quinta-feira, agosto 09, 2012

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 163


Retirou o rebenque, levantando-o; a ponta roçou de leve o rosto de Rómulo. – Depois de amanhã, é o prazo que lhe dou.

Voltou-lhe as costas, voltado agora para o bar como a indagar do motivo da pequena aglomeração do lado de fora. Marchou para lá, os curiosos foram-se sentando, estabelecendo conversas rápidas, olhando de soslaio. Melk chegou batendo nas costas de Nacib:

 - Como vai essa vida, me serve um conhaque.

Viu João Fulgêncio, sentou-se a seu lado:

 - Boa tarde, seu João. Me disseram que o senhor andou vendendo uns livros ruins pra minha menina. Vou lhe pedir um favor: não venda mais nenhum. Livro só de Colégio, os outros não prestam para nada, só servem para desencaminhar.

Muito calmo, João Fulgêncio respondeu:

 - Tenho livros para vender. Se o freguês quer comprar, não deixo de vender. Livro ruim, o que é que o senhor entende por isso? Sua filha só comprou livros bons, dos melhores autores. Aproveito para lhe dizer que é moça inteligente, muito capaz. É preciso compreendê-la, não deve ser tratada como uma qualquer.

 - A filha é minha, deixe comigo o tratamento. Para certas doenças conheço os remédios. Quanto aos livros, bons ou ruins, ela não comprará mais.

 - Isso é com ela.

 - Comigo também.

João Fulgêncio levantava os ombros como se lavasse as mãos das consequências. Bico Fino chegava com o conhaque, Melk bebia-o de um trago, ia levantar-se, João Fulgêncio segurava-lhe o braço:

 - Ouça, coronel Melk. Fale com sua filha com calma, ela talvez o ouça. Se usar de violência poderá vir a arrepender-se depois.

Melk parecia fazer um esforço para conter-se:

 - Se não conhecesse o senhor, não tivesse sido amigo de seu pai, eu nem lhe escutava. Deixe a menina comigo. Não costumo me arrepender. De toda a forma lhe agradeço a intenção.

Batendo o rebenque na bota, atravessou a praça. Josué o olhava de uma das mesas, veio sentar-se na cadeira que ele deixara, ao lado de João Fulgêncio.

 - Que irá fazer?

 - Possivelmente uma burrice – Pousou seus olhos bondosos no professor – O que não admira, você também não anda fazendo tantas? – É uma moça de carácter, diferente. E a tratam como se fosse uma tola…

Melk transpunha o portão da casa de estilo moderno. No bar as conversas retornavam a Altino Brandão, às agitações políticas.

O engenheiro sumira do banco da avenida. Só mesmo João Fulgêncio, Josué e Nacib, esse parado na calçada na calçada, continuavam atentos aos passos do fazendeiro.
(Click na imagem dos coronéis. Eles eram, na sociedade do nordeste brasileiro de então, as personagens que detinham a riqueza da terra e, com ela, o poder e a autoridade despótica e prepotente) 

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