Agarrada à agulha, Gabriela, parece agora, fora de cena... |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 170
Com tal vida, nesse tempo
todo não depositara no banco. Cumprira seus compromissos com seus fornecedores,
mas devorara os lucros numa boémia cara. Antigamente ia ao cabaré uma ou duas
vezes por semana, dormia com mulher enrabichada por ele, sem gastar quase nada.
Mesmo depois de casado,
com tanta coisa dada a Gabriela, fora-lhe possível separar cada mês uns contos
de réis para a futura roça de cacau. Resolveu por fim àquela vida devassa e
ruinosa.
Pôde tranqui lamente fazê-lo, não mais o torturava a ausência
de Gabriela, o medo de ficar sozinho, já não procurava sua perna e anca redonda
onde descansar. Sentia falta, e cada vez mais, era da cozinheira.
Felizmente nem tudo era
negativo no balanço. O reservado no pocker, com a dinheirama a correr naquele
ano, deixava bom lucro. Agora, com a volta de Amâncio Leal e de Melk às boas
relações com Ribeirinho e Ezequi el,
o reservado funcionava diariamente, entrando a roda de Pocker pela noite
dentro, indo por vezes até de manhã. Jogavam alto, o barato da casa crescia.
E havia o Restaurante, no
qual Mundinho pusera o dinheiro e Nacib o trabalho e a experiência. Lucros
divididos e certos pois não teria concorrentes. A comida nos hotéis era infame.
Além do mais, à noite, a sala do restaurante funcionaria para o pocker, o sete
e meio, a bisca, o vinte e um, os jogos de baralho aos quais os coronéis eram
aficionados, preferindo-os mesmo à roleta e ao bacará dos cabarés. Ali poderiam
divertir se discretamente.
O pior mesmo era a falta
de cozinheira. O andar já estava pintado, dividido em sala, copa e cozinha, as
mesas e cadeiras prontas, o fogão construído, pias para lavar pratos, mictórios
para os fregueses. Tudo do melhor. Do Rio haviam chegado as encomendas: máqui na para fazer sorvete, frigorífico onde guardar
carnes e peixes, fabricando seu próprio gelo. Coisas de luxo, nunca vistas em
Ilhéus, os fregueses do bar estatelavam-se em admiração.
Em breve estaria tudo
montado, só faltava cozinheira. Naquele dia, quando a suprema autoridade criticara
tão asperamente os salgados do bar, Nacib decidiu conferenciar com Mundinho
sobre o assunto.
O exportador dedicava
grande interesse ao restaurante. Era de comer bem, vivia reclamando a bóia dos
hotéis, mudando de um para outro.
Também ele, Nacib, estava
a par, mandara oferecer ordenado de rei a Gabriela. Discutiu o assunto com o
árabe, propôs mandar buscar um cozinheiro no Rio, experiente em restaurantes. Era
a única solução. Em Ilhéus arranjariam ajudantes, duas ou três cabrochas.
Nacib torceu o nariz:
esses cozinheiros do Rio não sabiam fazer comida baiana, cobravam um dinheirão.
Mundinho, porém estava encantado com a ideia: um mestre-cuco vestido de branco,
gorro na cabeça, como nos restaurantes do Rio.
Vindo falar com os
fregueses, recomendar-lhes pratos. Mandou um telegrama urgente a um amigo seu.
Nacib, ocupado com os
últimos e complicados detalhes de arrumação do restaurante, voltava à sua vida
antiga: ia ao cabaré raramente, dormia com a amazonense quando lhe sobrava
tempo e ela estava livre. Apenas desembarcasse o cozinheiro do Rio e marcaria a
data da inauguração solene do Restaurante do Comércio.
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