O País do Carnaval |
O PAÍS DO
CARNAVAL
Episódio Nº 1
Entre o azul do céu e o verde do mar, o navio ruma o
verde-amarelo-pátrio.
Três horas da tarde. Ar parado. Calor.
No tombadilho, entre franceses, ingleses, argentinos e
ianques está todo o Brasil (Evoé, Varnaval!).
Fazendeiros ricos de volta da Europa, onde correram
igrejas e museus. Diplomatas a dar ideia de manequi ns
de uma casa de modas masculinas… Políticos imbecis e gordos, suas magras e
imbecis filhas e seus imbecis filhos doutores.
Lá no fundo, namorando o mistério das águas, uma
francesa linda como as coisas caras, aventureira viajada, da qual se dizia
conhecer todos os países e todas as raças, o que equi vale
a dizer que conhecia toda a espécie de homem, tolera, com um sorriso
condescendente, o galanteio juliodantesco de uma dúzia de filhos-família
brasileiros e argentinos:
- A senhora é
linda…
- Minha vida
pela sua vida…
- Faça um sinal
e me atirarei à agua!
- Eu queria que
o navio naufragasse para poder provar quanto a amo…
Tudo isso era dito em mau francês, num mau francês de
causar inveja aos rapazes que lêem Dekobrá e têm por Tiradentes uma grande paixão
patriótica.
Toda essa gente sua muito debaixo da elegância das
suas roupas quentes, feitas em Londres e Paris a preços elevados.
Toda a gente, menos a francesa que trazia um vestido
simples de musselina branca. É, em verdade bela. Olhos verdes como o mar e pele
alva. Não admira que aqueles tropicais brasileiros e argentinos gastem com ela
sua retórica, tão precisa à Pátria.
Adiante, um senador, um fazendeiro, um bispo, um
diplomata e a senhora do senador conversam na boa paz burguesa dos que têm o
reino da terra e a certeza de comprarem o do céu.
- Sim - diz o fazendeiro – foi regular a safra. Mas os
preços…
- Ora, coronel,
o senhor quer dizer a mim?... Mesmo pelo preço em que está, o café continua a
dar um lucro fabuloso… É a riqueza de São Paulo e do Brasil.
Mesmo porque o Brasil é São Paulo! – fez a senhora do
senador, bairrista de irritar.
- Oh, minha
senhora! Perdoe-me se discordo de V.ª Ex.ª mas…
Era o diplomata que falava. Primeiro-Secretário de
Embaixada em Paris, ainda estava inédito o seu primeiro serviço à Pátria. Nascera
na Baía, e trazia no sangue e no cabelo a marca dos deboches dos avós
portugueses com avós africanas.
- …mas há outros
grandes Estados… Olhe a Bahia, minha senhora. A Bahia, veja Vª Exª, produz tudo…
cacau, Fumo, Feijão. E produz homens, minha senhora, grandes génios, Rui
Barbosa era baiano…
- Mas hoje,
doutor…
- Oh! Minha senhora,
não diga… Ainda hoje grandes talentos…
E o Bispo conciliador.
- O doutor
mesmo é uma prova…
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