domingo, outubro 07, 2012

Principal rotunda à entrada de Santarém

HOJE É 
DOMINGO
(Na minha Cidade de Santarém)

Compreendo o desespero dos meus patrícios. Pelo desemprego que vai continuar a aumentar, pelas anunciadas medidas de austeridade, pelos discursos políticos: uns, que assustam pelas ameaças ao futuro, os do governo, outros, os da oposição, pelo oportunismo que revelam na tentativa de capitalizar a seu favor o natural descontentamento, todos eles passando à população um atestado de amnésia e de irracionalidade.

Foram cometidos erros em períodos recentes da vida do país de entre os quais a deficiente aplicação dos dinheiros da CEE. Portugal foi o país onde mais a CE investiu "per capita" e o que menos proveito retirou. Não se actualizou, não melhorou as classes laborais, regrediu na qualidade do ensino, vendeu ou privatizou actividades primordiais e património que poderia hoje ser um sustentáculo.

Os dinheiros foram encaminhados para auto-estradas, estádios de futebol, acções de pseudo formação profissional, constituição de centenas de instituições público-privadas, fundações e institutos de duvidosa utilidade, auxílios financeiros a empresas que os reverteram em seu exclusivo benefício, pagamento a agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem as embarcações seguindo políticas prescritas por Bruxelas, enfim, tudo aquilo que, ao tempo, foi considerado importante e bom para o futuro do país.

Apoios estrategicamente endereçados a elementos dos principais partidos ou próximos deles, elevados vencimentos nas classes superiores da administração pública, o tácito desinteresse da Justiça frente à corrupção galopante e um fechar de olhos quase total das Finanças no que respeita à cobrança da riqueza, na Banca, na especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, ao contrário, uma atenção especialmente persecutória para com os pequenos comerciantes e a população mais pobre.

Por culpa da própria CEE, dos governantes, dos financeiros, dos mais poderosos, acumularam-se erros que nos conduziram a um Acordo com a Troika para nos salvar da bancarrota ou seja, da falência do Estado, o que seria catastrófico.

Nesse documento, ficaram, preto no branco, os compromissos negociados, melhor seria dizer impostos, porque capacidade negocial era coisa que os negociadores portugueses não tinham.

No entanto, à data em que ele foi anunciado pelo então 1º Ministro José Sócrates, escutando o seu discurso, (está gravado), tudo iria ser muito fácil, sem cortes nos salários, nas pensões, nos subsídios, uma espécie de operação dolorosa mas com anestesia geral. Não iríamos sentir nada…

José Sócrates perde as eleições e em Junho o actual governo toma posse, prometendo, para ganhar os votos, que não iria haver cortes de subsídios de férias ou de Natal. Mais uma vez, não iríamos sentir nada…

O Governo Socialista, tinha governado com maioria absoluta desde 2005 e é reeleito com maioria simples em 2009 até que pede a demissão (lembram-se do PEC 4) e é substituído no Governo pelo Partido Social Democrata coligado com o CDS que governa com maioria parlamentar.

Tivemos, assim, um governo Socialista de 2005 a 2011 que alegando a crise financeira internacional e a quota parte de responsabilidade que ela teve em toda a situação, levou o país à bancarrota da qual se salvou com o Acordo da Troika, chamada de urgência pelo governo e que agora é tão vilipendiado.

Se eu tivesse que pedir alguma coisa aos políticos que governam os meus patrícios, implorar-lhes-ia que falassem verdade, olhos nos olhos, com inteligência e sensibilidade, escolhendo as palavras, como políticos e não como contabilistas, explicando a situação do como e porquê chegamos a esta situação, contando-lhes as dificuldades, os obstáculos com que agora se deparam, as alternativas que existem ou não existem e, por favor… não se deixem fotografar, a seguir ao anúncio de mais medidas de austeridade, a cantar no teatro com sorrisos de felicidade a “Nini” do Paulo de Carvalho!… mesmo que tenham uma boa voz.

Respeitem-nos, percebam que os “embebedaram” em promessas irrealistas quando lhes disputaram os votos, que lhes mentiram, que lhes disseram, não a verdade mas apenas aquilo que eles queriam ouvir quando já sabiam que a vida não iria ser cor-de-rosa. Bastava ouvi-los nos comícios: nem uma palavra para a necessidade de trabalhar, de rigor, disciplina, poupança, nenhum aviso à navegação convictos de que quem melhor e mais paraísos prometesse mais votos teria.

Terá que ser mesmo assim? A democracia tem que ser isto? Gerar expectativas irrealistas será honesto? Não pensam nos estragos? Na frustração? Desencanto? Nas acusações pelas promessas não cumpridas? Na perda de confiança? De credibilidade?

As coisas são mal explicadas ou, simplesmente, não são explicadas mas na realidade os meus patrícios estão agora “pendurados” num cheque de 4.300 milhões de euros, (mais uma prestação do apoio financeiro negociado com a Troika) e que aguarda que as medidas de austeridade sejam postas preto no branco do Orçamento para que possa ser libertado de forma a permitir um Natal e Ano Novo menos traumático.

E esta é a realidade a que chegaram após 26 anos de CEE em que Partido Socialista e Partido Social Democrata, alternando no poder, praticaram exactamente as mesmas políticas, incorreram nos mesmos erros, fizeram os mesmos desmandos, apenas com a diferença que uns estiveram mais tempo no poder do que os outros o que teria vindo a dar mais ou menos na mesmo se tivesse sido ao contrário.

 Divergiram, quando muito, no número de linhas do TGV, nos quilómetros e traçados das auto-estradas, na localização dos aeroportos a construir, no número de submarinos a comprar… mas nunca ouvimos falar em produzir riqueza para pagar tanta infra-estrutura. Tudo seria a credito num futuro hipotecado…

E o povo? Sim, houve uma classe média que se alargou, expandiu-se, cresceu. À custa de amigos e amigos desses amigos    que eram do partido, orgãos centrais e concelhias, que reivindicavam o "direito" de preencher lugares na administração  pública,  e de tanta injecção de dinheiro vindo de fora, (chegou a ser à razão de um milhão de euros por dia) milhares de pessoas entraram para o Estado, Empresas Públicas e Autárquicas, Institutos Públicos e não me refiro só aos lugares de top da Administração mas também às centenas ou milhares de chefias intermédias, que com mais dinheiro ao fim do mês adquiriram  uma qualidade de vida que jamais sonharam, consumindo mais, comprando casas, muitas casas, com empréstimos bancários que haveriam de de ser pagos ao longo da vida.

Alguns, no entanto, terão mesmo amealhado e por isso, agora, vão ser chamados a pagar a dívida do país com os seus ordenados, poupanças, e reformas.

 A classe média é o mealheiro de Portugal. Os outros, os que desfalcaram o país, há muito que têm os seus saques em paraísos fiscais… lembrem -se “apenas” dos milhares de milhões de euros, nem se sabe quantos, (três? seis? dez?)  que voaram através do BPN e do BPP.

A sociedade portuguesa está a sofrer uma reestruturação em sentido contrário do que se tinha verificado nas últimas décadas: a classe dos pobres vai aumentar com a transferência de muitos que se encontravam na classe média os quais não serão compensados pelo número de ricos que irão, por sua vez, descer à classe média, enquanto os muito ricos, parte deles, ficarão simplesmente ricos. No fim, talvez, fique uma nação mais nivelada, não por cima mas por baixo, aproximando-se do que era no tempo do Salazar mas com mais angústias e menos espalhados pelo país.

 A caminho de uma sociedade cada vez mais assistencial perdemos a condução do nosso próprio destino colectivo. Só podemos esperar que a Europa assuma a sua quota-parte de responsabilidade neste processo como é de sua obrigação. Bem ou mal adoptámos as suas políticas, tentar prosseguir sozinhos seria mergulhar no abismo, uma espécie de ponto zero, seja lá isso o que for. De qualquer forma, o futuro é imprevisível…
  

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