a D. Olga, beliscar as faces das crianças.

Tonico Bastos deixou até de passar na calçada de glória; desde então ela viveu mais melancólica e solitária. A cidade glosava o assunto: «A cama caiu antes dele se deitar», diziam, e «caiu fazendo barulho», acrescentavam, uma gente sem dó nem piedade essa de Ilhéus.

O aviso do coronel Coriolano servia não apenas para Tonico: muita gente resolveu ficar nas intenções que, pelas noites mornas, transformavam-se em sonhos, agitados, alimentados da contemplação do busto de Glória e do sorriso descendo dos olhos para a boca, «molhado de desejo», como versejava muito bem o próprio Josué.

E quem ganhava com isso, segundo João Fulgêncio encerrando a narração, eram as esposas, as velhas e feias, pois, como ele dissera ao Juiz, Glória era de utilidade pública, necessidade social, elevando a nível superior a vida sexual de Ilhéus, tão feudal ainda, apesar do propalado e inegável progresso…

Fechado o Parêntesis, Chega-se ao Banquete

Apesar da curiosidade e do receio de Nacib, o jantar da Empresa de Ónibus transcorreu em perfeita paz e harmonia.

Antes das sete horas, quando os últimos fregueses dos aperitivos se retiravam, já o russo Jacob, esfregando as mãos, rindo com todos os dentes, rondava em derredor de Nacib.

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