segunda-feira, março 25, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 55

No quarto imundo da pensão barata, José Lopes pôs em dia os originais do romance. Sem título ainda. Vasculhou o cérebro atrás de um. Escreveu: - “Os Doentes de Insatisfação”. Leu. Não gostou. Riscou e voltou a escrever: - “Os Mendigos da Felicidade.”

Na última página, em vez do clássico Fim, lia-se Terminou. José Lopes sorriu. Passou o lápis sobre o Terminou. Substituiu por Principiou. Ficou cismando de que ninguém começava. Principiava a tragédia de todo o dia…

 - Aliás, pensava José Lopes – o romance não era compreendido. Quem o ler não entenderá. É a história de poucas almas. Nem o físico dos meus personagens compreenderia que, só depois de terminado o livro, de terminadas as experiências, de desiludidos todos de encontrar o sentido da vida… Eles só têm sentimentos…

Isso mesmo repetiu o Paulo Rigger, quando a caminho da tipografia.

 - Falta no meu romance o sentido de humanidade. É inteiramente pessoal. A nossa vida… Ninguém ligará para ele…

 - Sinal de que é um bom livro.

Quando deixaram a tipografia, era noite. A tarde morrera sem clamor, a repetir o que na véspera fizera e o que faria no dia seguinte.

Numa igreja rezavam. A oração se elevava como uma súplica, uma grande súplica.

 - Eu não sou ainda um “mendigo da Felicidade”, José… se fosse já estaria ali a rezar…

- A religião é ridícula. Entretanto, eu sinto uma necessidade enorme de crer…

 - E por que não se converte?...

 - Eu não me converterei. Talvez chegue à religião. Se chegar muito bem…

- Você chegará a tomista…

 - Sim, encontrarei as bases da religião.

 - Eu acho, como Ricardo, que só as coisas naturais satisfazem. Só o instinto nos pode levar à religião. A religião não pode ser explicada, tem que ser sentida. O instintivismo, que não tem nada de materialismo como você vê, é que me poderá levar à religião…

- À qual? À de Freud?

 - Não. À de Cristo. Mas à de Cristo sem artifícios…

- Você está a fazer blagues… Já passou esse tempo…

 - Não. Eu estou a ser sincero…


O romance de José Lopes não fez sucesso. Pouca gente leu. Os críticos não falaram dele. A edição ficou nas livrarias. E ninguém compreendeu o grito de desespero que havia naquele livro. Os católicos achavam que o livro atacava a religião. Os materialistas diziam que os heróis do livro marchavam para o catolicismo. Os inimigos de José Lopes espalharam que o livro era comunista.

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