sexta-feira, outubro 12, 2012

A noite foi longa. Estão estoiradas....

GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 216


Foi ver no relógio da sala, conversavam na cozinha:

 - As nove passadas. E se não tiver?

 - Se não tiver? – Coçou a carapinha. – O coronel tá na roça, a mulher é ruim da cabeça, num vale a pena.

 - Que coronel?

 - Seu Melk. Tu conhece coronel Amâncio? Um do olho cego?

 - Conheço de mais. Vai muito no bar.

 - Pois também serve. Se não encontrar o dito Loirinho, tu procura o coronel que ele dá um jeito.

A sorte era a meninota não dormir no emprego. Ia para casa após o jantar. Gabriela levou o negro Fagundes para o quarto dos fundos, onde tantos meses vivera. Ele pediu:

 - Me dá mais um trago?

 - Entregou-lhe a garrafa da cachaça:

 - Não beba de mais.

 - Vá sem susto. Só mais um trago para terminar de esquecer. Morrer, matado de bala, não faço questão. A gente morre brigando, rindo contente. Judiado de faca quero não. É morte cum raiva, triste e ruim. Vi um homem morrer assim. Coisa feia de ver.

Gabriela quis saber:

- Porque tu atirou? Que necessidade tinha? Que mal te fez?

 - Pra mim não fez nada. Foi pró coronel. Loirinho mandou, que podia fazer? Cada um tem seu ofício, esse é o meu. Também pra comprar um pedaço de terra, eu e Clemente. Já tá apalavrado.

 - Mas o homem escapou. Vai ver, tu nem ganha nada.

 - Como escapou, eu nem sei. Não era o dia dele morrer.

Recomendou-lhe não fazer barulho, não acender a luz, não sair do quartinho dos fundos. No morro, a caçada continuava. O gato, passando veloz por entre o mato, enganara os jagunços. Batiam os bosques, palmo a palmo.

Gabriela calçou uns velhos sapatos amarelos. O relógio marcava mais pouco mais de nove e meia. Àquela hora já mulher casada não saía sozinha nas ruas de Ilhéus. Só prostituta. Nem pensou nisso. Nem pensou tão pouco na reacção de Nacib se viesse a saber, nos comentários dos que a vissem passar.

O negro Fagundes fora bom para ela na caminhada, junto com os retirantes. Carregara seu tio nas costas, pouco antes de ele morrer. Quando Clemente a derrubara com raiva, ele surgira para defendê-la. Não ia deixá-lo sem ajuda, com risco de cair nas mãos dos jagunços.

Matar era ruim, gostava não! Mas negro Fagundes outra coisa não sabia fazer. Não tinha aprendido, só sabia matar.


Saiu, trancou a porta da rua, levou a chave. Na rua do Sapo nunca estivera, ficava para os lados da Estrada de Ferro. Desceu para a praia. Via o bar animado, muita gente de pé.

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