terça-feira, julho 03, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 140


Previa-se uma disputa acirrada, as forças se equilibravam. Mas Ataulfo, homem hábil e bem visto declarou que só aceitaria sua candidatura se os adversários se entendessem, entrassem em acordo para a composição de uma chapa única reunindo figuras dos dois grupos. Não foi fácil convencê-los.

Ataulfo, porém, era maneiroso, visitou Mundinho, louvou-lhe o civismo, o constante interesse pela terra e pela Associação, disse-lhe de como se sentia honrado de tê-lo como Vice-Presidente. Mas não acreditava o exportador ser uma obrigação manter a Associação Comercial equidistante das lutas políticas, exactamente como um terreno neutro onde as forças opostas pudessem colaborar para o bem de Ilhéus e da pátria?

O que ele propunha era fundir as duas chapas, criando duas vice-presidências, dividindo as secretarias e os dois lugares de tesoureiro, os de orador e bibliotecário. A Associação, factor de progresso, com um grande programa a cumprir para fazer de Ilhéus uma verdadeira cidade devia pairar sobre as lamentáveis divisões políticas.

Mundinho concordou, mesmo a abrir mão da sua candidatura a vice-presidente, proposta à sua revelia. No entanto, devia consultar os amigos; ao contrário do coronel Ramiro, ele não ditava ordens, nada decidia sem ouvir seus correligionários.

Creio que ficarão de acordo. Já falou com o coronel?

 - Quis ouvir primeiro o senhor. Vou visitá-lo à tarde.

Com o coronel Ramiro foi mais difícil. O velho mostrou-se a princípio insensível a qualquer argumentação, encolerizado.:

 - Forasteiro sem raízes na terra. Não tem nem pé de cacau…

 - Eu também não tenho coronel.

 - Com o senhor é outra coisa. Já está aqui há mais de quinze anos. É homem de bem, pai de família, não veio para aqui virar a cabeça de ninguém, não trouxe homem casado para namorar as filhas da gente, não quer mandar tudo como se nada prestasse.

 - Coronel, o senhor sabe que não sou político. Não sou nem eleitor. Quero viver bem com todos. Trato com uns e com outros. Mas é certo que muitas coisas devem mudar em Ilhéus, já não vivemos naqueles tempos do passado. E quem tem mudado mais coisas em Ilhéus que o senhor?

O velho, cuja cólera ia em aumento, pronta para explodir, abandonou-se com as últimas palavras do negociante em grosso:

 - Sim, quem mudou mais coisas em Ilhéus?... – repetiu. – Isso aqui era um fim do mundo, uma tapera, o senhor deve se lembrar. Hoje não tem cidade no Estado igual a Ihéus. Porque não esperam ao menos eu morrer? Estou a um passo da cova. Porquê essa ingratidão no fim da minha vida? Que mal eu fiz, em que ofendi esse senhor Mundinho, que quase nem conheço?

Ataulfo Passos não sabia como responder. Agora a voz do coronel era trémula, voz de homem velho, terminado.

 - Nem pense que sou contra mudar certas coisas, fazer outras. Mas porquê essa pressa, esse desespero, como se o mundo fosse acabar? Tem tempo para tudo. – Novamente erguia-se o dono da terra, o invencível Ramiro Bastos.
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