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HOJE É
DOMINGO
(Na minha Cidade de Santarém)
Compreendo o desespero dos meus
patrícios. Pelo desemprego que vai continuar a aumentar, pelas anunciadas medidas
de austeridade, pelos discursos políticos: uns, que assustam pelas ameaças ao
futuro, os do governo, outros, os da oposição, pelo oportunismo que revelam na
tentativa de capitalizar a seu favor o natural descontentamento, todos eles passando
à população um atestado de amnésia e de irracionalidade.
Foram cometidos erros em períodos
recentes da vida do país de entre os quais a deficiente aplicação dos dinheiros
da CEE. Portugal foi o país onde mais a CE investiu
"per capita"
e o que menos proveito retirou. Não se actualizou, não
melhorou as classes laborais, regrediu na qualidade
do ensino, vendeu ou privatizou actividades primordiais e património que poderia hoje ser um sustentáculo.
Os dinheiros foram encaminhados para auto-estradas, estádios de
futebol, acções de pseudo formação profissional, constituição de centenas de
instituições público-privadas, fundações e institutos de duvidosa utilidade,
auxílios financeiros a empresas que os reverteram
em seu exclusivo benefício, pagamento a
agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem as
embarcações seguindo políticas prescritas por Bruxelas, enfim, tudo aqui lo que, ao tempo, foi considerado importante e
bom para o futuro do país.
Apoios estrategicamente
endereçados a elementos dos principais partidos ou próximos deles, elevados vencimentos nas classes superiores
da administração pública, o tácito desinteresse da Justiça frente à
corrupção galopante e um fechar de olhos quase total das Finanças no que respeita à cobrança da riqueza, na Banca, na especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, ao
contrário, uma atenção especialmente
persecutória para com os pequenos comerciantes e a população mais pobre.
Por culpa da própria CEE, dos governantes, dos financeiros, dos
mais poderosos, acumularam-se erros que nos conduziram a um Acordo com a Troika
para nos salvar da bancarrota ou seja, da falência do Estado, o que seria
catastrófico.
Nesse documento, ficaram, preto no branco, os compromissos
negociados, melhor seria dizer impostos, porque capacidade negocial era coisa
que os negociadores portugueses não tinham.
No entanto, à data em que ele foi anunciado pelo então 1º Ministro
José Sócrates, escutando o seu discurso, (está gravado), tudo iria ser muito fácil,
sem cortes nos salários, nas pensões, nos subsídios, uma espécie de operação
dolorosa mas com anestesia geral. Não iríamos sentir nada…
José Sócrates perde as eleições e em
Junho o actual governo toma posse, prometendo, para ganhar os votos, que não
iria haver cortes de subsídios de férias ou de Natal. Mais uma vez, não iríamos
sentir nada…
O Governo Socialista, tinha governado
com maioria absoluta desde 2005 e é reeleito com maioria simples em 2009 até
que pede a demissão (lembram-se do PEC 4) e é substituído no Governo pelo
Partido Social Democrata coligado com o CDS que governa com maioria
parlamentar.
Tivemos, assim, um governo Socialista de
2005 a
2011 que alegando a crise financeira internacional e a quota parte de
responsabilidade que ela teve em toda a situação, levou o país à bancarrota da
qual se salvou com o Acordo da Troika, chamada de urgência pelo governo e que
agora é tão vilipendiado.
Se eu tivesse que pedir alguma coisa aos
políticos que governam os meus patrícios, implorar-lhes-ia que falassem
verdade, olhos nos olhos, com inteligência e sensibilidade, escolhendo as
palavras, como políticos e não como contabilistas, explicando a situação do como e porquê chegamos a esta situação, contando-lhes as dificuldades, os obstáculos com que agora se deparam, as alternativas que
existem ou não existem e, por favor… não se deixem fotografar, a seguir ao
anúncio de mais medidas de austeridade, a cantar no teatro com sorrisos de felicidade a “Nini” do Paulo de Carvalho!… mesmo que tenham uma boa voz.
Respeitem-nos, percebam que os
“embebedaram” em promessas irrealistas quando lhes disputaram os votos, que lhes
mentiram, que lhes disseram, não a verdade mas apenas aqui lo
que eles queriam ouvir quando já sabiam que a vida não iria ser cor-de-rosa.
Bastava ouvi-los nos comícios: nem uma palavra para a necessidade de trabalhar,
de rigor, disciplina, poupança, nenhum aviso à navegação convictos de que quem
melhor e mais paraísos prometesse mais votos teria.
Terá que ser mesmo assim? A democracia
tem que ser isto? Gerar expectativas irrealistas será honesto? Não pensam nos
estragos? Na frustração? Desencanto? Nas acusações pelas promessas não
cumpridas? Na perda de confiança? De credibilidade?
As coisas são mal explicadas ou,
simplesmente, não são explicadas mas na realidade os meus patrícios estão agora
“pendurados” num cheque de 4.300 milhões de euros, (mais uma prestação do apoio
financeiro negociado com a Troika) e que aguarda que as medidas de austeridade
sejam postas preto no branco do Orçamento para que possa ser libertado de forma
a permitir um Natal e Ano Novo menos traumático.
E esta é a realidade a que chegaram após
26 anos de CEE em que Partido
Socialista e Partido Social Democrata, alternando no poder,
praticaram exactamente as mesmas políticas, incorreram nos mesmos erros,
fizeram os mesmos desmandos, apenas com a diferença que uns estiveram mais
tempo no poder do que os outros o que teria vindo a dar mais ou menos na mesmo se tivesse
sido ao contrário.
Divergiram, quando muito, no número de linhas do TGV, nos qui lómetros e traçados das auto-estradas, na
localização dos aeroportos a construir, no número de submarinos a comprar… mas
nunca ouvimos falar em produzir riqueza para pagar tanta infra-estrutura. Tudo
seria a credito num futuro hipotecado…
E o povo? Sim, houve uma classe média
que se alargou, expandiu-se, cresceu. À custa de amigos e amigos desses amigos que eram do partido, orgãos centrais e concelhias, que reivindicavam o "direito" de preencher lugares na administração pública, e de
tanta injecção de dinheiro vindo de fora, (chegou a ser à razão de um milhão de
euros por dia) milhares de pessoas entraram para o Estado, Empresas Públicas e Autárqui cas, Institutos Públicos e não me refiro só aos
lugares de top da Administração mas também às centenas ou milhares de chefias
intermédias, que com mais dinheiro ao fim do mês adqui riram uma qualidade de vida que jamais sonharam, consumindo mais,
comprando casas, muitas casas, com empréstimos bancários que haveriam de de ser pagos ao longo
da vida.
Alguns, no entanto, terão mesmo
amealhado e por isso, agora, vão ser chamados a pagar a dívida do país com os
seus ordenados, poupanças, e reformas.
A
classe média é o mealheiro de Portugal. Os outros, os que desfalcaram o país,
há muito que têm os seus saques em paraísos fiscais… lembrem -se “apenas” dos milhares de milhões de euros, nem se sabe quantos, (três? seis? dez?) que voaram através
do BPN e do BPP.
A sociedade portuguesa está a sofrer uma
reestruturação em sentido contrário do que se tinha verificado nas últimas
décadas: a classe dos pobres vai aumentar com a transferência de muitos que se
encontravam na classe média os quais não serão compensados pelo número de
ricos que irão, por sua vez, descer à classe média, enquanto os muito ricos,
parte deles, ficarão simplesmente ricos. No fim, talvez, fique uma nação mais nivelada, não por cima mas por baixo, aproximando-se do que era no tempo do Salazar mas com mais angústias e menos espalhados pelo país.
A
caminho de uma sociedade cada vez mais assistencial perdemos a condução do
nosso próprio destino colectivo. Só podemos esperar que a Europa assuma a sua
quota-parte de responsabilidade neste processo como é de sua obrigação. Bem ou
mal adoptámos as suas políticas, tentar prosseguir sozinhos seria mergulhar no
abismo, uma espécie de ponto zero, seja lá isso o que for. De qualquer forma, o futuro é imprevisível…
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