terça-feira, junho 19, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 128


 - Vosmicê tem muito merecimento… Tem outros que chega aqui, só visam ganhar dinheiro, não pensam em mais nada. Vosmicê pensa em tudo, nas necessidades da terra. Pena vosmicê não ser casado.

 - Porquê, coronel? – Tomava da garrafa, quase uma obra de arte, ia servir novamente.

 - Vosmicê me desculpe… Coisa fina essa bebida. Mas, para ser franco com vosmicê, prefiro uma cachacinha… Esse trago é enganador: cheiroso, açucarado, parece até bebida para mulher. E é forte como o cão, embebeda sem a gente se dar conta. Cachaça, não, a gente sabe logo, não engana ninguém.

Mundinho tirou do armário uma garrafa de cachaça.

 - Como prefira, coronel. Mas porque eu devia ser casado?

 - Pois, se vosmicê me consente, vou lhe dar um conselho: case com moça daqui, filha da gente. Não tou lhe oferecendo filha minha; estão as três casadas e bem casadas, graças a Deus. Mas tem muita moça prendada aqui e em Itabuna. Assim todo o mudo vê que vosmicê não está aqui de visita, só para se aproveitar.

 - Casamento é coisa séria, coronel. Primeiro é preciso encontrar a mulher com quem se sonha, o casamento nasce do amor.

 - Ou da necessidade, não é? Nas roças, trabalhador casa até com toco de pau, se vestir saia. Pra ter mulher em casa, com quem deitar, também pra conversar. Mulher tem muita serventia, o senhor nem imagina. Ajuda até na política. Dá filho pra gente, impõe respeito. Pró resto, tem as raparigas…

Mundinho ria:

 - O senhor está querendo fazer-me pagar um preço muito alto pelas eleições. Se depender de casar-me, temo estar desde já derrotado. Não quero ganhar assim, coronel. Quero ganhar com o meu programa.

Falou-lhe então, como já o fizera com tantos outros, sobre os problemas da região, apresentando soluções, rasgando estradas e perspectivas, num entusiasmo contagiante.

 - Vosmicê está coberto de razão. Tudo o que vosmicê disse é como as tábuas da lei: verdade pura. Quem pode contradizer? – Agora fitava o chão, muitas vezes sentira-se magoado contra o abandono em que vivia o interior, esquecido pelos Bastos. – Se o povo daqui tiver juízo, o senhor vai ganhar. Se o Governo lhe reconhece, não sei, isso já é outra conversa…

Mundinho sorriu, pensando ter convencido o coronel.

 - Só que tem uma coisa: o senhor tem a razão, mas o coronel Ramiro tem as amizades, fez benefício a muita gente, tem muito parente e compadre, todo mundo está acostumado a votar com ele. Vosmicê me desculpe: porque vosmicê não faz um arranjo com ele?

 - Que arranjo, coronel?

 - Se junta os dois? Vosmicê com a sua cabeça, seus olhos de ver, ele com o prestígio, os eleitor. Ele tem uma neta bonita, vosmicê não conhece? A outra ainda é muito menina… Filhas do Dr. Alfredo.

Mundinho enchia-se de paciência:

 - Não se trata disso, coronel. Eu penso de uma forma, o senhor conhece minhas ideias. O coronel Ramiro pensa de outra, para ele governar é apenas calçar rua e ajardinar a cidade. Não vejo acordo possível. Eu estava lhe propondo um programa de trabalho, de administração. Não é para mim que peço os seus votos, é para Ilhéus, para o progresso da região do cacau.
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