terça-feira, março 12, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 44

 Vou dormir – declarou Ricardo Braz.

 - E eu também – apoiou José Lopes levando, sonolento, a mão à boca que se abrira num bocejo.

O Gomes já se retirara. Como viajava no dia seguinte para o sertão, recolhera-se cedo.

- Eu os levo no meu automóvel – ofereceu Rigger.

 - E você, Jerónimo, não vai?

 - Não. Fico. Eu hoje vou peregrinar pelas ruas… Estou sentimental…

O auto seguiu. Quando desapareceu na esquina, Jerónimo começou a andar ao léu. Pensou na sua vida antes e depois antes e depois de encontrar Ticiano. Antes, tão feliz… vivia a vida boa dos que não têm problemas.

Depois, aquele homem estranho derrubara todos os seus ídolos – Deus, Pátria, o Amor. E ele não sabia se tinha de agradecer a Pedro Ticiano. A verdade é que começava a ser infeliz.

Uma grande ânsia de voltar à sua vida antiga enchia-o completamente. Mas temia que o achassem medíocre…

Uma mulher da janela, chamou-o. Voltou-se. Reconheceu a prostituta daquela tarde… Entrou

 - Não me reconheceu? Pois eu mal o vi, lembrei-me logo do senhor.

E arrastava-o para o quarto.

Conversavam. Ela não suportava aquela vida. Todos a tratavam mal. Demais não aprendera a sorrir para tantos homens. Não ganhava, assim, nem para viver.

Uma grande pena, muito humana, penetrou no coração de Jerónimo Soares. Esqueceu os amigos, Pedro Ticiano, as blagues, tudo. Esqueceu que “ter pena dos outros é não ter pena de si próprio”. Esqueceu que “não se deve sofrer pelos outros nem sofrer a dor dos outros. Basta a nossa”.

A rameira chorava, a cabeça encostada ao seu ombro.

Ele deu-lhe cem mil reis pedindo-lhe, por favor, que não dormisse com homem algum nessa noite. Ela admirou-se de ele não querer ficar, nem ter deitado com ela.

Voltarei amanhã.

 - Tão bom, o senhor…

 - Tão bom que ela teve vergonha de beijar-lhe a boca. Fazia isso a todos os homens, Beijou-lhe as mãos. Foi ele que lhe beijou os lábios longamente.

O céu cheio de estrelas. A lua, muito gorda, parecia uma actriz velha entre girls novas.

Jerónimo sentia-se feliz. Começava naquela noite a volta à sua vida de outrora. Começava a libertar-se de Ticiano. E, se o conseguisse, chegaria à mais completa felicidade. Tinha todos os elementos para isso. Era bom e “burro”.

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