Uma flor deitada numa cama de flores |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 160
Não lhe importava o
mínimo. Houve uma festa no Clube Progresso onde ele só não apanhou porque
Alfredo Bastos interveio a tempo, quando já o impulsivo Moacir Estrela, sócio
na empresa de marinetes ia meter o braço nas nobres fuças parlamentares de
Victor.
Saíra este a dançar com a
esposa de Moacir, bonitona e modesta, pessoa que começava a frequentar os
salões do Progresso devido à recente prosperidade do marido. A senhora o soltou
no meio da sala, a reclamar em voz alta:
- Abusador!
Contara às amigas que o
deputado estivera todo o tempo a meter uma perna entre as suas, a apertá-la no
peito, como se em vez de dançar qui sesse
outra coisa.
O Diário de Ilhéus, pela
pena agressiva e purista de Doutor, relatou o incidente, sob o título de: “O
Fujão Expulso do Baile por Ignomínia”. Não houvera propriamente expulsão.
Alfredo Bastos levara o deputado consigo, os ânimos estavam exaltados. O
próprio coronel Ramiro ao saber dessas e de outras, confessara aos amigos:
- Era Aristóteles quem tinha razão. Se eu
soubesse disso antes não tinha brigado com ele, perdido Itabuna. Também no bar
de Nacib houve um pega-pega com o deputado.
Numa discussão, o
homenzinho perdera a cabeça e dissera ser Ilhéus terra de brutos, de mal-educados,
sem nenhum grau de cultura. Dessa vez quem o salvou foi João Fulgêncio. José e Ari
Santos, considerando-se pessoalmente ofendidos, qui seram
dar-lhe uma surra. Foi necessário João
Fulgêncio usar de toda a sua autoridade para evitar a briga.
O bar de Nacib era agora
um reduto de Mundinho Falcão. Sócio do exportador e inimigo de Tonico o árabe
(cidadão brasileiro nato e eleitor) entrara na campanha. E, por mais espantoso
que pareça, naqueles dias vibrante de comício, no maior deles, quando o Dr. Ezequi el bateu todos os seus recordes anteriores de
cachaça e inspiração, Nacib pronunciou um discurso.
Deu-lhe uma coisa por
dentro, depois de ouvir Ezequi el.
Não aguentou, pediu a palavra. Foi um sucesso sem precedentes sobretudo porque
tendo começado em português e faltando-lhe as palavras bonitas, pescadas
dificilmente na memória, ele terminou em árabe, num rolar de vocábulos
sucedendo-se em impressionante rapidez. Os aplausos não findavam.
Foi o discurso mais
sincero e mais inspirado de toda a campanha – classificou João Fulgêncio.
Toda essa agitação cessou
numa doce manhã de luz azulada quando os jardins de Ilhéus exalavam perfume e
os passarinhos trinavam a saudar tanta beleza. O coronel Ramiro acordava muito
cedo. A empregada mais antiga da casa, há cerca de quarenta anos com os Bastos
servia-lhe uma pequena xícara de café.
O ancião sentava-se numa
cadeira de balanço a pensar na marcha da campanha eleitoral, a fazer cálculos. Ia-se
acostumando à ideia de manter-se no poder graças ao reconhecimento prometido
pelo Governador, à degola dos adversários eleitos.
Naquela manhã, a empregada
esperou com a xícara de café. Ele não aparecia. Alarmada acordou Jerusa. Foram
encontrá-lo morto, os olhos abertos, a mão direita a segurar o lençol.
Um soluço cortou o peito
da moça, a empregada começou a gritar: “Morreu o meu padrinho!”
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