quinta-feira, junho 14, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 124



Pois, apenas haviam-se encostado ao balcão, servindo-se Tonico do amargo, e já Nacib para ir varrer suas melancolias, lhe foi dizendo:

 - Então o homem chegou finalmente… Mundinho levou um tento, essa é a verdade.

Tonico, sorumbático botou-lhe uns olhos maus:

 - Porque você não cuida da sua vida, seu turco? Quem avisa amigo é. Em vez de ficar falando tolices, porque não fica tomando conta do que é seu?

Queria Tonico apenas evitar o assunto do engenheiro, ou sabia de alguma coisa?

 - Que quer você dizer com isso?

 - Cuide do seu tesouro. Tem gente querendo roubar.

 - Tesouro?

 - Gabriela, bestalhão. Até casa querem botar para ela.

 - O Juiz?

 - Ele também? Ouvi falar de Manuel das Onças. Não seria intriga de Tonico? O velho coronel estava muito do lado de Mundinho… Mas, também era verdade, agora aparecia em Ilhéus constantemente, não arredava do bar.

Nacib estremeceu; viria do mar aquele vento gelado? Apanhou no escondido do balcão uma garrafa de conhaque sem mistura, serviu-se um trago respeitável. Quis puxar mais por Tonico, porém o tabelião arrenegava de Ilhéus:

 - Merda de terra atrasada que se alvoroça toda com a presença de um engenheiro. Como se fosse coisa do outro mundo.

De conversas e acontecimentos com auto-de-fé.

Com o decorrer da tarde cresceram nostalgias no peito de Nacib, como se Gabriela já não estivesse, inevitável fosse sua partida. Decidiu comprar-lhe uma lembrança, necessitada estava de um par de sapatos. Andava descalça o tempo todo em casa, vinha de chinelas ao bar, não ficava bem.

Uma vez Nacib já reclamara: “Arranje uns sapatos”, brincando na cama, coçando seus pés. Os tempos na roça, a caminhada do serão para o Sul, o hábito de andar de pés no chão, não os haviam deformado, ela calçava número 36, eram apenas um pouco esparramados, o dedo grande engraçado, para um lado. Cada detalhe recordado enchia-o de ternura e de saudade, como se a houvesse perdido.

Vinha com o embrulho rua abaixo, uns sapatos amarelos, pareciam-lhe lindos, avistou a Papelaria Modelo em efervescência. Não pôde resistir, estava mesmo precisando de distracções, para lá se dirigiu.

As poucas cadeiras em frente ao balcão todas ocupadas, havia gente em pé. Nacib sentiu dentro de si renascer, ainda indecisa chama, a curiosidade. Comentariam sobre o engenheiro, fariam previsões acerca da luta política. Apressou o passo, viu o Dr. Ezequiel Prado agitando os braços. Escutou, ao chegar suas últimas palavras.


 …falta de respeito à sociedade e ao povo…


(click na imagem de Nacib que parece estar a "despertar" para uma nova realidade na sua vida: não mais pode passar sem Gabriela na sua vida)

Site Meter